Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português
27 de maio de 2025
1. Contencioso Civil e Penal
- Alterações ao Regime Geral de Prevenção da Corrupção e ao Mecanismo Nacional Anticorrupção
- Processo Especial de Acompanhamento de maiores
2. Concorrência
- CE - Concentração – Autorização com Compromissos – Setor das embalagens
- TJUE - Abuso de Posição Dominante – Mercados digitais
- TRL - Processo da Banca – Reclamação Ministério Público – Arquivamento por prescrição
3. Financeiro
- Alterações Regulatórias no Regime da Gestão de Ativos e da Digitalização dos Reportes
4. Fiscal
- Informação Empresarial Simplificada / Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal
- Empreitadas de Reabilitação Urbana e Taxa Reduzida de IVA – Exigência de Aprovação de Operação de Reabilitação Urbana - Uniformização de Jurisprudência
- TC – Coeficientes de Desvalorização da Moeda – Tratamento Diferenciado de Mais Valias Mobiliárias e Imobiliárias para Efeitos de IRS – Ilegalidade e Inconstitucionalidade do Regime
- AT – Alterações Relevantes em Matéria de IVA
- EBF – Isenção de IMT e de Imposto do Selo – Cisão – Conceito de Ramo de Atividade
5. Imobiliário e urbanismo
- Alterações ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
6. Laboral
- Plataforma Digital – Inexistência de Contrato de Trabalho com o Estafeta
- Ajudas de Custo – Responsabilidade Solidária por Créditos Laborais – Pluralidade de Empregadores Não Escrita
- Trabalhadores Itinerantes – Lei Aplicável ao Contrato – Reintegração
7. Público
- Plano Nacional Ferroviário – Investimentos Ferroviários Prioritários
- Contratos Administrativos – Subcontratação – Fim dos limites percentuais do preço contratual
1. Contencioso Civil e Penal
ALTERAÇÕES AO REGIME GERAL DE PREVENÇÃO DA CORRUPÇÃO E AO MECANISMO NACIONAL ANTICORRUPÇÃO
Decreto-Lei n.º 70/2025, de 29 de abril (DR 82, Série I, de 29 de abril de 2025)
Foi publicado o Decreto-Lei n.º 70/2025, de 29 de abril, que altera o Decreto-Lei n.º 109-E/2021, de 9 de dezembro, o qual criou o Mecanismo Nacional Anticorrupção (“MENAC”) e estabeleceu o Regime Geral de Prevenção da Corrupção (“RGPC”) (“Decreto-Lei 70/2025”).
O Decreto-Lei 70/2025 introduz várias alterações à estrutura e ao funcionamento do MENAC, com o objetivo principal de reforçar a sua eficácia, autonomia e operacionalidade, em linha com a Agenda Anticorrupção aprovada pelo Governo em junho de 2024.
As alterações visam reforçar a autonomia, a eficiência e a capacidade operacional do MENAC, clarificar e alargar as suas competências, bem como simplificar a sua estrutura interna.
Este diploma entra em vigor 30 dias após a sua publicação, ou seja, a 29 de maio de 2025.
PROCESSO ESPECIAL DE ACOMPANHAMENTO DE MAIORES
Acórdão n.º 186/2025 (DR 65, Série II, de 02 de abril de 2025) – TC
O acórdão do Tribunal Constitucional (“TC”) em apreço julgou inconstitucional, por violação do artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa (“CRP”), o artigo 901.º do Código de Processo Civil (“CPC”) (cfr. redação dada pela Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto), na interpretação segundo a qual o recurso de apelação da decisão que decreta as medidas de acompanhamento do maior não ser admissível quando a discordância respeite apenas à nomeação da pessoa do acompanhante.
Esta decisão foi proferida na sequência da interposição de um recurso de constitucionalidade contra o acórdão do Tribunal da Relação do Porto (“TRP”) de 14 de dezembro de 2022. O acórdão recorrido recusou conhecer do objeto do recurso, interposto de uma decisão do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, no âmbito de um processo especial de acompanhamento de maior, nomeadamente no segmento relativo à nomeação da pessoa do acompanhante.
No entendimento do TRP, a decisão que nomeou o acompanhante do maior é irrecorrível, com base numa interpretação conjugada dos artigos 900.º, n.º 1, e 901.º do CPC, segundo a qual o recurso da decisão proferida neste tipo de processo está limitado às medidas de acompanhamento, sendo irrecorrível quanto aos restantes aspetos.
O TC considerou que essa interpretação viola o artigo 20.º, n.º 1 da CRP, que garante o direito de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva. No entendimento do TC, a decisão sobre a pessoa do acompanhante é fundamental para assegurar o cumprimento das finalidades inerentes a este processo especial — i.e. dignificar a pessoa carecida de medidas de acompanhamento, garantindo a sua autonomia e o respeito pela sua vontade. Neste sentido, o TC entendeu que, caso a decisão proferida não permita o respeito pela dignidade da pessoa visada e a prossecução do seu bem-estar, esta deve ser suscetível de recurso, sob pena de se restringir injustificadamente o direito ao recurso e o acesso a uma tutela jurisdicional efetiva.
Assim, o TC deu provimento ao recurso, julgando inconstitucional o artigo 901.º do CPC, no sentido de não ser admitido recurso de apelação quando a discordância quanto à sentença respeita apenas ao segmento relativo à nomeação da pessoa do acompanhante.
2. Concorrência
CE APROVA, COM COMPROMISSOS, A AQUISIÇÃO DA DS SMITH PELA INTERNATIONAL PAPER COMPANY
M.11564 - International Paper Company / DS Smith, 24 de janeiro de 2025 - CE
Em 24 de janeiro de 2025, a CE aprovou, com compromissos, a aquisição da DS Smith, uma empresa que se dedica à produção e fornecimento de embalagens, pela International Paper Company, que opera no mesmo setor.
Na sequência da notificação da operação de concentração, a CE concluiu que a transação, nos termos inicialmente propostos, poderia afetar negativamente a concorrência em vários mercados europeus de materiais e embalagens de cartão ondulado, uma vez que ambas as empresas têm posições de mercado relevantes e atividades nos mesmos mercados, sendo concorrentes diretas em diversas regiões.
Em particular, a CE identificou riscos relevantes de concorrência no Norte e Oeste de Portugal, Nordeste de Espanha; e Noroeste de França, onde a entidade resultante da operação passaria a deter uma posição de mercado significativa. A eliminação de um dos principais concorrentes nestes mercados teria como efeito uma redução da pressão concorrencial, com potenciais consequências negativas, como o aumento de preços, a deterioração das condições de fornecimento e a criação de barreiras à entrada de novos operadores. Consequentemente, segundo a CE, esta operação teria o potencial de afetar negativamente os clientes industriais que dependem destes produtos para embalar e distribuir os seus bens, existindo fundadas dúvidas quanto à compatibilidade da operação com o mercado interno.
Para dar resposta às preocupações identificadas, a International Paper Company comprometeu-se a alienar cinco das suas unidades de produção: três fábricas em França (Saint-Amand, Mortagne e Cabourg), uma fábrica em Portugal (Ovar) e uma fábrica em Espanha (Bilbao). Este desinvestimento abrange todos os ativos, pessoal e contratos necessários para assegurar a viabilidade e competitividade das referidas fábricas.
A CE considerou que os compromissos assumidos seriam suficientes para afastar as preocupações suscitadas em matéria de concorrência, ao permitir a entrada ou o reforço de operadores nos mercados afetados. Neste sentido, a CE aprovou a concentração, subordinando-a ao respeito integral dos compromissos assumidos pelas partes.
TJUE CONFIRMA ABUSO DE POSIÇÃO DOMINANTE DA GOOGLE NO SETOR DAS APLICAÇÕES
Acórdão de 25 de fevereiro de 2025 (C-233/23) - TJUE
O acórdão em apreço resulta de um pedido de reenvio prejudicial do Conselho de Estado italiano no que concerne uma decisão de abuso de posição dominante visando a Google.
Com efeito, no que concerne o substrato fáctico, o caso remonta a 2018, quando a Enel X, responsável por mais de 60% das estações de carregamento de veículos elétricos em Itália, solicitou à Google que tomasse as medidas necessárias para permitir que a JuicePass, uma aplicação desenvolvida pela Enel X e dedicada ao carregamento de veículos elétricos, funcionasse com a Android Auto. A plataforma Android Auto foi desenvolvida pela Google e permite que os utilizadores da Android acedam diretamente no ecrã do do carro a determinadas aplicações instaladas nos seus telemóveis.
A Google recusou o pedido, alegando que apenas aplicações de multimédia e de mensagens de terceiros eram (à data) compatíveis com a Android Auto. Em 2019, a Google voltou a recusar o respetivo acesso, desta vez invocando razões de segurança e a necessidade de afetar, de modo racional, os recursos necessários para a criação de um novo modelo, tendo, nesta sequência, a Enel X denunciado a situação à autoridade da concorrência italiana, alegando a existência de um abuso de posição dominante por parte da Google, por dificultar, injustificadamente, a interoperabilidade desta aplicação com a respetiva plataforma, prejudicando a capacidade da aplicação oferecer, aos condutores de veículos elétricos, funcionalidades como reserva de postos de carregamento, navegação integrada e pagamento.
Em 2021, a autoridade da concorrência italiana concluiu que a conduta da Google configurava um abuso de posição dominante, impondo uma coima de cerca de 102 milhões de euros a esta empresa. Ademais, ordenou à Google que desenvolvesse e publicasse um modelo técnico que permitisse a interoperabilidade de aplicações para carregamento de veículos elétricos.
A decisão foi confirmada pelo tribunal administrativo regional e, em seguida, foi objeto de recurso para o Conselho de Estado italiano, que remeteu ao TJUE um pedido de decisão prejudicial, para esclarecer o âmbito de aplicação do artigo 102.º do TFUE (norma que proíbe abusos de posição dominante) no presente caso.
Em fevereiro de 2025, o TJUE confirmou que, embora a plataforma Android Auto em causa não fosse “indispensável” para o funcionamento da aplicação da Enel X, o facto de esta permitir funcionalidades acrescidas e ser aberta a programadores terceiros indicava que a recusa de acesso poderia restringir a concorrência. A decisão salienta ainda que uma empresa detentora de posição dominante pode ser obrigada a desenvolver um modelo técnico para garantir a interoperabilidade, quando tal não comprometa a segurança ou integridade da plataforma e não seja tecnicamente impossível.
Em suma, o TJUE concluiu que a recusa de acesso injustificada a uma plataforma digital que já acolhe outras aplicações pode constituir uma infração ao direito da concorrência, por consubstanciar um abuso de posição dominante, mesmo que a plataforma não seja absolutamente imprescindível, se daí decorrer um prejuízo significativo para a concorrência.
O TRL MANTÉM O ARQUIVAMENTO DO PROCESSO DA ADC POR ALEGADA PARTILHA DE INFORMAÇÃO NO SETOR BANCÁRIO
Acórdão de 10 de fevereiro de 2025 (Processo 225/15.4YUSTR-W.L1) - TRL
O TRL rejeitou, em acórdão datado de 9 de abril de 2025, a arguição de nulidade apresentada pelo Ministério Público contra o acórdão anterior deste tribunal, de 10 de fevereiro de 2025, que havia declarado prescrito o procedimento contraordenacional por alegadas práticas anticoncorrenciais no setor bancário português (conforme consta nas Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português de março de 2025).
A investigação da AdC, que envolvia vários bancos a operar em Portugal, teve início em 2012 e culminou na aplicação, em 2019, de uma coima por alegada partilha de informação em violação das regras de concorrência, confirmada, pelo TCRS, em 2024, após decisão do TJUE no âmbito de um reenvio prejudicial, bem como da arguição da prescrição por várias instituições de crédito visadas. A sentença do TCRS foi objeto de recurso pelas visadas.
Nesta sequência, o TRL decidiu, em 10 de fevereiro de 2025, declarar prescrito o respetivo procedimento contraordenacional, determinando o arquivamento dos autos. Subsequentemente, o Ministério Público apresentou uma reclamação alegando a nulidade do acórdão do TRL, porque, alegadamente, padecia de vícios de falta de fundamentação e omissão de pronúncia quanto à essência e natureza do reenvio prejudicial e suas consequências nos prazos de prescrição. Alegou ainda o MP que o período em que o processo esteve pendente no TJUE deveria ter suspendido o prazo de prescrição.
Assim a questão jurídica central analisada pelo TRL foi determinar se o reenvio prejudicial para o TJUE constitui causa autónoma de suspensão do prazo de prescrição em processos contraordenacionais de concorrência.
O TRL rejeitou os argumentos do Ministério Público, concluindo que:
- O acórdão de 10 de fevereiro estava devidamente fundamentado, tendo analisado a questão da prescrição ao longo de 35 páginas;
- O regime aplicável à prescrição é o previsto no artigo 74.º da Lei da Concorrência na sua versão original (de 2012), consubstancia um regime específico e autónomo;
- O reenvio prejudicial não constitui causa autónoma de suspensão da prescrição do procedimento contraordenacional, por não estar legalmente previsto nas normas aplicáveis;
- Em matéria de prescrição do procedimento contraordenacional aplicam-se os princípios da legalidade e do Estado de Direito Democrático, que exigem que as causas de suspensão estejam expressamente previstas na lei.
Consequentemente, o TRL julgou improcedente a reclamação de nulidade do Ministério Público, mantendo a decisão anterior que declarou prescrito o procedimento contraordenacional, por decurso do prazo máximo de prescrição aplicável de 10 anos e 6 meses (prazo normal acrescido do período máximo de suspensão de 3 anos previsto na lei).
3. Financeiro
ALTERAÇÕES REGULATÓRIAS NO REGIME DA GESTÃO DE ATIVOS E DA DIGITALIZAÇÃO DOS REPORTES
Regulamento n.º 3/2025, de 17 de abril - CMVM
O Regulamento da CMVM n.º 3/2025 (“Regulamento”), de 17 de abril, procede à alteração de diversos regulamentos da CMVM (n.ºs 8/2018, 1/2020, 7/2020, 8/2020, 9/2020, 6/2023 e 7/2023) e revoga o Regulamento da CMVM n.º 1/2016, de 25 de maio. O Regulamento visa a adaptação dos regulamentos alterados ao novo Regime da Gestão de Ativos (“RGA”), em termos de terminologia e de reporte de informação de natureza prudencial, além de clarificar a informação a reportar pelas sociedades gestoras.
No plano prudencial, o Regulamento introduz novos deveres de reporte para sociedades gestoras, bem como obrigações específicas para prestadores de serviços de financiamento colaborativo, incluindo a elaboração de demonstrações financeiras segundo normas IAS/IFRS. Paralelamente, procede-se à clarificação do conceito de “investidor não profissional”, equiparando-o ao de “investidor não sofisticado”, em linha com o Direito da União Europeia.
O diploma inova ainda na área da transparência pré-contratual, ao exigir que os ficheiros em formato PDF com o Documento de Informação Fundamental (“DIF”) sejam pesquisáveis, permitindo a automatização da análise da informação pela CMVM. Relativamente ao reporte de preçários, passa a ser obrigatório apenas no caso de organismos de investimento coletivo abertos destinados a investidores não profissionais.
Por fim, concretizam-se as condições de admissibilidade e de reporte aplicáveis ao investimento, por parte de sociedades gestoras, dos montantes que excedam os fundos próprios legalmente exigíveis, nos termos do Decreto-Lei n.º 89/2024. Assim, a sociedade gestora pode investir os montantes que excedam os fundos próprios exigíveis em:
- Ativos que (i) sejam investidos em ativos líquidos ou prontamente convertíveis em numerário no curto prazo e (ii) que não incluam posições especulativas;
- Participações em sociedades do setor financeiro estabelecidas na União Europeia ou num país terceiro, desde que, neste caso, as referidas sociedades se encontrem sujeitas a normas prudenciais equivalentes às que constam da legislação da União Europeia, sendo que este investimento está sujeito a comunicação prévia à CMVM com uma antecedência de 30 dias em relação à data do investimento, acompanhada da seguinte informação:
- Justificação para a aquisição pretendida;
- Denominação e país da sede da sociedade na qual se pretende deter a participação;
- Tipo de sociedade, por referência ao ordenamento jurídico do país em causa, e descrição das suas atividades;
- Montante, em euros, da aquisição da participação e formas de financiamento da operação;
- Percentagem do capital social e dos direitos de voto que a participação a adquirir representa;
- Contas anuais, auditadas se existentes, dos três últimos exercícios financeiros da sociedade na qual se pretende deter a participação ou, no caso de sociedade a constituir, as contas previsionais (balanço e demonstração dos resultados) para os três exercícios seguintes, incluindo os respetivos pressupostos;
- Impacto da aquisição da participação no cumprimento dos requisitos prudenciais aplicáveis à sociedade gestora; e
- Confirmação da aplicação de requisitos equivalentes aos aplicáveis à sociedade gestora em matéria de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo à sociedade na qual se pretende deter a participação.
- Valores mobiliários emitidos por organismos de investimento coletivo sob gestão ou ativos que componham a carteira destes, com o objetivo de alinhamento de interesses e de participação no risco de investimento;
- Ativos necessários à prossecução da sua atividade.
Este investimento não pode representar riscos para o cumprimento dos requisitos prudenciais, nem colocar em causa a gestão sã e prudente da sociedade gestora, incluindo originar perdas de valor superior ao capital investido.
O Regulamento entrou em vigor no dia 18 de abril de 2025.
4. Fiscal
INFORMAÇÃO EMPRESARIAL SIMPLIFICADA - DECLARAÇÃO ANUAL DE INFORMAÇÃO CONTABILÍSTICA E FISCAL (IES/DA)
Portaria n.º 191/2025/1, de 16 de abril (DR, Série I, de 16 de abril de 2025)
A portaria em apreço aprova a folha de rosto da Informação Empresarial Simplificada/Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal (IES/DA), com vista a dar cumprimento à alteração ao regime do justo impedimento invocável por contabilistas certificados, nos termos dos artigos 12.º-A e 12.º-B do Estatuto da Ordem dos Contabilistas Certificados, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 452/99, de 5 de novembro, alterado pela Lei n.º 24-D/2022, de 30 de dezembro, e pela Lei n.º 68/2023, de 7 de dezembro.
A referida portaria elimina ainda os anexos O - Mapa recapitulativo de clientes (imposto sobre o valor acrescentado) e Q - Elementos contabilísticos e fiscais (imposto do selo), cuja apresentação deixa de ser exigível, reduzindo os custos de contexto inerentes ao preenchimento e submissão da IES/DA.
Esta portaria entrou em vigor a 17 de abril de 2025 e produzirá efeitos relativamente às declarações a apresentar a partir de 2027 para o período de 2026 e seguintes.
EMPREITADAS DE REABILITAÇÃO URBANA E TAXA REDUZIDA DE IVA – EXIGÊNCIA DE APROVAÇÃO DE OPERAÇÃO DE REABILITAÇÃO URBANA - UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA
Acórdão de uniformização de jurisprudência n.º 012/24.9BALSB de 26 de março de 2025 - STA
Na sequência de recurso apresentado com fundamento em oposição de julgados entre as decisões proferidas nos processos 517/2023-T e 2/2023-T, respetivamente decisões recorrida e fundamento, o STA proferiu acórdão de uniformização de jurisprudência no sentido da aplicação da taxa reduzida de IVA prevista na verba 2.23 da Lista I anexa ao Código do IVA (“CIVA”), ficar condicionada à existência prévia de uma Operação de Reabilitação Urbana (“ORU”).
O acórdão de uniformização de jurisprudência aderiu à posição defendida pela decisão recorrida, afastando o entendimento da decisão fundamento, no sentido da aplicabilidade da taxa reduzida de IVA às empreitadas de reabilitação urbana de imóveis localizados em área de reabilitação urbana, independentemente de aprovação municipal de uma ORU.
O STA decidiu, assim, uniformizar jurisprudência nos seguintes termos: «I - Só beneficiam da taxa de 6% de IVA prevista, conjugadamente, nos artigos 18.º, al. a) e na Verba 2.23 da Lista I anexa ao CIVA, as “empreitadas de reabilitação urbana”. II - A qualificação como “empreitada de reabilitação urbana” pressupõe a existência de uma empreitada e a sua realização em Área de Reabilitação Urbana para a qual esteja previamente aprovada uma Operação de Reabilitação Urbana.».
TC – COEFICIENTES DE DESVALORIZAÇÃO DA MOEDA - TRATAMENTO DIFERENCIADO DE MAIS-VALIAS MOBILIÁRIAS E IMOBILIÁRIAS PARA EFEITOS DE IRS – ILEGALIDADE E INCONSTITUCIONALIDADE DO REGIME
Acórdão n.º 311/2025 (Processo n.º 52/2024, de 29.04.2024, 1º Secção) - TC
No acórdão em referência, o TC julga inconstitucional o disposto no artigo 50.º do Código do IRS (“CIRS”), na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (entretanto já alterado), na parte em que “não prevê a aplicação dos coeficientes de correção monetária ao valor de aquisição de partes sociais abrangidas pela alínea b) do n.º 1 do artigo 10.º do Código do IRS detidas há mais de 24 meses, por violação do princípio da igualdade, na vertente da capacidade contributiva, resultante do disposto nos artigos 13.º, 103.º e 104-º da Constituição da República Portuguesa”.
O acórdão do TC em referência foi proferido na sequência de recurso apresentado contra uma sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que decidiu anular parcialmente uma liquidação de IRS em que não foram aplicados os coeficientes de correção monetária ao valor de aquisição de partes sociais detidas há mais de 24 meses. Aquele tribunal considerou que essa omissão violava o princípio da igualdade, especificamente na vertente da capacidade contributiva, ao tratar de forma diferente as mais-valias mobiliárias e imobiliárias sem uma justificação racional para o efeito. Perante esta decisão e estando em causa a desaplicação de uma norma com fundamento na sua inconstitucionalidade, veio o Ministério Público interpor recurso, sustentando a não inconstitucionalidade da norma do artigo 50.º do CIRS.
O TC considerou que o regime legal que vigorava, entretanto alterado pela Lei n.º 82-E/2014, permitia que enquanto as mais-valias imobiliárias fossem corrigidas para refletir a desvalorização monetária, as mobiliárias ficassem excluídas dessa correção, conduzindo a uma tributação de ganhos meramente nominais, não refletindo a verdadeira capacidade contributiva dos sujeitos passivos.
Deste modo, o TC aderiu ao entendimento postulado pela sentença recorrida e decidiu que a referida norma violava o princípio da igualdade, na sua vertente da capacidade contributiva, conforme disposto nos artigos 13.º, 103.º e 104.º da CRP.
Importa salientar que o legislador passou, através da Lei n.º 82-E/2014, de 31 de dezembro, a equiparar as mais-valias mobiliárias e imobiliárias para efeitos de aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda, não se colocando a questão da inconstitucionalidade na redação da lei vigente desde então.
AT – ALTERAÇÕES RELEVANTES EM MATÉRIA DE IVA
Ofício Circulado n.º 25066 de 15 de abril de 2025
O Ofício Circulado em referência visa dar a conhecer as alterações mais significativas resultantes da aprovação das medidas de simplificação introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 49/2025, de 27 de março (“DL 49/2025”), que alterou o CIVA e o Decreto-Lei n.º 28/2019, de 15 de fevereiro.
O Decreto-Lei mencionado, que deverá entrar em vigor no dia 1 de julho de 2025, introduziu um conjunto de medidas destinadas a simplificar o sistema fiscal em Portugal, com o objetivo de promover a competitividade da economia e melhorar a qualidade dos serviços prestados pela AT.
Em concreto, as medidas visam reduzir os custos de contexto, aumentar a transparência e compreensão das obrigações tributárias pelos sujeitos passivos, melhorar a eficiência dos serviços fiscais, aumentar as exportações e simplificar as formalidades aduaneiras e fiscais das remessas postais e das remessas de bens de valor inferior a €1.000.
EBF – ISENÇÃO DE IMT E DE IMPOSTO DO SELO – CONCEITO DE RAMO DE ATIVIDADE – CISÃO
Ficha doutrinária relativa ao processo 27252, com despacho de 2025-04-07, do Subdiretor-Geral da Área Gestão Tributária-Património, por delegação
A ficha doutrinária em referência foi proferida no contexto de um pedido de informação vinculativa apresentado por um sujeito passivo com o intuito de esclarecer se seria aplicável a isenção de IMT e de Imposto do Selo à operação de cisão simples de uma sociedade imobiliária onde fossem destacados da sociedade cindida bens imóveis.
Em particular, o sujeito passivo requerente da informação vinculativa proferida pela AT desenvolvia duas áreas de negócio distintas, uma relacionada com a produção, comercialização e manutenção de máquinas e equipamentos industriais e outra relacionada com o setor imobiliário, e desenvolvida no contexto de apoio às restantes sociedades do grupo, com a gestão através de serviços de back office e com a atividade de gestão ativa de imóveis, através da cedência de espaços equipados para escritórios e outras atividades empresariais, incluindo instalações industriais e de serviços.
O sujeito passivo esclarece ainda que desenvolvia as duas atividades em causa em instalações distintas.
Naquele contexto, o sujeito passivo pretendia segregar a atividade industrial desenvolvida e a atividade imobiliária, a qual pretendia destacar para uma nova sociedade, transmitido para aquela três imóveis, juntamente com sistemas de videovigilância, ar condicionado e mobiliário diverso. O destacamento deveria ainda incluir um trabalhador, através da celebração de contrato de trabalho com pluralidade de empregadores (o sujeito passivo e a nova sociedade).
O sujeito passivo apresentou pedido de informação vinculativa, solicitando que se esclarecesse se a transferência dos imóveis e elementos conexos para uma nova sociedade consubstanciaria um "ramo de atividade" para efeitos da subalínea i) da alínea c) do n.º 3, conjugado com a alínea b) do n.º 4, ambos do artigo 60.º do EBF e se a operação de cisão projetada se realiza por razões económicas válidas, nos termos do artigo 60.º, n.º 6 do EBF, permitindo a aplicação da isenção prevista naquele artigo em sede de IMT e de Imposto do Selo.
A AT entendeu que a subalínea i) da al. c) do n.º 3 do artigo 60.º do EBF tem um conceito próprio de cisão, indissociável do conceito de "ramo de atividade" não preenchido com a mera transferência singular de bens ou de elementos patrimoniais isolados, como os imóveis, os quais não correspondiam a um conjunto organizado qualificável como uma unidade económica para efeitos do artigo 60.º do EBF.
Finalmente, quanto à segunda questão, esclareceu a AT que não é possível concluir pela existência de razões económicas válidas subjacentes à operação de reestruturação a priori, uma vez que é necessário obter um entendimento geral de todo o processo de restruturação.
5. Imobiliário e Urbanismo
ALTERAÇÕES AO REGIME JURÍDICO DOS INSTRUMENTOS DE GESTÃO TERRITORIAL
Lei n.º 53-A/2025, de 9 de abril (DR n.º 70/2025, Série I, de 9 de abril de 2025)
A Lei em referência, que entrou em vigor no dia 14 de abril de 2025 (a “Lei n.º 53-A/2025”) procede à alteração do Decreto-Lei n.º 117/2024, de 30 de dezembro (o “Decreto-Lei n.º 117/2024”), que introduziu alterações relevantes no Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (“RJIGT”), visando criar as condições necessárias para um desenvolvimento habitacional mais justo e acessível.
As principais alterações introduzidas pela Lei n.º 53-A/2025 no RJIGT visam limitar os casos em que é admissível a reclassificação do solo rústico para solo urbano, adicionando condicionantes às situações de reclassificação já previamente impostas pelo Decreto-Lei n.º 117/2024.
Destacamos as principais alterações introduzidas:
- Reintrodução da necessidade de fazer acompanhar o procedimento de reclassificação de solo rústico para solo urbano dos seguintes elementos e fundamentos:
- Demonstração do impacto da carga urbanística proposta no sistema de infraestruturas existente, e previsão dos encargos necessários ao seu reforço, à execução de novas infraestruturas e à respetiva manutenção;
- Demonstração da viabilidade económico-financeira da proposta, incluindo a identificação dos sujeitos responsáveis pelo financiamento, a demonstração das fontes de financiamento contratualizadas e as de investimento público.
- Redução do prazo para concretização de obras de urbanização na sequência de uma reclassificação de solo rústico para solo urbano, para 4 anos a contar da data de publicação da deliberação do respetivo órgão deliberativo na 2.ª Série do Diário da República.
- Este prazo pode ser prorrogado, uma só vez, pelo período de 1 ano, por razões excecionais, se o pedido de prorrogação for devidamente fundamentado, e desde que as operações urbanísticas já tenham sido iniciadas.
- Alteração do regime especial de reclassificação de solo rústico para solo urbano com finalidade habitacional:
- Eliminação da menção da finalidade conexa à finalidade habitacional, mantendo-se apenas a possibilidade de reclassificação para fins habitacionais e para usos complementares destes, definindo o diploma aquilo que se deve entender por “usos complementares” (i.e. todas as finalidades em relação de dependência ou de complementaridade com a finalidade de habitação, não podendo ser com ela conflituante);
- Sujeição da reclassificação de solos de propriedade privada a parecer não vinculativo da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional competente (“CCDR, I.P.”), o qual deve ser proferido no prazo de 20 dias a contar da data de envio da proposta, sob pena de deferimento tácito;
- Reintrodução da necessidade de assegurar a contiguidade com o solo urbano, enquanto forma de consolidar e tornar coerente a urbanização a desenvolver com a área urbana existente;
- Exigência de 700/1000 da área total de construção acima do solo se destinar a habitação pública, a arrendamento acessível, ou a habitação a custos controlados;
- Introdução de novas áreas de Reserva Ecológica Nacional (REN), nas quais a reclassificação não pode ocorrer.
- Revisão do regime aplicável à alteração simplificada de planos territoriais:
- Passou a abranger os casos de habitação pública, de arrendamento acessível e de habitação a custos controlados, por força da eliminação do conceito de habitação de valor moderado;
- Passou a estar prevista a necessidade de parecer não vinculativo da CCDR, I.P. relativamente a alterações que ocorram em solo de propriedade privada.
- Alteração do regime de suspensão de regras em áreas urbanizáveis ou de urbanização programada, em virtude do incumprimento da obrigação de incorporação das regras de classificação e qualificação do solo nos planos até 31 de dezembro de 2024, no sentido de clarificar que:
- A suspensão destas normas não é automática, sendo decretada pela CCDR, I.P. após audição do município;
- Esta suspensão não se aplica às áreas urbanizáveis ou de urbanização programada:
- Quando tenham adquirido entretanto as características de solo urbano;
- Cujas obras de urbanização previstas em plano de pormenor, por contrato de urbanização ou por ato administrativo de controlo prévio se encontrem em execução e até ao termo do respetivo prazo;
- Cujos parâmetros urbanísticos já tenham sido definidos pelo órgão autárquico competente através da aprovação de pedido de informação prévia ou projeto de arquitetura;
- Caso o município demonstre, fundamentadamente, que a conclusão do processo de revisão dos planos territoriais se encontra em fase de conclusão ou que o atraso ocorreu por motivos que não lhe são imputáveis.
- A suspensão em causa não impede a realização de operações urbanísticas em áreas urbanizáveis ou de urbanização programadas cuja finalidade se enquadre no disposto nos artigos 72.º-A e 72.º-B do RJIGT.
As alterações introduzidas retroagem a 31 de dezembro de 2024, e vigoram até 31 de dezembro de 2028. Porém, este prazo não se aplica aos procedimentos iniciados durante a vigência do Decreto-Lei n.º 117/2024, continuando, quanto àqueles, a vigorar o regime aí estabelecido.
6. Laboral
PLATAFORMA DIGITAL – INEXISTÊNCIA DE CONTRATO DE TRABALHO COM O ESTAFETA
Acórdão de 7 de abril de 2025 (Processo n.º 9755/23.3T8VNG.P1) - TRP
O Acórdão sob análise foi proferido no âmbito do recurso de uma ação especial de reconhecimento de contrato de trabalho (“ARECT”) intentada pelo Ministério Público (“MP”) contra uma plataforma digital (“Requerida”), na sequência de uma investigação levada a cabo pela ACT, que culminou na notificação da Requerida para regularização da situação laboral de mais de 200 estafetas. Na ARECT, o MP pediu que fosse reconhecida a existência de um contrato de trabalho entre um estafeta (prestador de serviços) e a Requerida, por entender que o primeiro atuava por conta e sob o poder de direção da segunda.
O Tribunal de primeira instância declarou a ação como improcedente e, inconformado, o MP interpôs recurso para o TRP, que acompanhou a decisão da primeira instância.
Nos termos do Acórdão, muitas das circunstâncias em que a atividade do estafeta é desenvolvida, designadamente, o facto de poder ajustar a taxa de entrega mínima por quilómetro; escolher quando presta a sua atividade sem apresentar qualquer justificação; fazer-se substituir; aceitar, ignorar ou rejeitar propostas de entrega; bloquear estabelecimentos e clientes na aplicação da Requerida; prestar atividade para outras plataformas digitais, mesmo em simultâneo; entre outros, de forma livre e sem que tal lhe acarrete quaisquer consequências desvantajosas, são absolutamente inconciliáveis com um contrato de trabalho.
Em resultado, a ARECT foi declarada improcedente e não foi reconhecido qualquer vínculo jurídico-laboral entre o estafeta e a Requerida.
AJUDAS DE CUSTO – RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA POR CRÉDITOS LABORAIS – PLURALIDADE DE EMPREGADORES NÃO ESCRITA
Acórdão de 30 de abril de 2025 (Processo n.º 16577/23.0T8SNT.L1-4) - TRL
O Acórdão em apreço teve lugar no decurso de uma ação interposta por uma trabalhadora (“Autora”) contra a sua entidade empregadora (“Ré Empregadora”) e seis outras empresas pertencentes ao grupo económico desta última (as “Rés”), na qual a Autora peticionava o reconhecimento de justa causa de resolução do seu contrato de trabalho. Neste contexto, pedia também que as Rés fossem condenadas solidariamente com a Ré Empregadora no pagamento da indemnização e dos créditos laborais que lhe eram devidos em consequência dessa resolução.
A primeira questão que se levantou foi a de saber se o montante pago à Autora sob a designação de “ajudas de custo” estaria integrado na sua retribuição base para efeitos de cálculo do montante da indemnização a que teria direito. A esta questão o TRL respondeu afirmativamente, dado não ter ficado provado o fundamento subjacente ao pagamento dessas ajudas de custo, o seu valor ser invariável e serem pagas durante 14 meses por ano (i.e., incluindo o mês de férias, e os subsídios de férias e de Natal).
Inversamente, o subsídio por isenção de horário de trabalho pago à Autora não devia ser incluído na sua retribuição base, uma vez que este subsídio pode ser reduzido ou eliminado se as circunstâncias que o justificam também o forem (o que não sucede com a retribuição base, que é irredutível).
Quanto à eventual responsabilidade solidária das restantes seis Rés pelos créditos vencidos há mais de três meses, nos termos do artigo 334.º do Código do Trabalho, o Acórdão determinou que:
- em relação a duas das Rés existia responsabilidade solidária por, entre elas e a Ré Empregadora, se verificar uma relação jurídico-societária de grupo (i.e., uma relação de grupo nos termos do artigo 481.º do Código das Sociedades Comerciais);
- as demais quatro Rés mantinham com a Ré Empregadora estruturas organizativas comuns – por partilharem instalações, serviços de orçamentação, recursos humanos, compras, contabilidade e informática –, desempenhando a Autora a sua atividade indistintamente para todas elas; no entanto, a Autora apenas se encontrava sujeita às ordens, fiscalização e poder disciplinar de uma das quatro referidas Rés e, por isso, só essa responderia solidariamente com a Ré Empregadora, por também se presumir empregadora da Autora, ao abrigo de uma pluralidade de empregadores não escrita.
Assim, a propósito da responsabilidade solidária das demais seis Rés com a Ré empregadora, o TRL decidiu que (i) duas das Rés responderiam solidariamente por manterem uma relação jurídico-societária de grupo com a Ré Empregadora, (ii) uma terceira Ré também por se presumir empregadora da Autora, ao abrigo de uma pluralidade de empregadores informalmente constituída; e (iii) as três restantes Rés não responderiam por, em relação a elas, não se verificar nenhuma relação do foro societário relevante para efeitos de aplicação do artigo 334.º do Código do Trabalho, nem existir uma situação de pluralidade de empregadores.
TRABALHADORES ITINERANTES – LEI APLICÁVEL AO CONTRATO – REINTEGRAÇÃO
Acórdão de 30 de abril de 2025 (Processo n.º 7576/23.2T8LSB.L1-4) - TRL
O presente Acórdão foi proferido no âmbito de uma ação intentada por um trabalhador português (“Autor”) contra a sua entidade empregadora, com sede em Portugal (“Ré”), com a qual havia celebrado um contrato de trabalho a termo para exercer as funções de oficial piloto e de operador de posicionamento dinâmico, a bordo de um navio com bandeira norueguesa, propriedade da Ré.
O Autor pedia, essencialmente, que fosse reconhecida a existência de um contrato de trabalho por tempo indeterminado com a Ré, que a caducidade do contrato comunicada por esta última fosse considerada um despedimento ilícito e, em consequência, que fosse ordenada a sua reintegração na Ré.
Ao abrigo das disposições do artigo 8.º, n.º 1, do Regulamento (CE) n.º 593/2008, de 17 de junho de 2008 (Regulamento Roma I), o TRL considerou que seria aplicável ao contrato de trabalho a lei norueguesa – dado ter sido essa a lei escolhida pelas partes para o efeito –, mas que tal não poderia privar o Autor da proteção que lhe é dispensada pelas disposições imperativas da lei portuguesa, enquanto lei do país onde se situa o estabelecimento que o contratou e que seria aplicável ao contrato na falta de escolha pelas partes, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
Assim, o TRL entendeu que, apesar de a lei norueguesa permitir a contratação a termo por um período determinado, para uma viagem específica ou para um trabalho temporário quando a natureza do trabalho o justifique, quer aquela lei, quer a lei portuguesa impõem que o termo seja fundamentado como pressuposto da sua validade, o que não havia sucedido no caso concreto.
Em consequência, o termo aposto ao contrato seria nulo e o contrato deveria ser qualificado como um contrato por tempo indeterminado (i.e., sem termo). Nessa medida, a comunicação da sua caducidade pela Ré corresponderia a um despedimento ilícito do ponto de vista das leis norueguesa e portuguesa.
Porém, a aplicação da lei norueguesa ao despedimento do Autor privá-lo-ia da aplicação das disposições inderrogáveis da lei portuguesa respeitantes a esta matéria, designadamente da regra associada à reintegração do Autor na organização da Ré ou à sua alternativa (indemnização de antiguidade), cuja escolha cabe ao trabalhador.
Por este motivo, o TRL decidiu que, não obstante a lei aplicável ao contrato de trabalho ser a lei norueguesa, quanto às consequências da ilicitude do despedimento do Autor seriam aplicáveis as normas imperativas da lei portuguesa e que o Autor teria direito à sua reintegração na organização da Ré.
7. Público
PLANO NACIONAL FERROVIÁRIO – INVESTIMENTOS FERROVIÁRIOS PRIORITÁRIOS
Resolução do Conselho de Ministros n.º 77/2025, de 16 de abril (DR Série I, de 16 de abril de 2025)
A Resolução do Conselho de Ministros n.º 77/2025, que aprova o Plano Nacional Ferroviário (“PNF”), estabelece os principais investimentos e ligações de interesse nacional e internacional para a rede ferroviária portuguesa nas próximas décadas.
Embora o PNF não seja um documento de execução, contém informações relevantes sobre as prioridades dos caminhos de ferro portugueses no decurso dos próximos anos. Em especial, destaca-se o desenvolvimento das seguintes ligações prioritárias, previstas pelo PNF:
- Linha de Alta Velocidade Porto – Lisboa
Já estabelecida no Programa Nacional de Investimentos 2030, a Linha de Alta Velocidade Porto-Lisboa (“LAV”) é apresentado como a grande prioridade do PNF e a base para a futura expansão da rede ferroviária portuguesa; - Ligação entre o Minho e a Galiza
O prolongamento natural do eixo Lisboa – Porto para Norte, ligando ao já existente Eixo Atlântico de Alta Velocidade espanhol, que liga Vigo à Corunha, será feito através da LAV Porto – Vigo, ficando assim completo o eixo de Alta Velocidade entre Lisboa e Corunha. - Ligação entre o Minho e Vilar Formoso
A construção de uma nova ligação ferroviária entre o litoral e o interior Centro, no eixo Aveiro – Viseu – Vilar Formoso, melhorará significativamente a mobilidade entre a Beira Interior e todo o litoral do país. Além disso, esta ligação resolve uma das lacunas mais importantes do sistema de transportes nacional, a ausência de acessibilidade ferroviária à cidade de Viseu. - Nova travessia do Tejo / LAV Évora – Elvas
Apesar de previamente anunciada, o PNF prevê a construção da Terceira Travessia do Tejo (“TTT”). Em particular, esta nova travessia (rodoviária e ferroviária) sobre o Tejo, entre Lisboa (Chelas) e o Barreiro, aumentará o tráfego de passageiros e mercadorias entre as margens do Tejo. Está também previsto que a TTT seja um dos eixos fundamentais da futura LAV Lisboa – Madrid que, através do PNF, apresenta um novo troço de alta velocidade entre Évora e Elvas. As infraestruturas previstas permitiriam unir Lisboa a Badajoz em 1h20 horas, com o objetivo final de ligação de Lisboa a Madrid em menos de 4 horas.
CONTRATOS ADMINISTRATIVOS – SUBCONTRATAÇÃO – FIM DOS LIMITES PERCENTUAIS DO PREÇO CONTRATUAL
Decreto-Lei n.º 66/2025, de 10 de abril (DR Série I, de 10 de abril de 2025)
O Decreto-Lei n.º 66/2025, de 10 de abril (“Decreto-Lei n.º 66/2025”), vem alterar o n.º 4 do artigo 318.º do Código dos Contratos Públicos (“CCP”).
O n.º 4 do artigo 318.º do CCP regula a execução de determinadas prestações contratuais, num contrato administrativo, entre o co-contratante e o subcontratado.
A regra, tanto na versão anterior como na atual, procura tutelar o interesse da entidade adjudicante em obrigar que determinadas prestações contratuais sejam executadas diretamente pelo co-contratante.
O anterior n.º 4 do artigo 318.º do CCP estipulava o seguinte: “o contrato pode proibir a subcontratação de determinadas prestações contratuais ou de prestações cujo valor acumulado exceda uma percentagem do preço contratual”.
Tal regra tinha resultado da transposição por parte do legislador nacional do texto da Diretiva 2014/24/EU (a “Diretiva”), nomeadamente do n.º 2 do artigo 63.º, que previa que “[n]o caso dos contratos de empreitadas de obras, dos contratos de serviços ou de operações de montagem ou instalação no quadro de um contrato de fornecimento, as autoridades adjudicantes possam exigir que determinadas tarefas críticas sejam executadas pelo próprio proponente (…)”.
Ora, o Tribunal de Justiça da União Europeia já havia reiterado que as legislações nacionais não podem definir um limite à subcontratação através de uma percentagem máxima do preço contratual.
Esta discrepância, resultante da anterior redação do n.º 4 do artigo 318.º do CCP com a legislação europeia, deu origem a um procedimento de infração da Comissão Europeia contra Portugal.
Nesse sentido, e de forma a pôr termo ao referido procedimento de infração, a nova redação do n.º 4 do artigo 318.º do CCP prevê agora que: “o contrato pode exigir que determinadas prestações contratuais críticas, tendo em conta o objeto do contrato a celebrar, sejam executadas diretamente pelo cocontratante”.
Desta forma, a nova redação do n.º 4 do artigo 318.º do CCP vem pôr termo ao diferendo entre a legislação nacional anterior e a legislação europeia relativamente à execução de determinadas prestações contratuais, num contrato administrativo, entre o co-contratante e o subcontratado.
O Decreto-Lei n.º 66/2025 entrou em vigor no dia 15 de abril de 2025.
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