Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português
26 de março de 2025
1. Contencioso Civil e Penal
- Pressupostos da Deserção da Instância e Audiência Prévia da Parte
- Não Aplicação de Dilação Administrativa aos Prazos Contraordenacionais
2. Concorrência
- TJUE - Competência Territorial - Abuso de Posição Dominante
- TCRS - Anulação de Decisão - Controlo de Concentrações
- AdC - Práticas Restritivas - No-poach - Consultoria Informática
- TCRS - Processo da Banca - Prescrição
3. Direito Digital
- Conceito de “Empresa” na Determinação da Coima Aplicável Por Violação do RGPD
- Publicidade de Medicamentos Sujeitos a Receita Médica e Regulação Nacional de Farmácias por Correspondência
- Cibersegurança – Regulamento de Execução (UE) 2025/302 da Comissão de 23 de outubro de 2024
4. Financeiro
- Sistema de Incentivos à Competitividade das Startups
- Quadro Regulatório da UE Para a Gestão de Criptoativos
- Boas Práticas a Observar no Término da Relação Bancária
- Informação Sobre Práticas de Igualdade Entre Géneros
- Acesso a Sistemas de Pagamentos
- Normas Técnicas De Regulamentação do Exercício de Atividades de Superintendência
- Empresas de Seguros e de Resseguros - Uniformização do Cálculo das Provisões Técnicas e dos Fundos Próprios
5. Fiscal
- IRS – Declaração de Rendimentos - Aprovação dos Modelos
- Benefícios Fiscais – Incentivo à investigação científica e inovação - Regulamentação
- Benefícios Fiscais – Incentivo à investigação científica e inovação - Modelo anexo de inscrição
- IRS – Saldo de mais-valias resultantes da venda de participações sociais em micro e pequenas empresas sediadas em país estrangeiro
- STA - IRC - Incompatibilidade do Artigo 22.º do EBF com a Liberdade de Circulação de Capitais em Casos que Envolvem Entidades de Países Terceiros
- STA - Uniformização de Jurisprudência – Independência do Direito dos Contribuintes a Juros de Mora por Atraso na Execução de Decisão do Reconhecimento do Direito a Juros Indemnizatórios
6. Laboral
- Sistema de Autorização de Entradas e Saídas e Autorização de Residência Temporária dos Cidadãos da CPLP
- Cláusula de Exclusividade – Despedimento com Justa Causa
- Aplicação do Método Indiciário – Rejeição de Recurso de Uniformização de Jurisprudência
- Isenção de Horário de Trabalho – Nulidade
7. Público
- Regulamento da Rede Nacional de Distribuição de Gás – Hidrogénio Verde
8. Imobiliário
- Comunicação de oposição à renovação de arrendamento: pronúncia sobre a necessidade de ser dirigida ao unido de facto.
1. Contencioso Civil e Penal
PRESSUPOSTOS DA DESERÇÃO DA INSTÂNCIA E AUDIÊNCIA PRÉVIA DA PARTE
Acórdão n.º 2/2025 (DR 40, Série I, de 26 de fevereiro de 2025) - STJ
Entre janeiro e fevereiro de 2023, a Autora requereu uma ampliação do apoio judiciário para que a citação de dois Réus pudesse ser efetuada pelo agente de execução. Posteriormente, entendendo que o seu pedido havia sido indeferido, requereu ao juiz de 1.ª instância que a citação se realizasse por oficial judicial. Em resposta, o tribunal notificou a Autora para “querendo requerer nova proteção jurídica com pedido de nova modalidade, a saber atribuição de A.E., e sendo este atribuído então sim quem praticará o ato de citação será o funcionário judicial.”, concluindo que: “Pelo exposto, e por ora, indefere-se o requerido, aguardando os autos o prazo a que alude o artigo281.º, n.º 1 do CPC.”
Ora, em setembro de 2023 o tribunaljulgou deserta a instância. A Autora interpôs recurso de apelação, que foi julgado improcedente pelo Tribunal da Relação de Coimbra, confirmando-se a decisão recorrida.
Chamado a pronunciar-se sobre os pressupostos da deserção da instância, e sobre a eventual necessidade de audiência prévia da parte, o STJ considerou que, no caso concreto, embora se verificasse objetivamente o imobilismo da demandante durante o período de seis meses, a conduta da Autora não integrou a negligência que é pressuposto da deserção da instância, por força (i) da oficiosidade das diligências para a citação dos Réus, que o tribunal indevidamente não determinou, e (ii) da falta de clareza do despacho onde constava a advertência da deserção da instância.
Assim, o STJ uniformizou jurisprudência nos seguintes termos:
“I - A decisão judicial que declara a deserção da instância nos termos do artigo 281.º, n.º 1, do Código de Processo Civil pressupõe a inércia no impulso processual, com a paragem dos autos por mais de seis meses consecutivos, exclusivamente imputável à parte a quem compete esse ónus, não se integrando o acto em falta no âmbito dos poderes/deveres oficiosos do tribunal.
II - Quando o juiz decida julgar deserta a instância haverá lugar ao cumprimento do contraditório, nos termos do artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, com inerente audiência prévia da parte, a menos que fosse, ou devesse ser, seguramente do seu conhecimento, por força do regime jurídico aplicável ou de adequada notificação, que o processo aguardaria o impulso processual que lhe competia sob a cominação prevista no artigo 281.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.”
NÃO APLICAÇÃO DE DILAÇÃO ADMINISTRATIVA AOS PRAZOS CONTRAORDENACIONAIS
Acórdão n.º 3/2025 (DR 41, Série I, de 27 de fevereiro de 2025) - STJ
A Autoridade Nacional da Aviação Civil condenou a Lufthansa numa coima pela prática de onze contraordenações, em violação do regime contraordenacional estabelecido no âmbito da COVID-19, concretamente, do artigo 2.º, al. i), do Decreto-Lei n.º 28-B/2020, de 26 de junho. A Lufthansa interpôs recurso para o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, que o considerou intempestivo, e, subsequentemente, também o Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao recurso da decisão do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão interposto pela Lufthansa.
Ora, com fundamento na oposição de julgados, o STJ foi chamado a pronunciar-se sobre se o prazo de 20 dias para apresentação do recurso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima, estabelecido no artigo 59.º, n.º 3, do Regime Geral das Contraordenações, apenas se começa a contar após a dilação de 15 dias prevista no artigo 88.º, n.º 1, alínea b), do Código de Procedimento Administrativo (“CPA”).
Considerou o STJ que, embora a ANAC seja uma entidade administrativa, com poderes de regulação, de supervisão, de fiscalização e de sanção de infrações respeitantes às atividades económicas dos setores privado, público, cooperativo e social, os processos de contraordenação por ela desencadeados não podem ser considerados procedimentos administrativos tal como definidos no artigo 1.º, n.º 1, do CPA, nem “procedimentos administrativos especiais” para efeitos do artigo 7.º, n.º 2, deste mesmo diploma. O que, desde logo, afasta a aplicação subsidiária do CPA à fase administrativa do processo de contraordenação, já que o processo contraordenacional tem como direito subsidiário, em todas as suas fases, o direito processual penal.
Deste modo, o STJ uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: “A dilação prevista no artigo 88.º, n.º 1, al. b), do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de janeiro, não é aplicável à contagem do prazo de recurso de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa que aplica uma coima, previsto no artigo 59.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, que instituiu o ilícito de mera ordenação social e respetivo processo.”
2. Concorrência
TJUE CONFIRMA A COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS DO DOMICÍLIO DA SOCIEDADE-MÃE PARA JULGAR AÇÕES DE INDEMNIZAÇÃO POR INFRAÇÕES AO DIREITO DA CONCORRÊNCIA COMETIDAS POR SUBSIDIÁRIA
Acórdão de 13 de fevereiro de 2025 (Processo C-393/23) - TJUE
Em 13 de fevereiro de 2025, o TJUE proferiu um acórdão no âmbito de um reenvio prejudicial, sobre questões de competência dos tribunais no âmbito do private enforcement do direito da concorrência. O pedido de reenvio prejudicial foi apresentado pelo supremo tribunal neerlandês.
O referido reenvio foi solicitado no âmbito de uma ação de indemnização proposta nos Países Baixos pela empresa grega Macedonian Thrace Brewery SA (“MTB”) contra a Athenian Brewery SA (“AB”), com sede na Grécia, e a sua empresa-mãe neerlandesa Heineken NV (“Heineken”), por alegados danos causados por infração ao direito da concorrência. A ação baseava-se num alegado abuso de posição dominante no mercado grego da cerveja por parte da AB, tal como determinado pela autoridade grega da concorrência. À data, a Heineken detinha aproximadamente 98,8% das ações da AB, mas ela própria não exercia nenhuma atividade operacional na Grécia, não havendo prova da sua participação direta nas condutas em causa.
A questão que se colocava era a de saber, com base nas regras de competência internacional dos tribunais, em particular do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 (Regulamento de Bruxelas I)[1], se existe um nexo suficientemente estreito entre as ações contra a Heineken e a AB para justificar que ambas sejam demandadas em conjunto nos Países Baixos. O Supremo Tribunal dos Países Baixos remeteu esta questão para o TJUE para esclarecimento.
Assim, o TJUE examinou se a influência decisiva da Heineken sobre a AB significava que estas formavam uma única unidade económica ao abrigo do direito da concorrência. O TJUE considerou que o tribunal nacional podia estabelecer a sua competência internacional, em relação à AB, com base na presunção de que uma empresa-mãe exerce uma influência decisiva sobre a sua subsidiária, caso detém a maior parte do capital da subsidiária sancionada. Em tal caso, existe, segundo o TJUE, um nexo estreito entre os dois réus que resulta numa competência internacional conjunta no domicílio de um dos réus.
Neste caso, note-se, a própria empresa-mãe não participou nas condutas sancionadas no mercado grego da cerveja. No entanto, no entender do Tribunal, deve considerar se que, presumivelmente, exerceu uma influência decisiva sobre a sua subsidiária, à data dos factos, constituindo assim uma unidade económica nos termos do direito da concorrência. Assim, com base no conceito de “unidade económica”, o TJUE afirmou a existência de uma ligação estreita entre os pedidos contra a empresa-mãe e a sua subsidiária.
O acórdão constitui, por conseguinte, um novo marco na linha de processos anteriores sobre a responsabilidade da unidade económica no seu conjunto e as consequências processuais deste conceito e alarga a aplicação do conceito de unidade económica no direito da concorrência da UE a questões jurisdicionais, permitindo que os requerentes processem conjuntamente uma empresa-mãe e a sua subsidiária estrangeira no domicílio da empresa-mãe, mesmo que só a subsidiária tenha cometido a infração. No entanto, o TJUE clarificou que os réus podem apresentar provas para refutar tal presunção de influência decisiva.
TCRS ANULA DECISÃO DE NÃO OPOSIÇÃO DA ADC RELATIVA A OPERAÇÃO DE CONCENTRAÇÃO, NO SETOR DO TABACO
Sentença de 12 de fevereiro de 2025 (Processo 5/23.3YQSTR) - TCRS
Em 12 de fevereiro de 2025, o TCRS proferiu uma sentença, pela qual julgou parcialmente procedente a ação administrativa de impugnação interposta pela Federação Portuguesa de Grossistas de Tabaco (“FPGT”) contra uma decisão da AdC.
Para contexto, estava em causa uma decisão da AdC de 26 de abril de 2023, que não se opunha à aquisição da empresa Dois Lados, Distribuição de Tabacos e Bebidas, S.A. (“Dois Lados”), ativa na distribuição grossista de produtos de tabaco, pela Midsid – Sociedade Portuguesa de Distribuição, S.A. (“Midsid”), uma entidade detida pela CDIL - Companhia de Distribuição Integral Logista Portugal, S.A. (“Logista”), detida, por sua vez, em última instância, pela Imperial Brands PLC, uma empresa sedeada no Reino Unido e dedicada ao fabrico de tabaco.
A FPGT alegou que a decisão da AdC continha erros nos pressupostos de facto, particularmente no que diz respeito às atividades das partes nos mercados relevantes. De acordo com a prática da AdC no setor do tabaco, existem três níveis principais de atividade:
- Produção/fabrico: envolvendo fabricantes de produtos de tabaco, tanto nacionais como estrangeiros que exportam para Portugal.
- Distribuição grossista, dividida em:
- Introdução no consumo: responsável pelo tratamento fiscal e pela disponibilização inicial dos produtos no mercado.
- Distribuição capilar: assegura a entrega dos produtos aos pontos de venda retalhista.
- Retalho: venda dos produtos ao consumidor final por meio de canais como HORECA, tabacarias e máquinas automáticas.
A AdC considerou que a Midsid e a Dois Lados eram operadores ativos na distribuição capilar de tabaco de combustão, adquirindo produtos de distribuidores do primeiro nível e abastecendo os retalhistas. Por outro lado, entendeu que a Logista atuava principalmente na introdução no consumo de produtos de tabaco e na distribuição exclusiva de tabaco aquecido, vendendo diretamente a retalhistas e outros grossistas.
Contudo, o TCRS concluiu que a AdC cometeu um erro ao não considerar a verdadeira posição de mercado do grupo da adquirente no mercado da distribuição capilar. Segundo a sentença do TCRS, a Logista, entidade que controla a Midsid, não só introduz produtos no consumo, mas também desempenha um papel ativo na distribuição capilar de tabaco de combustão, estabelecendo condições comerciais e vendendo diretamente aos retalhistas. Esse envolvimento direto caracteriza-a como um operador significativo na distribuição capilar, incrementando a posição do respetivo grupo neste mercado.
Em suma, o TCRS reconheceu que a AdC não considerou adequadamente a realidade do mercado e o papel da Logista na distribuição de produtos de tabaco, afetando a análise da respetiva operação de concentração. De acordo com a sentença do TCRS, a AdC falhou na aplicação dos pressupostos de facto, o que resultou na anulação da decisão de não oposição à operação de concentração.
Esta é a segunda decisão de anulação de uma decisão de não oposição da AdC, no setor do tabaco em particular. Em setembro de 2017, a AdC tinha emitido uma decisão de não oposição no processo Ccent. 26/2017 - Midsid/Ativos 3D. A FPGT intentou uma ação administrativa de anulação. Embora inicialmente julgada improcedente pelo TCRS, a FPGT recorreu para o TRL que, por Acórdão de 26 de setembro de 2019, deu provimento ao recurso e anulou a decisão da AdC por erro sobre os pressupostos de facto, considerando que a AdC não tinha atendido adequadamente a certos elementos fornecidos pela FPGT. Esta decisão judicial transitou em julgado em 9 de junho de 2023, obrigando a AdC a reabrir a fase de instrução do procedimento e a adotar uma nova decisão em conformidade com o Acórdão e com o regime de controlo de concentrações previsto na Lei da Concorrência.
ADC APLICA COIMA DE €3.092.000 À INETUM POR ALEGADAS PRÁTICAS ANTICONCORRENCIAIS
Decisão de 18 de fevereiro de 2025 (Processo PRC/2022/3) - AdC
Em 18 de fevereiro de 2025, a AdC emitiu uma decisão pela qual sancionou o grupo Inetum e lhe impôs uma coima de €3.092.000, por alegadas práticas anticoncorrenciais no mercado laboral. Esta decisão foi emitida num processo em que a AdC sancionou, ainda, o grupo Deloitte, o grupo Accenture e o grupo SAP, também por alegadas práticas anticoncorrenciais no mercado laboral, sendo que as coimas impostas neste processo perfazem o total de €7.174.000.
Em 22 de março de 2022, a AdC iniciou um processo de inquérito contraordenacional para investigar práticas restritivas da concorrência. As diligências de busca, exame, recolha e apreensão foram realizadas entre 30 de março e 7 de abril de 2022.
Nesta sequência, a SAP Portugal apresentou um requerimento de dispensa ou redução da coima em 30 de março de 2022. Em 15 de outubro de 2023, 26 de outubro de 2023 e em 20 de fevereiro de 2024, respetivamente, a Accenture, a SAP e a Deloitte apresentaram propostas de transação, renunciando a contestar a sua participação nas práticas objeto de investigação e a sua responsabilidade por essas práticas. Contudo, a Inetum decidiu prosseguir com o processo sem recorrer aos mecanismos da clemência ou da transação.
A AdC sancionou estas empresas por alegadas práticas anticoncorrenciais no mercado laboral, em particular pela celebração de acordos de no-poach, alegadamente obrigando-se reciprocamente a não recrutar e/ou não abordar espontaneamente os seus trabalhadores. Segundo a AdC, com essa conduta, as empresas visadas terão restringido a concorrência no mercado laboral, repartindo a oferta de mão de obra e limitando a mobilidade dos referidos profissionais. Segundo a AdC, a infração terá tido lugar de março de 2014 a agosto de 2021.
Neste contexto, a AdC decidiu aplicar uma coima de €278.000 à Deloitte (em 21 de fevereiro de 2024, uma coima reduzida por transação); uma coima de €1.323.000 à SAP (em 7 de novembro de 2023, uma coima reduzida por clemência (50%) e transação); uma coima de €2.481.000 à Accenture (em 18 de dezembro de 2023, uma coima reduzida por transação); e de €3.092.000 ao grupo Inetum (em 19 de fevereiro de 2025).
Por fim, note-se este é o segundo processo sancionatório relativo a práticas restritivas da concorrência no mercado laboral desde que, em 2020, a AdC começou a intervir nesta área (o primeiro refere-se ao processo dos clubes de futebol, ainda em curso em sede de impugnação judicial).
TRL DECLARA PRESCRITA AÇÃO CONTRA BANCOS POR ALEGADAS PRÁTICAS ANTI-CONCORRENCIAIS
Acórdão de 10 de fevereiro de 2025 (Processo 225/15.4YUSTR-W.L1) - TRL
O Tribunal da Relação de Lisboa, através da Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão, decidiu, em 10 de fevereiro de 2025, declarar prescrita a ação contra vários bancos portugueses por práticas anti-concorrenciais, determinando o arquivamento do processo.
Os bancos e instituições de crédito visados haviam sido sancionadas pela AdC, por alegada troca de informações sensíveis entre concorrentes, caracterizada como prática restritiva da concorrência. Uma decisão confirmada pelo TCRS. Os bancos recorreram contra a sentença do TCRS, perante o TRL, alegando, entre outras questões, a prescrição do procedimento contraordenacional, defendendo que o prazo máximo de prescrição, à luz da Lei da Concorrência de 2012, aplicável à data dos factos, tinha sido ultrapassado.
O Tribunal analisou detalhadamente o regime de prescrição aplicável, considerando o início do prazo, as causas de interrupção e suspensão, e as alterações legislativas ocorridas, incluindo a Lei n.º 17/2022. Concluiu que o reenvio prejudicial ao TJUE não constitui causa de suspensão do procedimento prevista na lei aplicável à data dos factos. O TRL afirmou ainda que a nova redação do artigo 74.º da Lei da Concorrência, introduzida pela Lei n.º 17/2022, não é aplicável ao caso, uma vez que o legislador afastou expressamente a sua aplicação a procedimentos iniciados antes da sua entrada em vigor.
Assim, aplicando o regime legal vigente à data dos factos, o TRL concluiu que o prazo máximo de prescrição do procedimento, incluindo o período máximo de suspensão, já havia decorrido, levando à prescrição da ação.
Em resultado, o Tribunal deu provimento aos recursos dos bancos, declarando prescrita a responsabilidade contraordenacional e determinando o arquivamento do processo. O Acórdão ainda não transitou em julgado, tendo o Ministério Público apresentado uma reclamação para o TRL invocando a nulidade do Acórdão por omissão de pronuncia e a AdC apresentou recurso para o Tribunal Constitucional.
3. Direito Digital
CONCEITO DE EMPRESA NA DETERMINAÇÃO DA COIMA APLICÁVEL POR VIOLAÇÃO DO RGPD
Acórdão de 13 de fevereiro de 2025 (processo C-383/23) - TJUE
O acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), de 13 de fevereiro de 2025, foi proferido no seguimento de um pedido de decisão prejudicial que teve por objeto a interpretação do artigo 83.º, n.ºs 4 a 6, do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (“RGPD”).
Para efeitos de enquadramento, este pedido foi apresentado no âmbito de um processo penal instaurado pelo Ministério Público da Dinamarca contra a ILVA A/S (“ILVA”) por alegadas violações das obrigações que incumbiam a esta sociedade por força do RGPD, entre maio de 2018 e janeiro de 2019, na sua qualidade responsável pelo tratamento de dados pessoais relativos a antigos clientes. A ILVA era uma sociedade que explorava uma cadeia de lojas de móveis e fazia parte do grupo Lars Larsen Group.
Neste contexto, o Ministério Público dinamarquês pedido a aplicação de uma coima no montante de cerca de 201 mil euros. O cálculo baseava-se não apenas no volume de negócios da ILVA, mas também no volume de negócios global do grupo Lara Larsen Group que atingiu, no exercício de 2017/2016, cerca de 881 milhões de euros.
Por acórdão proferido a 12 de fevereiro de 2021, o Tribunal de Primeira Instância de Aarhus, Dinamarca, considerou que não havia que ter em conta o volume de negócios do grupo Lars Larsen Group para determinar o montante da coima, dado que apenas a ILVA era objeto de ações penais. Salientou ainda que a ILVA exercia uma atividade de venda a retalho independente e que não tinha como responsabilidade assegurar o tratamento de dados do grupo.
Perante este Acórdão, o Ministério Público interpôs recurso e alegou que o montante da coima deveria ter em conta o volume de negócios do grupo uma vez que o termo “empresa”, conforme previsto no artigo 83.º do RGPD, deve ser entendido no sentido de que, em caso de violação do RGPD por uma sociedade, é necessário fazer referência ao volume de negócios do grupo de que essa sociedade faz parte.
Chamado a pronunciar-se em sede de recurso, o Tribunal de Recurso da Região Oeste decidiu suspender a instância e submeter ao TJUE duas questões prejudiciais, analisadas por este em conjunto, e que consistiam em saber se, caso o termo “empresa”, previsto no artigo 83.º, n.º 4 a 6, do RGPD, correspondesse ao termo “empresa” na aceção dos artigos 101.º e 102.º do TFUE, a aplicação da coima devia ter em consideração o volume de negócios da entidade económica de que a empresa faz parte ou apenas o volume de negócios da própria empresa.
O TJUE salientou que já se tinha debruçado sobre este tema no passado, tendo declarado, em acórdão de 5 de dezembro de 2023, que o conceito de “empresa”, na aceção dos artigos 101.º e 102.º TFUE, não tem incidência na questão de saber se e em que condições pode ser aplicada uma coima nos termos do artigo 83.º do RGPD a um responsável pelo tratamento que seja uma pessoa coletiva, dado que esta questão é regulada de forma exaustiva pelo artigo 58.º, n.º 2, e pelo artigo 83.º, n.ºs 1 a 6 deste regulamento. Este conceito só é pertinente para determinar o montante da coima aplicada.
Assim, resulta do artigo 83.º, n.ºs 4 a 6, do RGPD, que, no caso de o destinatário da coima ser uma empresa ou dela fizer parte, na aceção dos artigos 101.º e 102.º TFUE, o montante máximo da coima é calculado com base numa percentagem do volume de negócios anual a nível mundial do exercício anterior da empresa em causa.
No entanto, alertou o TJUE, a determinação deste montante máximo deve ser distinguida do próprio cálculo do montante de uma coima a aplicar pela autoridade de controlo competente. Cada autoridade de controlo deve assegurar que a aplicação de coimas é, em cada caso individual, efetiva, proporcionada e dissuasiva. Adicionalmente, devem ser tidos em consideração outros elementos, tais como a natureza, a gravidade e a duração da infração, o número de titulares de dados afetados e o nível de danos por eles sofridos, o caráter intencional ou negligente da infração, as iniciativas tomadas pelo responsável pelo tratamento de dados pessoais ou pelo subcontratante deste tratamento para atenuar os danos sofridos, o grau de responsabilidade deste responsável ou deste subcontratante e as categorias específicas de dados pessoais afetadas pela infração.
Por último, o TJUE reforçou que, nos termos do artigo 83.º do RGPD, as autoridades de controlo devem assegurar, no cálculo do montante da coima, que o princípio da proporcionalidade é respeitado, para “estabelecer um justo equilíbrio entre as exigências do interesse geral na proteção de dados pessoais e os requisitos da salvaguarda dos direitos do responsável pelo tratamento destes dados, do subcontratante deste tratamento ou da empresa de que estes fazem parte”.
Com isto, o TJUE concluiu que o termo “empresa” deve corresponder ao conceito de “empresa”, na aceção dos artigos 101.º e 102.º do TFUE, pelo que, quando é aplicada uma coima por violação do RGPD a um responsável pelo tratamento de dados que é ou faz parte de uma empresa, o montante máximo é determinado com base numa percentagem do volume de negócios anual a nível mundial correspondente ao exercício financeiro anterior da empresa.
PUBLICIDADE DE MEDICAMENTOS SUJEITOS A RECEITA MÉDICA E REGULAÇÃO NACIONAL DE FARMÁCIAS POR CORRESPONDÊNCIA
Acórdão de 27 de fevereiro de 2025 (processo C-517/23) - TJUE
O acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), de 27 de outubro de 2025, foi proferido no seguimento de um pedido de decisão prejudicial que teve por objeto a interpretação do artigo 86.º, n.º 1, e do artigo 87.º, n.º 3, da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano, conforme alterada pela Diretiva 2011/62/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho de 2011 (“Diretiva 2001/83”).
Para efeitos de enquadramento, este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opôs a Ordem dos Farmacêuticos da Renânia do Norte, Alemanha (“Ordem dos Farmacêuticos”) à DocMorris NV (“DocMorris”), uma sociedade de direito neerlandês que explorava uma farmácia de venda por correspondência estabelecida nos Países Baixos.
A DocMorris era uma sociedade que explorava uma farmácia de venda por correspondência estabelecida nos Países Baixos, que fornecia medicamentos sujeitos ou não a receita médica a clientes na Alemanha. A Ordem dos Farmacêuticos, por considerar que a DocMorris, através das campanhas publicitárias, violava o regime de preços notificados aplicável aos medicamentos sujeitos a receita médica, obteve, entre 2013 e 2015, medidas cautelares destinadas a fazer cessar as campanhas publicitárias, decretadas através de despachos do Tribunal Regional de Colónia, Alemanha, no âmbito de processos cautelares. Estes despachos tinham em conta campanhas publicitárias que compreendiam, entre outros, gratificações por receita enviada, sistemas de patrocínios e descontos imediatos após o envio de receitas médicas. Após o Acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de outubro de 2016, o Tribunal Regional de Colónia decidiu anular quatros dos cinco despachos, mantendo apenas o que se referia a sistemas de patrocínio.
A DocMorris apresentou um pedido de indemnização contra a Ordem dos Farmacêuticos com o fundamento de que as medidas cautelares eram injustificadas. Chamado a pronunciar-se em sede de recurso, o Tribunal Regional Superior de Düsseldorf, Alemanha, julgou procedente o pedido de indemnização apresentado pela DocMorris no montante aproximado de 18,5 milhões de euros. A Ordem dos Farmacêuticos interpôs recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça Federal da Alemanha. Este decidiu suspender a instância e submeter ao TJUE algumas questões prejudiciais.
A primeira questão consistiu em saber se a publicidade que tem em vista a compra de medicamentos sujeitos a receita médica de toda a gama de produtos de uma farmácia está abrangida pelo âmbito de aplicação das disposições relativas à publicidade de medicamentos previstos nos artigos 86.º a 100.º da Diretiva 2001/83. O TJUE declarou que a finalidade da mensagem constitui a característica essencial do conceito de “publicidade dos medicamentos”. Assim, era necessário esclarecer se a campanha se destinava a promover a prescrição, fornecimento, venda ou consumo de medicamentos (caso em que estaríamos perante “publicidade” na aceção da Diretiva 2001/83), ou se destinava apenas a influenciar a escolha da farmácia em que o cliente iria comprar os medicamentos sujeitos a receita médica.
Assim, o TJUE concluiu que a mensagem das campanhas publicitárias em que era oferecida aos clientes das DocMorris uma gratificação por cada receita, não poderia ser considerada como uma mensagem que promovia a prescrição ou o consumo de medicamentos indeterminados sujeitos a receita médica. Daqui resulta que as campanhas publicitárias mencionadas diziam respeito à escolha da farmácia em que o paciente comprava um medicamento sujeito a receita médica, pelo que não estaria abrangidas pelo conceito de “publicidade dos medicamentos”, na aceção do artigo 86.º, n.º 1 da Diretiva 2001/83.
Contudo, se estas gratificações se aplicassem também a medicamentos não sujeitos a receita médica (por exemplo, uma das campanhas consistia em que, se um amigo de um cliente da DocMorris enviasse uma receita médica, este último recebia um vale para uma estada num hotel ou para a inscrição no clube automóvel alemão a um preço reduzido, ao passo que ao seu amigo era oferecido um vale para encomendar medicamentos não sujeitos a receita médica ou produtos de saúde e de beleza), então o destinatário dos vales e descontos, uma vez que não está obrigado a recorrer a um médico prescritor, estaria a ser atraído por uma vantagem económica proporcionada pelos mesmos.
A segunda questão consistiu em saber se era possível haver uma legislação nacional que proibia campanhas publicitárias para a compra de medicamentos indeterminados sujeitos a receita médica, através de ofertas promocionais sob a forma de vales correspondentes a um montante em dinheiro ou a uma percentagem de desconto na aquisição posterior de outros produtos, como os medicamentos não sujeitos a receita médica. O TJUE realçou que qualquer publicidade que desvie o consumidor de uma avaliação objetiva da necessidade de tomar um medicamento incita a utilização irracional e excessiva de um medicamento. Como exemplo, o TJUE afirmou que, campanhas publicitárias que ofereçam descontos podem levar à equiparação de medicamentos não sujeitos a receita médica a outros produtos de consumos oferecidos por uma farmácia. Assim, concluiu-se que pode haver legislação nacional que proíba campanhas publicitárias para compra de medicamentos indeterminados sujeitos a receita médica, através de ofertas promocionais sob a forma de vales correspondentes a um montante em dinheiro ou a uma percentagem de desconto na aquisição posterior de outros produtos, como os medicamentos não sujeitos receita médica.
CIBERSEGURANÇA – REGULAMENTO DE EXECUÇÃO (UE) 2025/302 DA COMISSÃO DE 23 DE OUTUBRO DE 2024
Regulamento de Execução (UE) n.º 2025/302, de 23 de outubro de 2024 (JOUE, Série L, de 20 de fevereiro de 2025)
Foi publicado o Regulamento de Execução (UE) n.º 2025/302 da Comissão, de 23 de outubro de 2024, que estabelece normas técnicas de execução para a aplicação do Regulamento (UE) 2022/2554 do Parlamento Europeu e do Conselho no que respeita aos formulários, modelos e procedimentos normalizados que as entidades financeiras devem utilizar para comunicar incidentes de caráter severo relacionados com as TIC e notificar uma ciberameaça significativa (o “Regulamento de Execução”).
Neste contexto, o Regulamento de Execução, a fim de assegurar que as entidades financeiras comunicam os incidentes de caráter severo às respetivas autoridades competentes de forma coerente, estabelece um modelo único de comunicação para esses efeitos. Este modelo, estabelecido no anexo I do Regulamento de Execução, permitirá às entidades financeiras que atualizem todas as informações apresentadas anteriormente, e, se necessário, reclassifiquem os incidentes de caráter severo como incidentes de caráter não severo.
Caso as entidades financeiras decidam subcontratar terceiros para comunicar incidentes de caráter severo relacionados com as TIC, as autoridades competentes deverão ter conhecimento da identidade do terceiro que efetua a comunicação em nome da entidade financeira, antes da apresentação da primeira notificação ou comunicação, a fim de verificar a legitimidade do terceiro que efetua a comunicação.
No que respeita à notificação de ciberameaças significativas, as entidades financeiras que notificam ciberameaças significativas às autoridades competentes devem utilizar o modelo estabelecido no anexo III do Regulamento de Execução, bem como assegurar que as notificações são completas e exatas.
O Regulamento de Execução entrou em vigor no dia 12 de março de 2025 e é diretamente aplicável em todos os Estados-Membros da UE.
4. Financeiro
SISTEMA DE INCENTIVOS À COMPETITIVIDADE DAS STARTUPS
Portaria n.º 49/2025/1, de 20 de fevereiro (DR 36, Série I, 20 de fevereiro de 2025)
A referida portaria aprovou o Regulamento Específico do Sistema de Incentivos à Competitividade das Startups tem como objetivo promover a inovação e competitividade das micro, pequenas e médias empresas (“PME”) em Portugal, com um foco especial em startups e empresas Deep Tech. Este regulamento faz parte do Programa Acelerar a Economia, que inclui sessenta medidas-chave destinadas ao desenvolvimento e inovação do tecido empresarial nacional. O programa visa reforçar a resiliência das PME, promover a inovação, aumentar a competitividade e estimular a criação de emprego. Entre as medidas, destaca-se a implementação de incentivos para estimular o investimento, crescimento e internacionalização das empresas mais inovadoras.
Os beneficiários deste sistema de incentivos são as micro, pequenas e médias empresas, incluindo startups que cumpram os requisitos legais, como estar legalmente constituídas, ter a situação tributária e contributiva regularizada, e apresentar uma situação líquida positiva. Os projetos devem enquadrar-se nos objetivos definidos nos avisos para apresentação de candidaturas, integrar toda a informação exigida e estar em conformidade com as disposições legais aplicáveis.
O sistema de incentivos apoia três tipologias de projetos: (i) o Voucher Deep Tech; (ii) o Voucher Go to EIC Accelerator; e (iii) e o Programa Start from Knowledge. O Voucher Deep Tech oferece um apoio de 60.000 € para capacitar empresas Deep Tech a participarem em programas internacionais. O Voucher Go to EIC Accelerator disponibiliza um apoio de 10.000 € para a elaboração de candidaturas à fase 2 do EIC Accelerator. O Programa Start from Knowledge concede um apoio de 30.000 € para estimular a criação de startups no meio académico e a transmissão de conhecimento científico e tecnológico.
Os beneficiários têm várias obrigações, incluindo realizar as ações elegíveis conforme aprovado, manter a situação tributária e contributiva regularizada, adotar comportamentos transparentes e submeter relatórios finais após a conclusão dos projetos. Os apoios são não reembolsáveis e pagos em modalidades de adiantamento e saldo final, dependendo do cumprimento das condições estabelecidas.
Este regulamento visa fortalecer o ecossistema de startups em Portugal, promovendo a inovação e competitividade através de incentivos financeiros específicos, com um foco especial em empresas Deep Tech e iniciativas acadêmicas.
Esta portaria entrou em vigor no dia 21 de fevereiro de 2025.
QUADRO REGULATÓRIO DA UE PARA A GESTÃO DE CRIPTOATIVOS: TRATAMENTO DE RECLAMAÇÕES, NOTIFICAÇÃO DE INTENÇÕES, CONTINUIDADE DE SERVIÇOS E APROVAÇÃO DE LIVRETES
Regulamento Delegado (UE) 2025/293 da Comissão de 30 de setembro de 2024; Regulamento Delegado (UE) 2025/294 da Comissão de 1 de outubro de 2024; Regulamento Delegado (UE) 2025/296 da Comissão de 31 de outubro de 2024; Regulamento Delegado (UE) 2025/298 da Comissão de 31 de outubro de 2024; Regulamento Delegado (UE) 2025/299 da Comissão de 31 de outubro de 2024; Regulamento Delegado (UE) 2025/303 da Comissão de 31 de outubro de 2024; Regulamento de Execução (UE) 2025/304 da Comissão de 31 de outubro de 2024
Recentemente, a Comissão Europeia emitiu uma série de Regulamentos Delegados e um Regulamento de Execução que visam complementar e clarificar o quadro regulatório vigente relativo a criptoativos na União Europeia. Estes regulamentos abordam temas cruciais como o tratamento de reclamações relacionadas com criptofichas referenciadas a ativos, os requisitos e procedimentos para prestadores de serviços de criptoativos, a aprovação de livretes de criptoativos, metodologias para estimar transações associadas a criptofichas, bem como a continuidade e regularidade na prestação de serviços de criptoativos. De seguida, apresentamos uma visão geral dessas novas disposições, destacando os principais pontos e implicações para o setor de criptoativos.
O Regulamento Delegado (UE) 2025/293 da Comissão, datado de 30 de setembro de 2024, foca-se no tratamento de reclamações relativas a criptofichas referenciadas a ativos. Este regulamento visa proteger os consumidores e garantir a transparência nos procedimentos de reclamação. Os emitentes de criptofichas e entidades terceiras são obrigados a fornecer informações claras sobre os procedimentos de reclamação, assegurando que estas podem ser apresentadas gratuitamente e em várias línguas. Além disso, devem garantir um tratamento justo e eficiente das reclamações, com uma política de gestão aprovada pela direção de topo e uma função de gestão das reclamações bem definida.
Adicionalmente, o Regulamento Delegado (UE) 2025/294 da Comissão, de 1 de outubro de 2024, complementa o Regulamento (UE) 2023/1114 do Parlamento Europeu e do Conselho, estabelecendo normas técnicas de regulamentação que especificam os requisitos, modelos e procedimentos para o tratamento de reclamações por prestadores de serviços de criptoativos. Este regulamento visa garantir a proteção dos clientes e a eficiência no processo de reclamação, exigindo que os prestadores de serviços de criptoativos proporcionem acesso fácil a uma descrição clara, compreensível e atualizada do seu procedimento de tratamento de reclamações, bem como ao modelo normalizado constante do anexo ao Regulamento. As reclamações devem ser tratadas de forma rápida e atempada, com comunicação clara e simples, e os prestadores de serviços devem analisar continuamente os dados relativos ao tratamento das reclamações para melhorar os seus processos.
Por sua vez, o Regulamento Delegado (UE) 2025/296 da Comissão, de 31 de outubro de 2024, estabelece normas técnicas para o procedimento de aprovação dos livretes de criptoativos. Este regulamento detalha a comunicação entre instituições de crédito e autoridades competentes, bem como os requisitos para a avaliação e aprovação dos livretes. Especifica os prazos e procedimentos para a apresentação, avaliação e aprovação dos livretes, garantindo uma comunicação eficiente e a manutenção de registos por meios eletrónicos.
Ademais, o Regulamento Delegado (UE) 2025/298 da Comissão, de 31 de outubro de 2024, complementa o Regulamento (UE) 2023/1114 do Parlamento Europeu e do Conselho, especificando a metodologia para estimar estimar a média trimestral do número e do valor agregado das transações diárias que estão associadas às utilizações da criptoficha referenciada a ativos como meio de troca numa área de moeda única. Este regulamento define que as transações devem incluir:
- Transações liquidadas num registo distribuído;
- Transações liquidadas fora de um registo distribuído;
- Transações entre carteiras com custódia;
- Transações entre uma carteira com custódia e uma carteira sem custódia ou outro tipo de endereço de registo distribuído que não seja controlado por um detentor da criptoficha referenciada a ativos ou por um prestador de serviços de criptoativos.
No entanto, estão excluídas transferências entre diferentes endereços ou contas da mesma pessoa. O emitente deve dispor de sistemas e procedimentos para assegurar a qualidade dos dados apresentados.
Relativamente ao Regulamento Delegado (UE) 2025/299 da Comissão, de 31 de outubro de 2024, o mesmo visa complementar o Regulamento (UE) 2023/1114 do Parlamento Europeu e do Conselho, também de 31 de outubro de 2024, abordando a continuidade e a regularidade da prestação dos serviços de criptoativos. Este regulamento trata da resposta a incidentes, comunicação com clientes e requisitos de continuidade das atividades para prestadores de serviços de criptoativos.
Em relação ao Regulamento Delegado (UE) 2025/303 da Comissão, igualmente datado de 31 de outubro de 2024, este estabelece normas técnicas de regulamentação para entidades financeiras que desejam prestar serviços de criptoativos. Este regulamento detalha as informações que devem ser fornecidas às autoridades competentes, incluindo planos de atividades, de continuidade das atividades, e medidas contra branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo. O regulamento detalha ainda as informações que devem ser fornecidas à autoridade competente, relativamente a vários tipos de serviços que as entidades financeiras pretendam prestar relativamente a criptoativos, incluindo, entre outros, custódia e administração, regras de operação das plataformas de negociação, troca de criptoativos por fundos ou por outros criptoativos, política de execução, consultoria sobre criptoativos ou gestão de carteiras de criptoativos
Finalmente, o Regulamento de Execução (UE) 2025/304, de 31 de outubro de 2024, estabelece normas técnicas de execução para a aplicação do Regulamento (UE) 2023/1114, especificamente no que diz respeito à notificação por entidades financeiras relativas à prestação de serviços de criptoativos. Este regulamento inclui procedimentos e formulários normalizados para a notificação, exigindo que as informações sejam exatas, completas e atualizadas. As autoridades competentes devem designar um ponto de contacto e confirmar a receção das notificações, além de detalhar os procedimentos para a notificação de alterações às informações prestadas.
Em conjunto, estes regulamentos formam um quadro regulatório robusto e detalhado para a gestão de criptoativos na União Europeia, assegurando a proteção dos consumidores, a transparência e a continuidade dos serviços prestados.
BOAS PRÁTICAS A OBSERVAR NO TÉRMINO DA RELAÇÃO BANCÁRIA
Carta Circular n.º CC/2025/00000003, de 23 de janeiro de 2025 - BdP
A Carta Circular n.º CC/2025/00000003 (a “Circular”) emitida pelo BdP visa esclarecer e harmonizar práticas relacionadas com a denúncia de contratos de contas e cartões de pagamento, o serviço de mudança de conta e o tratamento de contas coletivas após óbito de um dos titulares.
Esta iniciativa surge em resposta a reclamações e práticas distintas observadas no mercado, bem como a dúvidas interpretativas relativas ao Regime Jurídico dos Serviços de Pagamento e da Moeda Eletrónica (“RJSPME”), que prejudicam o cumprimento correto das normas e os direitos dos clientes bancários.
Esta Circular visa assim regular as seguintes matérias:
- Condições para Encerramento de Conta: As instituições não devem impedir a denúncia do contrato por motivos que possam ser resolvidos pela própria instituição ou pelo titular, desde que devidamente informado;
- Acesso através de Canais Digitais: As instituições devem permitir que o pedido de mudança de conta seja efetuado através de canais digitais, se estes forem disponibilizados para abertura de conta .
- Procedimentos após Comunicação do Óbito: As instituições devem proceder ao bloqueio do saldo da conta proporcionalmente ao número de cotitulares (presumindo que são partes iguais no saldo), garantindo o direito à movimentação da conta pelos cotitulares sobrevivos;
- Denúncia por Iniciativa do Cliente: As instituições devem garantir que a denúncia do contrato de utilização de cartão de pagamento não ultrapassa o prazo de um mês desde o pedido formulado pelo cliente;
- Restituição de Encargos Pagos Antecipadamente: As instituições devem restituir encargos cobrados antecipadamente na parte proporcional ao período decorrido até à data da cessação do contrato.
Numa nota mais inovadora, a Circular introduz também boas práticas para uniformizar procedimentos entre instituições, como a disponibilização de formulários para encerramento e mudança de conta, visando facilitar o processo para os clientes; e, por fim, obsta à cobrança de encargos indevidos, reforçando os deveres de informação das instituições.
Os entendimentos consagrados nesta Circular devem ser incorporados no seio dos procedimentos das instituições até dia 1 de janeiro de 2026, sendo que até 15 de janeiro as mesmas devem remeter ao BdP um relatório final da implementação das práticas recomendadas, acompanhado por uma avaliação do responsável pela função de conformidade.
INFORMAÇÃO SOBRE PRÁTICAS DE IGUALDADE ENTRE GÉNEROS
Instrução n.º 1/2025, de 23 de janeiro de 2025 – BdP
As EBA/GL/2023/08 visam operacionalizar e harmonizar a informação que a EBA e as autoridades nacionais competentes têm de recolher junto das instituições de crédito e empresas de investimento para dar cumprimento às obrigações legais que impõem a implementação de políticas de diversidade e disparidades salariais entre géneros.
Assim, na Instrução n.º 1/2025 (a “Instrução”) o BdP visa regulamentar este dever, fixando o formato e prazo de reporte das políticas de diversidade de género das instruções de crédito.
As instituições devem submeter de modo individual as informações requeridas pelos Anexos I a XI das orientações EBA/GL/2023/08, seguindo os requisitos de preenchimento dos parágrafos 19 a 43 das mesmas.
Para esta submissão, a Instrução determina que este reporte deve ser efetuado no formato da versão 3.5 da taxonomia da EBA, por via do sistema BPnet; a cada três anos, até ao dia 30 de abril do ano civil seguinte; com informação referente ao ano civil anterior. Deste modo, repare-se que o primeiro reporte deverá ser submetido até 30 de abril de 2025, com informação relativa a 31 de dezembro de 2024.
ACESSO A SISTEMAS DE PAGAMENTOS
Decisão (UE) 2025/222, de 27 de janeiro de 2025 – Banco Central Europeu
A Decisão (UE) 2025/222 do Banco Central Europeu, datada de 27 de janeiro de 2025, aborda o acesso de prestadores não bancários de serviços de pagamento (“NB-PSP”) a sistemas de pagamentos operados por bancos centrais do Eurosistema e a contas de bancos centrais, motivada pela pretensa de facilitar os pagamentos imediatos na área do euro.
A decisão estabelece que os NB-PSP podem ter acesso aos sistemas de pagamentos do Eurosistema, desde que cumpram critérios não discriminatórios, objetivos e baseados no risco, estando – caso se verifiquem cumpridos estes requisitos – os bancos do Eurosistema obrigados a garantir o acesso dos mesmos ao seu sistema de pagamentos.
Para o efeito, os NB-PSP devem instalar a infraestrutura necessária para conexão com o sistema de pagamentos, fornecer informações de apoio, implementar medidas de segurança adequadas e apresentar declarações de conformidade com as condições estabelecidas.
Ademais, a decisão determina que os bancos centrais do Eurosistema não devem oferecer contas de salvaguarda a NB-PSP ou prestadores de serviços de criptoativos, tal como impõe limites aos saldos que os NB-PSP podem manter em contas nos sistemas de pagamentos operados por bancos centrais, para garantir que esses fundos sejam usados apenas para liquidação de obrigações.
É assim promovida uma abordagem uniforme, procurando evitar-se discriminações baseadas no local de estabelecimento dos NB-PSP, uma vez que os NB-PSP eram suscetíveis de ser incluídos na lista de instituições elegíveis para participar em sistemas de pagamentos designados, conforme a Diretiva 98/26/CE, mas sob a condição de cumprirem determinados requisitos adicionais e da aprovação da sua solicitação neste sentido.
Será inevitável, portanto, concluir que a Decisão (UE) 2025/222 representa uma mudança de paradigma ao proporcionar um acesso mais estruturado e regulado por parte dos NB-PSP, promovendo a eficiência e a segurança no setor de pagamentos de retalho na área do euro.
NORMAS TÉCNICAS DE REGULAMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADES DE SUPERINTENDÊNCIA
Regulamento Delegado (UE) 2025/295, de 24 de outubro de 2024 – CE
O Regulamento Delegado em causa complementa o regime consagrado no Regulamento (EU) 2022/2554 (“Regulamento DORA”), sobretudo no que toca a disposições referentes à supervisão do setor financeiro, concretamente relativa ao controlo de terceiros prestadores de serviços de tecnologias de informação e comunicação (“TIC”).
Os TIC podem submeter pedidos de designação voluntária como “crítico” à Autoridade Europeia de Supervisão (“AES”) caso preencham os requisitos do artigo 31º do Regulamento DORA, e, portanto, quando os seus serviços sejam considerados absolutamente essenciais para o desenvolvimento de operações de determinadas entidades financeiras. Para que assim o sejam consideradas pela AES, devem apresentar um conjunto de informações que o Regulamento Delegado vem listar.
O Regulamento Delegado em questão vem densificar normas técnicas de regulamentação para harmonizar as condições que permitem o exercício de atividades de superintendência sobre prestadores de serviços TIC considerados críticos para o setor financeiro.
Deste modo, o diploma consagra uma série de informações necessárias à submissão do pedido de qualificação da entidade como crítica, tais como a descrição da estrutura empresarial, uma estimativa da quota de mercado do prestador de serviços TIC, uma lista das entidades financeiras que a si recorram ou uma autoavaliação do grau de substituibilidade de cada serviço de TIC prestado pelo requerente.
Paralelamente, estabelece um conjunto de mecanismos de monitorização que pressupõem a elaboração de relatórios regulares sobre as suas práticas de gestão de riscos e medidas de resiliência.
Nesta lógica, este Regulamento Delegado dá continuidade ao quadro regulatório DORA, tornando os procedimentos para a sua viabilização claros e acessivos, por forma a garantir o cumprimento devido das entidades por ele abrangidas.
EMPRESAS DE SEGUROS E DE RESSEGUROS - UNIFORMIZAÇÃO DO CÁLCULO DAS PROVISÕES TÉCNICAS E DOS FUNDOS PRÓPRIOS
Regulamento de Execução (UE) 2025/216, de 6 de Fevereiro de 2025 – CE
O Regulamento de Execução em causa visa uniformizar os métodos de cálculo das provisões técnicas e dos fundos próprios de base pelas empresas de seguros e de resseguros para efeitos da Diretiva 2009/138/CE.
Assim, o Anexo I do Regulamento compila a estrutura das taxas de juro sem risco, tendo em conta a sua duração e a moeda em causa; ao passo que o Anexo II trata os spreads fundamentais para o cálculo de ajuste da compensação, também tendo em conta a sua duração, o pais de que se trata e a sua exposição, bem como a qualidade do crédito; e, por fim, o Anexo III consagra uma tabela de ajustamento à volatilidade da estrutura das taxas de juro sem risco para os diferentes prazos, em pontos de base.
No fundo, trata-se de um diploma que, embora extremamente técnico, introduz valores e critérios muito relevantes na prática para a realização da contabilidade das empresas do setor dos seguros; sendo o propósito do diploma o de nivelar os procedimentos contabilísticos neste setor, independentemente da moeda ou legislação em causa.
Dada a necessidade urgente de ter informação atualizada e clara sobre como proceder aos cálculos para elaboração dos relatos, o presente Regulamento de Execução entrou em vigor com carácter imediato.
5. Fiscal
IRS – DECLARAÇÃO DE RENDIMENTOS – MODELO 3 DO IRS
Portaria n.º 72-B/2025/1, de 28 de fevereiro (DR 42, Suplemento, Série I, de 28 de fevereiro de 2025)
A referida portaria procedeu à aprovação dos modelos destinados ao cumprimento da obrigação declarativa prevista no n.º 1 do artigo 57.º do Código do IRS, e respetivas instruções de preenchimento.
Esta portaria entrou em vigor no dia 1 de março de 2025 e produz efeitos desde 1 de janeiro de 2025.
BENEFÍCIOS FISCAIS – INCENTIVO À INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA E INOVAÇÃO – REGULAMENTAÇÃO
Portaria n.º 52-A/2025/1, de 25 de fevereiro (DR 39, Suplemento, Série I, de 25 de fevereiro de 2025)
A presente portaria altera a Portaria n.º 352/2024/1, de 23 de dezembro, que regulamenta o regime de incentivo fiscal à investigação científica e inovação, previsto no artigo 58.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Esta portaria entrou em vigor no dia 26 de fevereiro de 2025.
BENEFÍCIOS FISCAIS – INCENTIVO À INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA E INOVAÇÃO - MODELO ANEXO DE INSCRIÇÃO
Despacho n.º 2416-A/2025, de 20 de fevereiro (DR 36, Série II, Suplemento, de 20 de fevereiro de 2025)
O despacho em referência aprova o modelo oficial de inscrição dos sujeitos passivos no regime de incentivo fiscal à investigação científica e inovação, previsto no artigo 58.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais, e respetivas instruções.
IRS – SALDO DE MAIS-VALIAS RESULTANTES DA VENDA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS EM PME SEDIADAS EM PAÍS ESTRANGEIRO
Ficha Doutrinária, P 26949, de 14 de fevereiro de 2025 - AT
No referido processo, o requerente, um cidadão britânico residente em Portugal, pretendia que lhe fosse prestada informação vinculativa quanto à possibilidade de aplicação da exclusão de tributação prevista no n.º 3 do artigo 43.º do Código do IRS à venda de uma parte do capital social que possuía numa micro ou pequena empresa sediada no Reino Unido. O requerente detinha 30% do capital social da sociedade e pretendia alienar 5% do mesmo a uma outra sociedade residente no Reino Unido.
O n.º 3 do artigo 43.º do CIRS estipula que, nos casos em que as participações sociais transmitidas digam respeito a micro e pequenas empresas, o saldo das mais-valias, quando positivo, é apenas considerado em 50%. Uma vez que a empresa em questão cumpre os requisitos estipulados no n.º 1 do artigo 2.º do anexo do Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro, para a qualificação como micro e pequena empresa tendo em conta os dados do último exercício contabilístico encerrado, o requerente pretendia ver confirmado se poderia beneficiar do regime previsto no n.º 3 do artigo 43.º do Código do IRS caso procedesse à alienação das participações sociais da empresa - uma vez que, embora a mesma tenha a sua sede no Reino Unido, nada resulta da leitura do artigo do Código do IRS que a exclusão de tributação diga apenas respeito a sociedades sediadas em território português.
A AT veio considerar que o requerente, residente fiscal em território nacional, pode beneficiar do regime previsto no n.º 3 do artigo 43.º do Códgo do IRS caso proceda à alienação das participações sociais da sociedade sediada no Reino Unido e esta seja considerada uma micro ou pequena empresa. Deve, no entanto, em sede de controlo de mais-valias, apresentar prova de que a empresa com sede no estrangeiro reúne todos os requisitos materiais que lhe permitem beneficiar deste estatuto - nomeadamente os previstos na recomendação 2003/361/CE da Comissão e no DL n.º 372/2007, de 6 de novembro. Esta posição da AT alicerça-se no princípio da livre circulação de capitais, estabelecido no artigo 63.º do TFUE (segundo o qual são proibidas todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados Membros da UE e entre Estados Membros e países terceiros) e na jurisprudência do Tribunal de Justiça da UE. Embora esta questão já tenha sido discutida previamente nos tribunais portugueses, a novidade desta decisão prende-se com o facto de a AT ter vindo, através desta informação vinculativa, a aceitar este entendimento expressamente.
STA - IRC - INCOMPATIBILIDADE DO ARTIGO 22.º DO EBF COM A LIBERDADE DE CIRCULAÇÃO DE CAPITAIS EM CASOS QUE ENVOLVEM ENTIDADES NÃO EUROPEIAS
Acórdão de 12 de fevereiro de 2025 (Processo 0727/19.3BELRS) - STA
O acórdão em referência foi proferido na sequência da interposição de recurso para o STA, por parte da AT, de sentença que julgou procedente impugnação judicial e anulou o ato de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra atos de liquidação por retenção na fonte de IRC que incidiram sobre dividendos auferidos em território nacional por um fundo de investimento constituído e a operar de acordo com a legislação dos EUA, onde esse fundo era residente, para efeitos fiscais, à data dos factos.
Os dividendos distribuídos por sociedades com residência fiscal em Portugal nas quais o impugnante detinha participações foram tributados através de retenção na fonte de IRC, ao abrigo do disposto no artigo 22.º do EBF.
À data dos factos, o referido artigo excluía de tributação os dividendos distribuídos por sociedades residentes em Portugal a fundos de investimento mobiliário que se constituam e operem de acordo com a legislação nacional (residentes em território nacional), mas sujeitando a retenção na fonte em IRC os dividendos distribuídos por essas mesmas sociedades a fundos de investimento mobiliário que não tenham sido constituídos nem operem de acordo com a legislação nacional e que sejam, por isso, não residentes.
O impugnante (e o Tribunal a quo) consideraram que esta redação colidia com livre circulação de capitais preceituada no artigo 63.º do TFUE.
A questão fundamental que se colocou no recurso em análise foi a de determinar, portanto, se a norma redigida nestes termos constitui uma restrição à liberdade de circulação de capitais não consentida pelo direito primário europeu, potenciando um tratamento fiscal discriminatório dos Organismos de Investimento Coletivo (“OIC”) não residentes face aos residentes.
Questões muito semelhantes já foram apreciadas pelo STA, nomeadamente no acórdão de 13 de setembro de 2023, processo 715/18.7BELRS, e, mais recentemente, nos processos 0802/21.4BELRS, 0806/21.7BELRS, 0755/19.9BELRS, 0757/19.5BELRS, 01676/20.8BELRS e 0711/18.4BELRS, todos de 2024.
A nível europeu, esta questão foi também apreciada no acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), de 17 de março de 2022, proferido no âmbito do processo C-545/19 – acórdão no qual o Tribunal recorrido assentou a sua decisão. O TJUE veio concluir no referido processo que «o artigo 63.º TFUE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação de um Estado-Membro (“EM”) por força da qual os dividendos distribuídos por sociedades residentes a um organismo de investimento coletivo (OIC) não residente são objeto de retenção na fonte, ao passo que os dividendos distribuídos a um OIC residente estão isentos dessa retenção». Esta jurisprudência, não obstante proferida a propósito de um OIC de um EM da União Europeia, aplica-se, também, a um OIC de um país terceiro, uma vez que, por força do artigo 63.º, n.º 1 do TFUE, a livre circulação de capitais aplica-se tanto aos fluxos de capitais entre EMs como entre EMs e países terceiros, sem nenhuma condição de reciprocidade (como resulta do acórdão de 10 de fevereiro de 2011, processos C-436/08 e C-437/08), sendo esta a característica que distingue a livre circulação de capitais de todas as outras liberdades do mercado interno. É, precisamente, neste contexto que reside o caráter inovador desta decisão do STA que, apesar de já se ter pronunciado neste sentido em questões que envolviam entidades europeias, vem agora, pela primeira vez, assumir esta posição relativamente a uma entidade não europeia ou terceira.
Assim, em linha com aquela que tem sido a orientação seguida pela jurisprudência, vem o STA, na decisão em referência, reforçar o entendimento de que o artigo 22.º do EBF, na redação dada pelo DL n.º 7/2015, de 13 de janeiro, é incompatível com a liberdade de circulação de capitais que decorre do artigo 63.º do TFUE, na medida em que limita o regime de isenção nele previsto aos OIC constituídos segundo a legislação nacional, dele excluindo os OIC constituídos segundo a legislação de outros Estados – europeus ou não europeus.
Assim, o STA concluiu que a norma em causa encerrava um tratamento discriminatório, que se poderia traduzir numa tributação efetiva mais elevada sobre os não residentes – o que ocorria efetivamente na situação que deu origem ao processo, razão pela qual negou provimento ao recurso e manteve a sentença recorrida.
STA – UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA – INDEPENDÊNCIA DO DIREITO DOS CONTRIBUINTES A JUROS DE MORA POR ATRASO NA EXECUÇÃO DE DECISÃO DO RECONHECIMENTO DO DIREITO A JUROS INDEMNIZATÓRIOS
Acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2025, de 27 de novembro de 2024 (Processo 3009/04.1BELSB-A) - STA
O presente recurso foi proferido na sequência na apresentação de recurso por oposição de julgados pela AT, nos termos do artigo. 284.º do CPPT.
O problema jurídico subjacente no caso sub judice corresponde a saber se são devidos juros de mora, nos termos do artigo 43.º, n.º 5 da LGT, na redação dada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro, ainda que não se verifiquem os pressupostos constitutivos da obrigação de pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1, do artigo 43.º da LGT.
No acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 1/2025, de 27 de novembro de 2024, (Processo 3009/04.BELSB-A), decidiu o STA que: “O n.º 5 do art. 43.º da LGT, que prescreve “juros de mora dobrados” quando a AT incumpra o prazo de execução espontânea da decisão judicial que implique a restituição de tributo já pago, é uma norma introduzida como medida de pressão, de modo a promover o cumprimento pontual das obrigações decorrentes de decisões judiciais, transitadas em julgado, com natureza de sanção e sem natureza indemnizatória. As regras da hermenêutica das normas legais tributárias (que são as do art. 9.º do CC, ex vi do n.º 1 do art. 11.º da LGT) não consentem que do n.º 5 do art. 43.º da LGT se extraia o sentido de que os juros de mora que nele se estabelecem só são devidos nas situações em que estejam também verificados os requisitos para o pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 1 do mesmo art. 43.º da LGT. Pelo contrário, tais regras impõem que se conclua no sentido de que os juros de mora previstos no n.º 5 do art. 43.º da LGT são devidos em todas as situações em que se verifique a ultrapassagem do termo do prazo de execução espontânea de decisão transitada em julgado.”
Pelo exposto, os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA acordaram em negar provimento ao recurso, mantendo o acórdão recorrido, e em uniformizar jurisprudência nos seguintes termos: “Os juros de mora previstos no n.º 5 do art. 43.º da LGT são devidos em todas as situações em que se verifique a ultrapassagem do termo do prazo de execução espontânea de decisão transitada em julgado, ainda que não se verifiquem os pressupostos constitutivos da obrigação de pagamento de juros indemnizatórios nos termos do n.º 1 do art. 43.º da LGT.”
6. Laboral
SISTEMA DE AUTORIZAÇÃO DE ENTRADAS E SAÍDAS E AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA TEMPORÁRIA DOS CIDADÃOS DA CPLP
Lei n.º 9/2025, de 13 de fevereiro (DR 31, Série I, de 13 de fevereiro de 2025)
A Lei n.º 9/2025, de 13 de fevereiro (“Lei n.º 9/2025”) veio alterar pela 15.ª vez a Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, que aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional (“Lei n.º 23/2007”), procedendo, essencialmente:
- à execução, no nosso ordenamento jurídico, do Regulamento (EU) 2017/2226, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de novembro de 2017, que por sua vez estabeleceu o Sistema de Entrada / Saída (“SES”) – um sistema informático automatizado de registo dos dados das entradas e saídas e dos dados das recusas de entrada dos nacionais de países terceiros (i.e., cidadãos que não possuam nacionalidade de um Estado-Membro da UE / de país do Espaço Schengen);
- ao alargamento do período de validade das autorizações de residência temporária atribuídas a cidadãos nacionais de Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, que sejam titulares de visto de curta duração ou tenham uma entrada legal no território nacional, para dois anos, renovável por períodos sucessivos de três anos (anteriormente, o período de validade poderia variar entre 91 dias e um ano);
- à previsão de que os cidadãos estrangeiros que permaneçam ilegalmente em território nacional, ou cuja autorização de residência tenha sido cancelada, possam ser notificados não só pela AIMA, I.P., como também pela GNR ou pela PSP, para abandonar voluntariamente o território nacional, no prazo que lhes for concedido.
A Lei n.º 9/2025 entrou em vigor no passado dia 14 de fevereiro de 2025.
CLÁUSULA DE EXCLUSIVIDADE – DESPEDIMENTO COM JUSTA CAUSA
Acórdão de 12 de fevereiro de 2025 (Processo n.º 14603/23.1T8LSB.L1.S1) - STJ
O Acórdão em apreço foi proferido pelo STJ no âmbito de ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude de despedimento, intentada por um trabalhador (“Autor”) contra a sua entidade empregadora, uma agência noticiosa (“Ré”).
O Autor havia sido despedido com fundamento na violação da cláusula de exclusividade constante do seu contrato de trabalho, na qual se definia que (i) o Autor estava obrigado a pedir autorização escrita ao seu superior hierárquico para desenvolver qualquer trabalho remunerado ou atividade jornalística externa; assim como que (ii) a autorização concedida poderia ser revogada a qualquer momento pela Ré, caso o trabalho externo prejudicasse os interesses desta.
Em primeiro lugar, quanto à cláusula de exclusividade, o STJ concluiu pela sua validade, não obstante (i) o disposto no artigo 129.º, n.º 1, alínea k), do Código do Trabalho, nos termos do qual “[é] proibido ao empregador obstar a que o trabalhador exerça outra atividade profissional, salvo com base em fundamentos objetivos, designadamente segurança e saúde ou sigilo profissional, ou tratá-lo desfavoravelmente por causa desse exercício”, e (ii) o facto de não ter sido fixada qualquer contrapartida económica pela exclusividade.
O STJ esclareceu que a cláusula de exclusividade incluída no contrato de trabalho assentava em fundamentos “reais, sérios e legítimos”, pois, atuando a Ré no mercado noticioso, o sucesso das suas reportagens dependeria, em boa parte, da sua novidade e antecipação, daí que não pudesse permitir ao Autor que desenvolvesse reportagens para outras empresas em temas idênticos ou conexos com os que a própria agência pretendia apresentar.
Além disso, o STJ assinalou que embora “a exclusividade esteja frequentemente associada a um acréscimo retributivo, nesta matéria vigora o princípio da autonomia privada”.
Em segundo lugar, o Acórdão deteve-se na questão da admissibilidade do despedimento com justa causa do Autor. Sendo a cláusula de exclusividade válida, o STJ decidiu que a mesma havia sido violada pelo Autor, quando este decidiu colaborar na preparação de uma reportagem para uma estação televisiva relativa a um tema conexo com o que se encontrava a ser preparado pela Ré, sem a sua prévia autorização. Além disso, o Autor não só tinha conhecimento de que a Ré se encontrava a preparar a reportagem referida supra, como utilizou, na preparação da reportagem para a estação televisiva, informações que obteve ao serviço da Ré.
Em resultado, o STJ determinou que o Autor, com o seu comportamento, preteriu gravemente o dever de lealdade, na sua vertente de dever de não concorrência com o empregador, assim como os deveres de probidade e de realizar o trabalho com zelo e diligência.
Concomitantemente, decidiu o STJ que a conduta perpetrada pelo Autor tornou prática e imediatamente impossível a subsistência da relação laboral, validando o despedimento.
APLICAÇÃO DO MÉTODO INDICIÁRIO – REJEIÇÃO DE RECURSO DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Acórdão de 12 de fevereiro de 2025 (Processo n.º 12510/19.1T8SNT.L1.S1-A) - STJ
No caso em apreço, o autor intentou uma ação de condenação contra a entidade à qual prestava serviços (“Ré”), peticionando o reconhecimento da existência de um contrato de trabalho com a mesma. Em sede de recurso, o STJ, tendo aplicado o método indiciário para a qualificação de uma relação laboral (previsto no artigo 12.º do Código do Trabalho), concluíra que existia um vínculo de trabalho entre as partes.
A Ré, inconformada, intentou recurso para uniformização de jurisprudência, com fundamento na alegada contradição entre este acórdão e um outro do mesmo Tribunal, sobre a mesma questão de direito. Alegou a Ré que o STJ, no âmbito de outro processo supostamente idêntico ao dos autos em análise, tinha aplicado de forma distinta o método indiciário, encontrando-se, por isso, as duas decisões em contradição.
O STJ, através de despacho, rejeitou a admissibilidade do recurso (o “Despacho”), afastando a hipótese de contradição entre as decisões em confronto, uma vez que os quadros factuais subjacentes eram distintos e, por conseguinte, reclamavam soluções diferentes.
Com efeito, no acórdão alegadamente em contradição decidira-se que o prestador (i) não estava sujeito a qualquer obrigação de exclusividade (inclusivamente, trabalhava para concorrentes da contraparte), (ii) era titular dos meios de produção que utilizava e (iii) auferia uma remuneração variável; ao passo que no acórdão recorrido se determinara que o trabalhador (i) estava sujeito à obrigação de exclusividade, (ii) utilizava meios de produção, em parte, disponibilizados pela empresa, (iii) auferia uma retribuição mista e, ainda, (iv) tinha gozado dias de férias.
A Ré reclamou do Despacho para a Conferência do STJ. Por sua vez, o Acórdão em apreço, pronunciando-se sobre a reclamação da Ré, confirmou o teor do Despacho.
Neste conspecto, o STJ decidiu que, na aplicação do método indiciário, pode chegar-se a diferente solução na medida em que os indícios sejam distintos, sem que tal traduza ou represente uma contradição entre decisões.
ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO – NULIDADE
Acórdão de 12 de fevereiro de 2025 (Processo n.º 3741/19.5T8STB.E1.S1) - STJ
O Acórdão em apreço foi proferido pelo STJ no contexto de um recurso interposto por três trabalhadores (“Autores”) no qual foi pedida a condenação da entidade empregadora (“Ré”) no pagamento de trabalho suplementar. Os três trabalhadores tinham recebido, no entanto, compensações por isenção de horário de trabalho (“IHT”) no decurso da sua relação com a Ré, cuja validade foi colocada em causa pelos próprios nos presentes autos.
Em relação a dois dos Autores, com contratos de trabalho celebrados em 2002, o Acórdão declarou a nulidade das respetivas isenções, por não terem sido precedidas dos pedidos de autorização à Inspeção-Geral do Trabalho, nem das declarações de consentimento (por escrito) dos trabalhadores, conforme legalmente exigido à época.
No entanto, e em linha com o que havia sido decidido pelo Tribunal da Relação, o STJ fez notar que estes Autores “tinham conhecimento de que estavam a receber uma importância que ainda com uma designação errada se destinava a compensá-los pelo trabalho suplementar realizado”.
O STJ concluiu, assim, que a cumulação do pagamento do trabalho suplementar com a compensação que tinham recebido pela “pseudo-isenção” configuraria uma situação de enriquecimento ilícito. Determinou, por isso, a dedução dos valores já pagos a título de compensação por IHT aos montantes devidos a título de trabalho suplementar.
Por sua vez, em relação ao terceiro Autor, com contrato de trabalho celebrado em 2005 (i.e., já no âmbito do Código de Trabalho de 2003), o STJ considerou que, a ter existido um acordo de IHT meramente verbal (o que nem sequer ficara provado), este sempre teria de ser declarado nulo por não ter ficado provada a sua redução a escrito, como era legalmente exigido à luz daquele diploma.
O STJ determinou que considerar o acordo de IHT nulo como válido, durante o tempo em que foi executado (como já havia decidido no passado, mas quanto a uma situação com contornos distintos), neste caso concreto violaria as garantias do trabalhador.
Com efeito, as contrapartidas económicas oferecidas no acordo de IHT seriam de valor inferior ao que resultaria do pagamento das horas de trabalho suplementar prestadas (e que resultaram provadas). Neste sentido, não poderia a entidade empregadora servir-se da invocação da existência de um acordo verbal para prejudicar as garantias do trabalhador.
Consequentemente, o STJ determinou o pagamento, pela Ré, das horas de trabalho suplementar prestadas pelo Autor, deduzindo os montantes que este recebeu por força do IHT, indo ao encontro da solução alcançada para quanto aos outros dois Autores.
7. Público
REGULAMENTO DA REDE NACIONAL DE DISTRIBUIÇÃO DE GÁS – HIDROGÉNIO VERDE
Despacho n.º 2791/2025 da Direção-Geral de Energia e Geologia (DR 42, Série II, de 28 de fevereiro de 2025)
O Despacho n.º 2791/2025 da Direção-Geral de Energia e Geologia (“DGEG”), de 28 de fevereiro (“Despacho n.º 2791/2025”) procede a uma alteração ao Regulamento da Rede Nacional de Distribuição de Gás (“RRNDG”), originalmente aprovado pelo Despacho n.º 806-B/2022 da DGEG, de 19 de janeiro.
Esta revisão é impulsionada pela necessidade de adaptar o enquadramento normativo das redes de gás para promover a utilização de gases renováveis, com especial enfoque no hidrogénio verde, em setores industriais e de transporte.
Os principais objetivos desta revisão incluem a integração de gases renováveis ou de baixo teor de carbono injetados na rede pública de gás, estabelecendo critérios técnicos e operacionais para a produção, certificação, distribuição, armazenamento e prevenção de fugas. Adicionalmente, o RRNDG estabelece aspetos da integração da produção de hidrogénio na RNDG (Rede Nacional de Distribuição de Gás), designadamente os princípios base de planeamento e de gestão de injeção de hidrogénio, incluindo a definição de uma nova metodologia de cálculo da capacidade de injeção de hidrogénio na RNDG, diferenciada por zona de rede, em função do consumo local e da percentagem máxima de incorporação (10 %).
A revisão abrange ainda a extensão da aplicação do RRNDG aos gasodutos de ligação entre as instalações de produção e os consumidores finais de hidrogénio, facilitando a descarbonização de setores industriais.
O Despacho n.º 2791/2025 entrou em vigor a 2 de janeiro de 2025.
8. Imobiliário
COMUNICAÇÃO DE OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO DE ARRENDAMENTO: PRONÚNCIA SOBRE A NECESSIDADE DE SER DIRIGIDA AO UNIDO DE FACTO
Acórdão de 21 de janeiro de 2025 - (Processo n.º 1019/2023) - TC
Em 21 de janeiro de 2025, o TC veio prolatar acórdão em sede de fiscalização concreta da constitucionalidade relativamente à interpretação do artigo 12.º, n.º 1, da Lei n.º 6/2006, de 27 de fevereiro, que aprovou o Novo Regime do Arrendamento Urbano (“NRAU”). Estava em causa a apreciação da constitucionalidade da interpretação do artigo 12.º, n.º 1 do NRAU no sentido de que a comunicação do senhorio de oposição à renovação do contrato de arrendamento não tem de ser dirigida à pessoa que viva em união de facto com o arrendatário e que não tenha outorgado o contrato.
Para o efeito, o TC considerou que a comunicação de oposição à renovação do contrato de arrendamento pelo senhorio não necessita de ser dirigida ao unido de facto do arrendatário que não tenha sido parte no contrato. Entendeu, ainda, que a Constituição não impõe uma equiparação total entre os efeitos jurídicos da união de facto e do casamento. Nesse sentido, sustentou que, ao contrário do casamento, que está sujeito a registo público e cujo estado civil do arrendatário constitui um elemento essencial do contrato de arrendamento, tal exigência não se verifica na união de facto. Com efeito, equiparar as duas situações implicaria uma diligência excessivamente complexa por parte do senhorio, que teria de averiguar se o arrendatário vive, ou não, em união de facto e, em caso afirmativo, identificar os elementos do unido de facto.
Nesses termos, o TC concluiu pela conformidade constitucional da interpretação do artigo 12.º, n.º 1, do NRAU, segundo a qual a comunicação do senhorio de oposição à renovação do contrato de arrendamento não tem de ser dirigida à pessoa que viva em união de facto com o arrendatário e que não tenha sido parte no contrato. Concluiu, ainda, que esta interpretação não viola o princípio da igualdade nem o princípio da segurança jurídica.
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[1] Nos termos do artigo 8. º, n.º 1, doRegulamento de Bruxelas I, que estabelece que se houver vários réus com pedidos estreitamente ligados, uma pessoa domiciliada num Estado-Membro pode ser processada no tribunal do domicílio de qualquer um dos restantes réus noutro Estado-Membro para evitar decisões inconciliáveis caso as ações fossem julgadas separadamente.