Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português

30 de outubro 2025


1. Contencioso Civil e Penal

  • Legitimidade do Administrador de Insolvência para Requerer Inventário
  • Depoimento de Ex-Arguidos e Leitura de Declarações Anteriores
  • Igualdade de Armas no Recurso Penal – Direito de Requerer Audiência

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2. Concorrência

  • CE Aplica Coima de 2,95 Mil Milhões de Euros à Google Por Alegadas Práticas Abusivas na Tecnologia Publicitária na Internet
  • CE Aplica Pela Primeira Vez Coimas Por Resposta Incompleta a Pedido de Informações
  • TJUE Clarifica as Regras Relativas à Contagem do Prazo de Prescrição das Ações de Private Enforcement

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3. Direito Digital

  • Decisão de Execução da Comissão – Adequação do nível de proteção dos Dados Pessoais assegurado pelos Estados Unidos
  • Obrigação de informação do titular dos dados – Transmissão de Dados Pseudonimizados
  • Ação inibitória destinada a ordenar ao responsável pelo tratamento que se abstenha de repetir o tratamento ilícito

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4. Financeiro

  • Quadro Regulatório da União Europeia Para a Gestão de Criptoativos: Normas Técnicas de Regulamentação de Criptofichas
  • Créditos bancários não produtivos
  • Regime da cessão e gestão de créditos bancários

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5. Fiscal

  • Alteração à Lista de Países, Territórios e Regiões com Regimes de Tributação Mais Favoráveis
  • IRC – Aprovação da Declaração Modelo 62 – Declaração de Registo – Regime do Imposto Mínimo Global
  • TC – CESE – Não inconstitucionalidade de Norma de Regime de Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético Aplicável a Centros Electroprodutores com Recurso a Fonte Renovável
  • STA – IMT – Tributação em IMT de Permuta de Bem Presente por Bens Futuros sem Projeto de Construção Aprovado
  • IRS – Novas Tabelas de Retenção na Fonte de IRS para a Região Autónoma da Madeira

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6. Imobiliário

  • Obrigação de Integração de Obras de Arte Para Fruição Pública, em Obras Públicas

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7. Laboral

  • Pacto de Não Concorrência Pós-Contratual – Efeitos da Resolução – Responsabilidade Civil
  • Requalificação de Contrato de Agência Como Contrato de Trabalho − Nulidade de Cláusula de Não Concorrência Pós-Contratual

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8. Público

  • Reprivatização da TAP – Aprovação dos Cadernos de Encargos

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1. Contencioso Civil e Penal

LEGITIMIDADE DO ADMINISTRADOR DE INSOLVÊNCIA PARA REQUERER INVENTÁRIO

Acórdão n.º 310/2025 (Diário da República n.º 188/2025, Série II, de 30 de setembro de 2025) – TC

O acórdão do Tribunal Constitucional (“TC”) em apreço julgou inconstitucional, por restrição desproporcional da garantia constitucional do acesso ao direito e tutela judicial efetiva e da propriedade privada (respetivamente, artigos 20.º e 62.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”)), a interpretação normativa extraída da articulação dos n.ºs 1 e 4 do artigo 81.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (“CIRE”) com a alínea a) do n.º 1 do artigo 1085.º do Código de Processo Civil (“CPC”), de acordo com a qual o administrador de insolvência não pode requerer abertura do processo de inventário para efeitos de cessação da comunhão hereditária e partilha de bens, não sendo considerando, nessa qualidade, como interessado direto para efeitos do disposto pela alínea a) do n.º 1 do artigo 1085.º do CPC.

Esta decisão foi proferida na sequência da interposição de um recurso de constitucionalidade contra o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (“STJ”) de 21 de março de 2023. O acórdão recorrido decidiu que nem a massa insolvente nem o administrador de insolvência têm legitimidade ativa para tal pedido, por este atuar como substituto processual e não como representante.

O TC considerou que a restrição imposta ao herdeiro insolvente é conforme à Constituição e proporcional, visando a proteção da massa insolvente e dos credores, podendo o insolvente receber eventual remanescente, concluindo pela não inconstitucionalidade da proibição de o insolvente requerer e quinhoar. Assim, concluiu pela não inconstitucionalidade da proibição de o herdeiro insolvente requerer o inventário ou participar ativamente na partilha do quinhão hereditário.

Quanto ao administrador de insolvência, o TC entendeu que vedar-lhe o pedido de inventário não é adequado aos fins do processo de insolvência, julgando inconstitucional essa interpretação por violação desproporcional do direito de propriedade e do direito de acesso ao direito e aos tribunais.

Assim, o TC deu provimento ao recurso, julgando inconstitucional a interpretação normativa extraída da articulação dos n.ºs 1 e 4 do artigo 81.º do CIRE com a alínea a) do n.º 1 do artigo 1085.º do CPC, de acordo com a qual o administrador de insolvência não pode requerer abertura do processo de inventário para efeitos de cessação da comunhão hereditária e partilha de bens.

 

DEPOIMENTO DE EX-ARGUIDOS E LEITURA DE DECLARAÇÕES ANTERIORES

Acórdão n.º 589/2025 (Diário da República n.º 188/2025, Série II, de 30 de setembro de 2025) – TC

O TC foi chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade de duas normas do Código de Processo Penal (“CPP”): (i) o artigo 133.º, n.º 2 do CPP, interpretado no sentido de não exigir consentimento para o depoimento, como testemunha, de pessoas que haviam inicialmente assumido a qualidade de arguidos pelo mesmo crime ou conexo, ainda que tenha sido proferido despacho de arquivamento e/ou extraída certidão para procedimento criminal autónomo; e (ii) o art. 356.º, n.º 3, alíneas a) e b), interpretado no sentido de permitir a reprodução em audiência de declarações prestadas pelo mesmo indivíduo na qualidade de arguido, em fases anteriores do processo, e o seu confronto com o depoimento prestado em audiência, na qualidade de testemunha, no caso de separação de processos, mesmo tendo já aquele perdido a referida qualidade de arguido.

Relativamente à primeira questão, o TC concluiu que o artigo 133, n.º 2, do CPP não é inconstitucional quando se interpreta que o depoimento de quem já foi arguido pode ser prestado como testemunha sem consentimento expresso, pois a proteção do nemo tenetur já não se justifica, reafirmando que o artigo 133.º, n.º 2. protege o depoente contra autoincriminação e não confere um direito ao arguido do processo principal para exigir consentimento, concluindo pela não inconstitucionalidade.

Quanto à segunda questão, o TC entendeu que o artigo 356.º, n.º 3, permite a leitura ou reprodução de declarações anteriores perante autoridade judiciária para avivar a memória ou confrontar contradições, constituindo um instrumento auxiliar com contraditório preservado, inserindo-se na liberdade de conformação legislativa e compatível com o processo equitativo, concluindo pela não inconstitucionalidade.

Deste modo, o TC negou provimento ao recurso, mantendo a constitucionalidade das duas interpretações normativas em causa.

 

IGUALDADE DE ARMAS NO RECURSO PENAL – DIREITO DE REQUERER AUDIÊNCIA

Acórdão n.º 644/2025 (Diário da República n.º 187/2025, Série II, de 29 de setembro de 2025) – TC

O acórdão do TC em apreço julgou inconstitucional, por violação do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, a norma do n.º 5 do artigo 411.º do Código de Processo Penal segundo a qual apenas o recorrente pode requerer a realização da audiência, não sendo tal faculdade atribuída aos sujeitos afetados pela interposição do recurso, ainda que estes sejam arguidos; e, em consequência,

O TC foi chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade do artigo 411.º, n.º 5, do CPP, interpretado no sentido de que só o recorrente pode requerer audiência no tribunal de recurso, não podendo o recorrido, ainda que arguido absolvido, fazê-lo, sendo que, após 2007, a regra passou a ser a decisão em conferência, dependendo a audiência de requerimento do recorrente no ato de interposição.

O TC recordou que o princípio da igualdade de armas em processo penal não exige simetria absoluta entre acusação e defesa, mas veda desigualdades arbitrárias que prejudiquem a defesa.

Confrontado com a questão, o TC concluiu que a restrição exclusiva ao recorrente carece de fundamento racional e cria desigualdade em prejuízo do arguido recorrido, especialmente em recursos de absolvições, violando o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da CRP.

Deste modo, o TC julgou inconstitucional a interpretação que reserva ao recorrente o requerimento de audiência, dando provimento ao recurso e determinando a reforma da decisão recorrida em conformidade, reconhecendo que o recorrido, incluindo o arguido, deve poder requerer audiência no tribunal de recurso.

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2. Concorrência

CE APLICA COIMA DE 2,95 MIL MILHÕES DE EUROS À GOOGLE POR ALEGADAS PRÁTICAS ABUSIVAS NA TECNOLOGIA PUBLICITÁRIA NA INTERNET

Comunicado de Imprensa de 5 de setembro de 2025 - Processo AT.40670 - CE

A CE aplicou à Alphabet Inc. e à Google LLC (em conjunto, a “Google”) uma coima de 2,95 mil milhões de euros por um alegado abuso de posição dominante no setor de tecnologia de publicidade digital (adtech), ao alegadamente favorecer os seus próprios serviços em detrimento de fornecedores rivais, anunciantes e editores, o que teria resultado numa autopreferência sistémica ao longo da cadeia de valor da adtech.

De acordo com a CE, a Google atua simultaneamente como fornecedora de serviços de publicidade nas suas próprias plataformas e como intermediária entre anunciantes e editores através de um ecossistema que assenta em três tipos de serviços essenciais: (i) servidores de anúncios para editores através do DoubleClick for Publishers (“DFP”); (ii) ferramentas de compra de anúncios programáticos, nomeadamente o Google Ads e o DV360;  e (iii) plataformas de troca de anúncios (ad exchanges), em particular a AdX.

Segundo a investigação da CE, a Google detinha uma posição dominante no mercado dos servidores de anúncios para editores, através do DFP, e no mercado das ferramentas de compra de anúncios programáticos, através do Google Ads e o DV360, em todo o Espaço Económico Europeu. Neste contexto, a CE considerou que a Google teria abusado dessa posição dominante por ter alegadamente adotado práticas de autopreferência suscetíveis de reforçar a integração vertical do grupo ao longo da cadeia de adtech.

Para restaurar as condições de concorrência efetiva, a CE ordenou à Google que cessasse as práticas de autopreferência e adotasse medidas para eliminar os conflitos de interesses em toda a cadeia de tecnologia de publicidade digital.

A coima de 2,95 mil milhões de euros foi fixada tendo em conta a duração e a gravidade da infração, o volume de negócios relevante associado ao AdX, bem como o historial sancionatório da Google por abusos anteriores de posição dominante.

 

CE APLICA PELA PRIMEIRA VEZ COIMAS POR RESPOSTA INCOMPLETA A PEDIDO DE INFORMAÇÕES

Comunicado de Imprensa de 8 de setembro de 2025 - Processo AT.40966 - CE

A CE aplicou uma coima total de cerca de 172 mil euros à Eurofield SAS (“Eurofield”) e à Unanime Sport SAS (“Unanime”) (empresa-mãe da Eurofield à data dos factos), por alegada resposta incompleta a um pedido de informações, emitido no âmbito da investigação da CE, no setor dos relvados sintéticos.

Esta foi a primeira vez que a CE sancionou uma empresa por responder de forma incompleta a um pedido de informações num processo de concorrência, sendo que, nos termos do quadro normativo aplicável a pedido de informação de CE, a prestação de informação incorreta, enganosa ou incompleta pode dar origem a coima até 1% do volume de negócios mundial do grupo económico em causa.

Neste contexto, em junho de 2023, a CE enviou um pedido de informações, por carta, à Eurofield no contexto da sua investigação ao setor dos relvados sintéticos. Após analisar a resposta da Eurofield (que também foi alvo de buscas) e compará-la com documentos obtidos durante as diligências de busca e apreensão no âmbito do mesmo processo, que tiveram lugar em junho de 2023, a CE concluiu que a resposta estava incompleta.

Por conseguinte, em outubro de 2023, a CE emitiu um novo pedido de informações à Eurofield, ao abrigo do artigo 18.º, n.º 3, do Regulamento 1/2003[1], o que implica uma obrigação legal de resposta completa e exata. Segundo a CE, a Eurofield voltou a não fornecer todas as informações solicitadas. 

Neste seguimento, em novembro de 2024, a CE abriu uma investigação quanto à existência de uma resposta alegadamente incompleta, tendo a empresa acordou cooperar com a CE na investigação, reconhecendo a sua responsabilidade e aceitando o pagamento de uma coima. Neste contexto, a Eurofield e a Unanime (empresa-mãe da Eurofield à data dos factos) apresentaram os documentos identificados como tendo sido omitidos, bem como informação suplementar que a CE não tinha ainda identificado como em falta.

Considerando a gravidade da violação, a CE fixou uma coima equivalente a 0,3% do volume de negócios combinado das empresas, reduzida em 30% em virtude da cooperação posterior, perfazendo cerca de 172 mil euros, imposta solidariamente à Eurofield e à Unanime Sport, enquanto empresa-mãe à data da conduta.

Ademais, a investigação da CE no setor dos relvados sintéticos continua em curso e constitui um processo autónomo.

 

TJUE CLARIFICA AS REGRAS RELATIVAS À CONTAGEM DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO DAS AÇÕES DE PRIVATE ENFORCEMENT

Acórdão de 4 de setembro de 2025 - Processo C-21/24 - TJUE

O TJUE proferiu, em 4 de setembro de 2025, um acórdão, no âmbito de um reenvio prejudicial, que veio esclarecer que o prazo de prescrição das ações de indemnização em direito da concorrência (as chamadas ações de private enforcement) só começa a correr a partir do momento em que a decisão sancionatória da autoridade nacional da concorrência adquire força de caso julgado.

O litígio subjacente envolveu um consumidor e a Nissan Iberia, S.A., relativo a um pedido de indemnização por danos alegadamente decorrentes de uma infração declarada pela Comissão Nacional dos Mercados e da Concorrência espanhola (“CNMC”), de 23 de julho de 2015, que sancionou um intercâmbio de informações comercialmente sensíveis entre vários fabricantes de automóveis, alegada prática que cessou em 2013. Essa decisão foi objeto de recurso judicial, mas foi confirmada, no que respeita à Nissan, pelo Supremo Tribunal espanhol em 2021, tornando-se definitiva apenas nessa data.

O TJUE concluiu que, enquanto a decisão da autoridade nacional da concorrência for suscetível de recurso judicial, o tribunal nacional que conhece da ação de indemnização não está vinculado à declaração da infração nela contida. Por conseguinte, não se pode considerar que a parte lesada disponha das informações indispensáveis para intentar a sua ação de indemnização antes de essa decisão se ter tornado definitiva, razão pela qual o prazo de prescrição não pode começar a correr antes desse momento.

Ademais, o TJUE salientou que a mera possibilidade de requerer a suspensão da instância não satisfaz o princípio da efetividade, porquanto tal mecanismo só pode ser acionado após a propositura da ação, e o início do prazo pressupõe que as informações decorrentes da decisão definitiva (ou do acórdão confirmatório) tenham sido devidamente publicadas e sejam livremente acessíveis, com indicação clara da data de publicação.

Em conclusão, o TJUE decidiu que o direito da UE deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação nacional, tal como interpretada pelos tribunais nacionais, segundo a qual o prazo de prescrição das ações de indemnização por infrações ao direito da concorrência resultantes de uma decisão de uma autoridade nacional da concorrência pode começar a correr antes de essa decisão ter adquirido força de caso julgado.

Para mais informação sobre esta decisão, consultar Newsletter UM de 4 de setembro de 2025 sobre este acórdão.

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3. Direito Digital

DECISÃO DE EXECUÇÃO DA COMISSÃO – ADEQUAÇÃO DO NÍVEL DE PROTEÇÃO DOS DADOS PESSOAIS ASSEGURADO PELOS ESTADOS UNIDOS

Acórdão de 3 de setembro de 2025 (Processo T-553/23) - TJUE

A presente decisão surge na sequência de uma ação interposta por Philippe Latombe (o “Autor”), cidadão francês, que interpôs recurso de anulação da Decisão de Execução (UE) 2023/1795 da Comissão Europeia (“CE”), de 10 de julho de 2023, que declarou adequado o nível de proteção dos dados pessoais assegurado pelos Estados Unidos no âmbito do Quadro de Privacidade de Dados UE-EUA. Este novo quadro surge na sequência dos acórdãos Schrems I e Schrems II, que invalidaram os anteriores sistemas de transferência de dados transatlânticos por não garantirem proteção equivalente à da União Europeia (“UE”). Entre 2015 e 2020, a UE apreciou, por diversas vezes, o nível de proteção de dados garantido pelos Estados Unidos, considerando-o sempre aquém do nível de proteção adequado. Consequentemente, seguiram-se diversos debates entre as instituições europeias e as americanas, por forma a finalmente criar um programa de proteção de dados satisfatório aos olhos do regulador europeu, o que resultou na criação do EU-U.S. Data Privacy Framework e de um Tribunal de Fiscalização da Proteção de Dados (Data Protection Review Court, o “DPRC). Em 10 de julho de 2023, a CE emitiu uma Decisão de Execução na qual ratificou a adequação das medidas de segurança propostas pelos Estados Unidos quanto a dados pessoais no âmbito do EU-U.S. Data Privacy Framework.

Neste seguimento, o Autor requereu a anulação desta decisão junto do Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”), por violação dos direitos à vida privada e proteção de dados (artigos 7.º e 8.º da Carta), violação do direito a uma via de recurso efetiva (artigo 47.º da Carta), ausência de proteção contra decisões automatizadas (artigo 22.º do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016 (“RGPD”)) e violação das regras de segurança no tratamento de dados (artigo 32.º do RGPD).

O TJUE decidiu, no que respeita a independência do DPRC, que o mesmo apresenta garantias suficientes de independência, na medida em que estão previstos critérios objetivos para admissão dos seis juízes que o compõem e que as suas decisões são vinculativas e finais, obrigando os serviços de informações e o Governo dos Estados Unidos. Esclareceu ainda que a CE não é obrigada a assegurar que as disposições de um país terceiro sejam idênticas às da UE, mas substancialmente equivalentes. Por outro lado, fixa também que a recolha em larga escala de dados pessoais não carece de autorização prévia de uma autoridade judicial ou administrativa, sendo suficiente uma supervisão judicial ex post feita pelo próprio DPRC.

Ao indeferir o recurso proposto pelo Autor, o TJUE adota o entendimento de que os Estados Unidos asseguram um nível de proteção substancialmente equivalente ao garantido pelo direito da UE.

 

OBRIGAÇÃO DE INFORMAÇÃO DO TITULAR DOS DADOS – TRANSMISSÃO DE DADOS PSEUDONIMIZADOS

Acórdão de 4 de setembro de 2025 (Processo C-413/23 P) – TJUE

O caso em apreço teve origem na resolução do Banco Popular Español, em 2017, decidida pelo Conselho Único de Resolução (“CUR”), que lançou um processo de consulta aos acionistas e credores afetados sobre uma eventual indemnização devida, convidando-os a exercer o direito a ser ouvidos. Ora, os participantes apresentaram comentários através de um formulário online com base em garantias de anonimato, e o CUR transmitiu alguns desses comentários à sociedade de auditoria Deloitte com códigos alfanuméricos.

Vários acionistas apresentaram reclamações à Autoridade Europeia para a Proteção de Dados (“AEPD”), invocando que o CUR não os tinha informado de que os dados seriam transmitidos a terceiros. A AEPD concluiu que o CUR tinha violado a obrigação de informação prevista no Regulamento (UE) 2018/1725 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2018, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas instituições e pelos órgãos e organismos da União e à livre circulação desses dados, e que revoga o Regulamento (CE) n.° 45/2001. O Tribunal Geral anulou a decisão da AEPD, tendo esta recorrido para o Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”).

Neste seguimento, o TJUE concluiu que dados pseudonimizados não são necessariamente dados anónimos e que o caráter pessoal dos dados deve ser apreciado relativamente a cada entidade que os trata. Para o CUR, que dispunha de informações suplementares, os comentários mantêm caráter pessoal; para a Deloitte, podem não ter esse caráter se as medidas técnicas impedem efetivamente a identificação.

Assim, o TJUE concluiu que os comentários transmitidos à Deloitte constituíam dados pessoais, uma vez que o CUR, enquanto responsável pelo tratamento, dispunha de todas as informações necessárias para identificar os autores dos comentários, nomeadamente através da chave de correspondência entre os códigos alfanuméricos e os nomes reais. O facto de a Deloitte não poder identificar os titulares dos dados é irrelevante para determinar se o CUR tinha a obrigação de informar os participantes sobre essa transmissão.

O TJUE anulou o acórdão do Tribunal Geral, concluindo que o CUR devia ter informado os titulares dos dados sobre a transmissão à Deloitte aquando da recolha dos dados.

 

AÇÃO INIBITÓRIA DESTINADA A ORDENAR AO RESPONSÁVEL PELO TRATAMENTO QUE SE ABSTENHA DE REPETIR O TRATAMENTO ILÍCITO

Acórdão de 4 de setembro de 2025 (Processo C-655/23) – TJUE

No caso subjacente ao presente acórdão, um funcionário de um banco enviou a um terceiro, por lapso, uma mensagem destinada a um candidato de um processo de recrutamento (o “Candidato”), contendo informações sobre a rejeição das suas pretensões salariais, o que levou a que o Candidato intentasse uma ação na qual pretendeu obter a condenação do banco a abster-se de qualquer tratamento futuro dos seus dados pessoais e, por outro lado, a pagar-lhe uma indemnização por danos morais resultantes do envio destas informações.

Face aos pedidos enunciados acima, o Supremo Tribunal de Justiça Federal Alemão procedeu a um pedido de reenvio prejudicial, colocando as seguintes questões ao Tribunal de Justiça da União Europeia (“TJUE”): (i) se o Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016 (“RGPD”) deve ser interpretado no sentido de prever um direito de ação judicial preventiva; (ii) o que é abrangido pelo conceito de “danos imateriais” e se é exigível uma gravidade mínima para que estes danos possam ser ressarcidos; (iii) se o grau de culpa do responsável pelo tratamento pode ser tido em conta para determinar o montante da indemnização; e, por fim, (iv) se uma decisão inibitória pode reduzir ou substituir a indemnização pecuniária por danos imateriais.

Neste contexto, esclarece o TJUE que o RGPD não contém disposições que prevejam que o titular dos dados beneficia de um direito a obter de forma preventiva, por via de ação judicial, que o responsável pelo tratamento de dados pessoais seja obrigado a abster-se, no futuro, de cometer uma violação das disposições deste regulamento, mais especificamente sob a forma de uma repetição de um tratamento ilícito. Contudo, o RGPD não se opõe a que os Estados-Membros integrem essa possibilidade nas suas ordens jurídicas nacionais, uma vez que tal reforça o efeito útil das disposições do RGPD e o nível de proteção dos titulares dos dados.

Ademais, discute-se no acórdão em análise se a compensação por danos “imateriais” pressupõe um nível mínimo de gravidade ou se basta que exista uma relação de causalidade entre a alegada violação do RGPD e o dano sofrido. Conclui o TJUE que a mera “perda de controlo” sobre os seus dados pessoais pode consubstanciar um dano imaterial indemnizável, simplesmente por suscitar sentimentos negativos. Importa, sobretudo, que seja possível associar a violação do RGPD em causa ao sentimento experienciado e, consequentemente, ao dano sofrido, independentemente da sua materialização ou escala. Adicionalmente, o TJUE rejeitou a possibilidade de os Estados-Membros ou os tribunais nacionais estabelecerem um limiar mínimo de gravidade para o reconhecimento de danos imateriais, entendendo que qualquer prejuízo suscetível de afetar os direitos de personalidade do titular pode justificar uma compensação ao abrigo do RGPD.

Relativamente à culpa do responsável pelo tratamento, o Tribunal clarificou que o RGPD prevê uma presunção de responsabilidade, que apenas pode ser afastada se o responsável demonstrar que o facto ilícito não lhe é imputável. A indemnização não depende, por conseguinte, do grau de culpa, mas sim da verificação de uma violação e de um dano efetivo. Todavia, o grau de culpa pode influenciar o montante da indemnização, cabendo ao tribunal nacional ponderar a gravidade da conduta e o impacto da violação nos direitos do titular.

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4. Financeiro

QUADRO REGULATÓRIO DA UNIÃO EUROPEIA PARA A GESTÃO DE CRIPTOATIVOS: NORMAS TÉCNICAS DE REGULAMENTAÇÃO DE CRIPTOFICHAS

Regulamento Delegado (UE) 2025/1125, da Comissão, de 5 de junho de 2025

A Comissão Europeia publicou, no passado dia 15 de setembro de 2025, um Regulamento Delegado cujo âmbito pretende complementar o Regulamento (UE) 2023/1114 do Parlamento Europeu e do Conselho (o “Regulamento (UE) 2023/1114”), no que diz respeito às normas técnicas de regulamentação que especificam as informações a fornecer no pedido de autorização para oferecer ao público criptofichas referenciadas a ativos ou para solicitar a sua admissão à negociação.

O Regulamento Delegado especifica, entre outros:

  1. A documentação exigida, na medida em que as entidades emissoras devem apresentar informação detalhada sobre a descrição das criptofichas, em particular as características técnicas e eventuais riscos associados;
  2. A política de gestão de reservas, nomeadamente a forma como os ativos que dão suporte às criptofichas são mantidos e geridos, incluindo regras de liquidez, mecanismos de garantia e processos para assegurar a estabilidade do valor;
  3. A necessidade de descrever a entidade organizacional da entidade emissora, mecanismos de controlo interno, compliance regulatório, e procedimentos para prevenção de abusos;
  4. A necessidade de fornecer resultados de avaliações de idoneidade para cada membro do órgão de administração, incluindo atas pertinentes, decisões de avaliação e, quando necessário, planos de formação; e
  5. O modo como a entidade emissora irá assegurar a divulgação contínua de informações relevantes aos investidores e titulares das criptofichas, para assegurar transparência e comunicação.

Nestes termos, o Regulamento Delegado visa assegurar que as entidades emissoras de criptofichas referenciadas a ativos cumprem os requisitos de idoneidade exigidos para a boa governação e supervisão eficaz, garantindo que as informações a fornecer no pedido de autorização para fazer uma oferta pública ou solicitar a admissão à negociação de uma criptoficha referenciada a ativos sejam suficientemente pormenorizadas e exaustivas. Para além disso, visa garantir que as autoridades competentes avaliem se as pessoas coletivas ou outras empresas que pretendam fazer uma oferta pública ou solicitar a admissão à negociação de criptofichas referenciadas a ativos não estão abrangidas por nenhum dos motivos que justificam a recusa da autorização.

 

CRÉDITOS BANCÁRIOS NÃO PRODUTIVOS

Decreto-Lei n.º 103/2025, de 11 de setembro (DR 175, Série I, de 11 de setembro de 2025)

O Decreto-Lei n. º103/2025, de 11 de setembro (“DL”), transpõe para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva (UE) 2021/2167, estabelecendo o Regime da Cessão e Gestão de Créditos Bancários (“RCGCB”). Este diploma, que entra em vigor a 10 de dezembro de 2025, prossegue dois objetivos fundamentais. Por um lado, promove o desenvolvimento do mercado secundário de créditos não produtivos, permitindo às instituições de crédito reduzir os seus ativos não produtivos de forma mais eficiente e, por outro lado, garante uma adequada proteção do devedor no contexto da cessão, garantindo que não fica numa posição menos favorável, assegurando a sua neutralidade. O RCGCB regula a cessão de créditos e a atividade de gestão de créditos cedidos, estabelecendo condições específicas conforme a situação do crédito e o tipo do cessionário. As instituições podem ceder a cessionários, que não sejam instituições, apenas contratos de crédito que apresentem prestações vencidas há mais de 90 dias ou que estejam qualificados como de improvável cumprimento há pelo menos 12 meses, independentemente de o devedor ser uma pequena, média ou grande empresa. O gestor de créditos deve enviar uma comunicação ao devedor, no prazo máximo de 10 dias após a cessão, incluindo informação acerca da identidade do cessionário e gestor, informação detalhada sobre a cessão, manutenção da legislação aplicável e valores em dívida.

O Banco de Portugal é designado como autoridade nacional competente para a autorização, registo, supervisão e fiscalização dos gestores de créditos, bem como para a regulamentação das matérias previstas no regime. Em virtude da entrada em vigor deste diploma, o cessionário fica sujeito a deveres decorrentes da cessão que se consubstanciam em deveres gerais de atuação e tratamento dos devedores. Desde logo, o dever de segredo profissional, que decorre do segredo bancário, e a vinculação a padrões de conduta exigentes na sua relação com o devedor, nomeadamente o respeito pelos legítimos interesses do devedor e o dever de lealdade. São, ainda, impostas alterações em matéria de titularização de créditos, contratos de crédito a consumidores, contratos de crédito relativos a imóveis e regime de titularização de ativos

O presente regime é relevante no atual contexto económico e financeiro europeu. Ao harmonizar o quadro regulamentar nacional com as regras europeias, facilita a atividade transfronteiriça dos gestores de créditos e promove a integração do mercado único neste sector. Ademais, o diploma aprova um novo regime para a Central de Responsabilidades de Crédito (“CRC”), atualizando o âmbito da informação sujeita a centralização e ajustando os procedimentos de comunicação. O RCGCB consagra um regime sancionatório próprio, com contraordenações e coimas que podem atingir valores significativos, assegurando o cumprimento efetivo das obrigações por parte das entidades supervisionadas. Deste modo, equilibra-se a necessidade de dinamizar o mercado de créditos não produtivos com a proteção rigorosa dos direitos e dos devedores, contribuindo para a estabilidade do sistema financeiro português.

 

REGIME DA CESSÃO E GESTÃO DE CRÉDITOS BANCÁRIOS

Projeto de Aviso, Consulta Pública n. º7/2025 (DL n. º 103/2025, de 11 de setembro - DR 175, Série I, de 11 de setembro de 2025) - BdP

O Projeto de Aviso em consulta pública n. º 7/2025 (“Projeto de Aviso”) do Banco de Portugal (“BdP”) regulamenta o Regime da Cessão e Gestão de Créditos Bancários, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 103/2025, de 11 de setembro, que transpôs para a ordem jurídica portuguesa a Diretiva (UE) 2021/2167 relativa a gestores e adquirentes de créditos. Este instrumento atribui ao BdP competências de registo, autorização, supervisão e fiscalização dos gestores de créditos que operam no mercado português.

Tendo por objetivo tornar concreto e operacional o regime legal, o Projeto de Aviso especifica o modo como as entidades interessadas devem proceder para obter a autorização, o modo como se concretiza a supervisão e os critérios que serão utilizados, garantindo a transparência através de registos público. Deste modo, estabelece (i) formulários e documentação necessária para pedidos de autorização, (ii) elementos dos registos público e interno, (iii) os critérios de avaliação da adequação dos membros dos órgãos de administração, (iv) os requisitos de sistemas de governo e controlo interno, (v) as regras para comunicação de atividade transfronteiriça e (vi) subcontratação. Acresce que a adesão ao Sistema de Informação Relevante de Entidades SIRES é obrigatória para os gestores de créditos com sede em Portugal, garantindo a digitalização e eficiência dos processos de supervisão.

No contexto atual de crescente importância do mercado de gestão de créditos não produtivos, este Projeto de Aviso tem particular relevância. Na verdade, ao estabelecer requisitos exigentes e procedimentos claros garante que apenas entidades qualificadas possam exercer esta atividade, assegurando a estabilidade do sistema financeiro. Por outro lado, a harmonização com as regras europeias facilita a atividade transfronteiriça e promove a integração do mercado único europeu.

A imediata entrada em vigor reflete a urgência em dotar o mercado português de um quadro regulatório completo, atualizando-o de acordo com as melhores práticas europeias, capaz de assegurar o desenvolvimento ordenado desta atividade e a proteção adequada dos devedores. Por fim, é de notar que os contributos devem ser apresentados até dia 29 de outubro deste ano.

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5. Fiscal

ALTERAÇÃO À LISTA DE PAÍSES, TERRITÓRIOS E REGIÕES COM REGIMES DE TRIBUTAÇÃO MAIS FAVORÁVEIS

Portaria n.º 292/2025/1, de 5 de setembro (DR 171, Série I, de 5 de setembro de 2025)

Foi publicada a Portaria n.º 292/2025/1, de 5 de setembro, que procede à alteração da lista de países, territórios ou regiões com regime de tributação claramente mais favorável constante da Portaria n.º 150/2004, de 13 de fevereiro.

Esta portaria exclui da referida lista três jurisdições: Hong Kong, Liechtenstein e Uruguai. A exclusão resulta de pedidos formais de revisão apresentados pelos governos destas jurisdições ao abrigo do n.º 3 do artigo 63.º-D da LGT, os quais mereceram pareceres positivos da AT.

A portaria produz efeitos a partir de 1 de janeiro de 2026.

 

IRC APROVAÇÃO DA DECLARAÇÃO MODELO 62 – DECLARAÇÃO DE REGISTO – REGIME DO IMPOSTO MÍNIMO GLOBAL

Portaria n.º 290/2025/1, de 2 de setembro (DR 168, Série I, de 2 de setembro de 2025)

Foi publicada a Portaria n.º 290/2025/1, de 2 de setembro, que aprova a Declaração Modelo 62 - Declaração de Registo - Regime do Imposto Mínimo Global (RIMG) e as respetivas instruções de preenchimento.

Esta portaria surge na sequência da Lei n.º 41/2024, de 8 de novembro, que transpôs a Diretiva 2022/2523 do Conselho, de 14 de dezembro de 2022, relativa à garantia de um nível mínimo mundial de tributação para os grupos de empresas multinacionais e grandes grupos nacionais na União Europeia (UE), aprovando o RIMG. Este regime insere-se no âmbito do Pilar 2 do projeto BEPS da OCDE, que visa assegurar que os grupos multinacionais sejam tributados a uma taxa mínima efetiva de 15%.

A Declaração Modelo 62 destina-se a informar do início da atividade internacional do grupo de empresas multinacionais ou, no caso de um grande grupo nacional, do início do primeiro exercício fiscal em que este passou a estar abrangido pelo regime, bem como da qualidade da entidade que apresenta a declaração e, quando aplicável, a identificação da entidade-mãe final ou da entidade declarante designada e a jurisdição onde estas se encontram localizadas.

A declaração deve ser entregue por cada entidade constituinte localizada em Portugal incluída no âmbito da aplicação do RIMG, através da área reservada do portal das Finanças.

A portaria entrou em vigor no dia 3 de setembro de 2025.

 

TC NÃO INCONSTITUCIONALIDADE DE NORMA CONSTANTE DO REGIME DE CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA SOBRE O SETOR ENERGÉTICO APLICÁVEL A CENTROS ELECTROPRODUTORES COM RECURSO A FONTE RENOVÁVEL

Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 680/2025, Processo n.º 36/24 (DR Série II, de 29 de setembro de 2025)

O Tribunal Constitucional decidiu não julgar inconstitucional o artigo 2.º, alínea b), do regime jurídico da Contribuição Extraordinária sobre o Setor Energético (CESE), aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (“Orçamento do Estado 2014”), cuja vigência foi prorrogada para o ano de 2019, na parte em que determina que o tributo incide sobre o valor dos elementos do ativo de sujeitos titulares de centros electroprodutores com recurso a fonte renovável.

 

STA IMT TRIBUTAÇÃO EM IMT DE PERMUTA DE BEM PRESENTE POR BENS FUTUROS SEM PROJETO DE CONSTRUÇÃO APROVADO

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 0791/21.5BESNT, de 11 de setembro de 2025

O STA decidiu que num contrato de permuta de bem presente (terreno para construção) por bens absolutamente futuros (frações autónomas ainda sem projeto aprovado), a tributação em IMT opera em dois momentos distintos.

No momento da celebração do contrato, deve considerar-se apenas a transmissão do terreno para construção, o qual será sujeito a tributação como se de uma compra e venda se tratasse. Aquando da aprovação do projeto de construção, haverá então que relevar a transmissão das frações autónomas e atender à permuta acordada no contrato, ou seja, à tributação apenas da diferença de valores, retificando-se a anterior liquidação se / quando necessário.

 

IRS NOVAS TABELAS DE RETENÇÃO NA FONTE DE IRS PARA A REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA

Circular n.º 8/2025, de 25 de setembro de 2025

Na sequência da publicação do Despacho n.º 633/2025, de 1 de setembro, do Secretário Regional das Finanças, publicado no Jornal Oficial da Região Autónoma da Madeira, foram aprovadas as tabelas de retenção na fonte de IRS aplicáveis sobre rendimentos do trabalho dependente e pensões pagos ou colocados à disposição de titulares residentes na Região Autónoma da Madeira, a partir de 1 de outubro de 2025.

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6. Imobiliário

OBRIGAÇÃO DE INTEGRAÇÃO DE OBRAS DE ARTE PARA FRUIÇÃO PÚBLICA, EM OBRAS PÚBLICAS

Decreto-Lei n.º 110/2025 (DR 185/2025, Série I, de 25 de setembro de 2025)

O Decreto-Lei n.º 110/2025, de 25 de setembro procede à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 96/2021, de 12 de novembro, que estabelece um regime de integração, em obras públicas, de obras de arte para fruição pública.

O referido diploma criou, inicialmente, para o Estado, para os institutos públicos e para as empresas públicas do setor empresarial do Estado, a obrigação de integrarem obras de arte nos contratos de empreitada de obras públicas ou de concessão de obras públicas, que incidam sobre infraestruturas e equipamentos públicos, quando o respetivo contrato tenha um valor igual ou superior a € 5 000 000,00.

Não obstante, o diploma não contemplou, na sua redação inicial, a subtração da referida obrigação aos contratos de empreitadas de obras públicas que se destinam à promoção de habitação pública, cujos regimes de construção a custos controlados não se compadecem com a possibilidade de acautelar os referidos investimentos culturais, assim como a construção de soluções habitacionais que sejam objeto de regimes excecionais de financiamento, que implicam o cumprimento de prazos exigentes (como o Plano de Recuperação e Resiliência).

Tendo presente o acima, o Decreto-Lei n.º 110/2025, de 25 de setembro vem assim alterar o artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 96/2021, de 12 de novembro, de modo a isentar do referido regime (i.e. da obrigação de integração de obras de arte para fruição pública, em obras públicas) os procedimentos de formação de contratos destinados à promoção de habitação pública ou de custos controlados, considerando que tais contratos têm prazos e características que dificultam a integração de arte.

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7. Laboral

PACTO DE NÃO CONCORRÊNCIA PÓS-CONTRATUAL – EFEITOS DA RESOLUÇÃO – RESPONSABILIDADE CIVIL

Acórdão de 24 de setembro de 2025 (Processo n.º 21525/24.7T8LSB.L1-4) - TRL

No caso em apreço, um trabalhador ("Autor") intentou uma ação contra a anterior entidade empregadora (""), peticionando a condenação desta no pagamento da compensação devida pela obrigação de não concorrência pós-contratual acordada, que a Ré recusou pagar alegando que o trabalhador tinha violado as obrigações assumidas.

Segundo o Autor, após a cessação do seu contrato de trabalho, a 12 de novembro de 2023, a Ré não procedeu ao pagamento da compensação acordada, correspondente a € 900,00 por cada mês do período restritivo (2 anos). Por conseguinte, o Autor peticionou o pagamento das prestações mensais futuras até ao termo daquele período (12 de novembro de 2025), acrescidas de juros de mora à taxa legal.

Por sua vez, a Ré defendeu-se por exceção e por impugnação, invocando ter comunicado ao Autor, por carta enviada em janeiro de 2024, a resolução do pacto de não concorrência com fundamento no incumprimento da obrigação de não concorrência. Na sua defesa, a Ré esclareceu que a resolução do pacto de não concorrência havia sido justificada pelo facto de o Autor ter participado num programa de televisão no dia 2 de dezembro de 2023, onde publicitou produtos desenvolvidos pela empresa da qual era sócio e cujo objeto social coincidia parcialmente com o da Ré, tendo ainda anunciado o relançamento da sua marca no mercado.

O tribunal de 1.ª Instância considerou que o Autor tinha efetivamente exercido atividade concorrencial durante o período de vigência do pacto de não concorrência e, em consequência, absolveu a Ré do pedido. O Autor interpôs recurso desta decisão, tendo o TRL dado provimento parcial.

No acórdão sob análise, o TRL clarificou que a responsabilidade pela violação do pacto de não concorrência e a validade da resolução do mesmo pela Ré encontravam-se no âmbito do instituto da responsabilidade civil (e não do Código do Trabalho) e determinou que, apesar de a resolução do pacto de não concorrência ser válida à luz deste instituto, esta apenas se teria tornado eficaz no dia em que foi efetivamente comunicada ao Autor, ou seja, em 11 de janeiro de 2024, pelo que até a essa data o pacto esteve validamente em vigor.

Nesse pressuposto, o TRL condenou a Ré no pagamento da compensação acordada durante o período restritivo que mediou entre a cessação do contrato de trabalho (12 de novembro de 2023) e a receção da comunicação da resolução do pacto de não concorrência pelo Autor (11 de janeiro de 2024), acrescida de juros de mora.

 

REQUALIFICAÇÃO DE CONTRATO DE AGÊNCIA COMO CONTRATO DE TRABALHO − NULIDADE DE CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA PÓS-CONTRATUAL

Acórdão de 18 de setembro de 2025 (Processo n.º 2008/21.3T8CSC.L1.S1) - STJ

No caso em apreço, uma sociedade comercial dedicada à atividade de mediação imobiliária (“Autora") intentou uma ação contra a respetiva contraparte (“Réu”) do Contrato de Agência e Coordenação celebrado entre ambas, por alegada violação da obrigação de não concorrência assumida no contrato.  O caso assume contornos laborais na medida em que, na sua defesa, o Réu sustentou que o contrato celebrado assumia a natureza de um contrato de trabalho e, nessa medida, as obrigações de não concorrência assumidas estavam sujeitas ao disposto no artigo 136.º do Código do Trabalho (nomeadamente a atribuição de uma compensação durante o período restritivo).

Em suma, o Réu invocou que na ausência de compensação estabelecida entre as partes, o pacto de não concorrência era nulo e, consequentemente, o Réu estava livre de competir com a Autora após a cessação do contrato.

O tribunal de 1.ª Instância rejeitou a tese da requalificação do contrato como contrato de trabalho e julgou parcialmente procedente a ação, tendo condenado o Réu a pagar à Autora a quantia de € 45.000,00, a título de cláusula penal (objeto de redução equitativa), acrescido de juros de mora.

O Réu interpôs recurso desta decisão, tendo o TRL julgado o recurso procedente e, em consequência, revogado a sentença recorrida e absolvido o Réu do pedido, por entender que a relação contratual entre a Autora e o Réu não constituía, efetivamente, um contrato de agência regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 178/86, de 3 de julho (“DL 178/86”), mas sim uma relação laboral. Com base nesta qualificação e no artigo 136.º do Código do Trabalho, o TRL considerou nula a cláusula de não concorrência acordada ao abrigo do Contrato por não atribuir ao Réu qualquer compensação durante o período restritivo.

Inconformada, a Autora interpôs recurso para o STJ.

No aresto sob análise, o STJ entendeu:

  1. por um lado, que a relação estabelecida entre as partes não constituía um contrato de agência, esclarecendo que, nos termos do artigo 1.º do DL 178/86, o contrato de agência pressupunha que uma das partes se obrigasse a promover, por conta da outra, a celebração de contratos que dessem origem a uma relação de clientela com o principal (i.e., a Autora) e que, no caso concreto, o objetivo direto e imediato dos contratos de agência e subagência que o Réu se tinha obrigado a promover (embora não o tenha chegado a concretizar) não era o de aumentar o número de clientes da Autora, mas sim o de aumentar o número de agentes e subagentes – ao abrigo do contrato o Réu obrigou-se a promover, de modo autónomo e estável, a celebração de contratos de agência e subagência por parte da Autora, bem como a dirigir e coordenar a atividade da rede de agentes e subagentes da Autora sob a sua orientação; e
  2. por outro lado, que a relação entre a Autora e o Réu tinha natureza laboral, não só devido à atividade de coordenação da rede de agentes e subagentes efetivamente desenvolvida pelo Réu ao abrigo do Contrato — atividade que o STJ considerou não se identificar com a de um agente nos termos do DL 178/86 —, mas também devido a outros elementos que demonstram subordinação jurídica, característica do contrato de trabalho, nomeadamente o facto de o Réu exercer funções sob orientação e diretivas da Autora, ter acesso a informações privilegiadas não disponíveis aos agentes, participar em reuniões mensais com a coordenadora nacional e estar inserido numa estrutura hierarquizada.

Determinada a natureza laboral da relação, o STJ concluiu que a cláusula de não concorrência pós-contratual acordada entre as partes era nula por violação da alínea c) do n.º 2 do artigo 136.º do Código do Trabalho (por não prever o pagamento de uma compensação adequada) e, consequentemente, negou provimento à revista e manteve a decisão de absolvição do Réu.

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8. Público

REPRIVATIZAÇÃO DA TAP – APROVAÇÃO DO CADERNO DE ENCARGOS

Resolução do Conselho de Ministros n.º 141-B/2025, de 4 de setembro (DR 182, Série I, de 22 de setembro de 2025)

A Resolução do Conselho de Ministros n.º 141-B/2025, de 4 de setembro (“Resolução do Conselho de Ministros 141-B/2025”) aprovou o caderno de encargos da venda direta de referência de ações representativas de até 44,9% do capital social (“Venda Direta de Referência”) da TAP – Transportes Aéreos Portugueses, S.A. (“TAP”) (Anexo I da Resolução do Conselho de Ministros n.º 141-B/2025) (o “Caderno de Encargos”), na sequência da aprovação do processo de reprivatização por via do Decreto-Lei n.º 92/2025, de 14 de agosto (“Processo de Reprivatização”).

A Resolução do Conselho de Ministros 141-B/2025 disciplina, igualmente, as condições gerais da oferta de venda de até 5% do capital aos trabalhadores da TAP e do “Grupo TAP” (sociedades que se encontrem em relação de domínio ou de grupo com a TAP) (Anexo II da Resolução do Conselho de Ministros n.º 141-B/2025) (a “Oferta aos Trabalhadores”).

Nos termos da Resolução do Conselho de Ministros 141-B/2025, a regulação efetuada através do Caderno de Encargos pode vir a ser complementada com outras que se afigurem necessárias para a conclusão do Processo de Reprivatização da TAP.

Destacam-se as seguintes novidades regulatórias do Processo de Reprivatização, introduzidas pelo Caderno de Encargos:

  1. O processo tem a duração máxima de um ano, desdobrando-se em três etapas:
    1. Manifestação de interesse (60 dias);
    2. Apresentação de propostas não-vinculativas (90 dias); e
    3. Realização de diligências informativas e apresentação de propostas vinculativas (90 dias), podendo o Conselho de Ministros determinar a realização de uma quarta etapa de negociações para a apresentação de propostas finais melhoradas;
  2. São requisitos de participação pelos interessados, nos termos do n.º 1 do art.º 5.º do Caderno de Encargos:
    1. A idoneidade;
    2. A capacidade financeira; e
    3. A verificação da qualidade de operador aéreo certificado, com conhecimento e experiência técnica e de gestão no setor do transporte aéreo, estabelecendo-se um critério de “dimensão mínima”, aferida em função do volume de negócios, nos termos da Secção 4 do Caderno de Encargos;
  3. São critérios de seleção, nos termos do n.º 6 do art.º 5.º do Caderno de Encargos, nomeadamente:
    1. O valor oferecido;
    2. O grau de conhecimento e experiência no setor;
    3. A apresentação de garantias de sustentabilidade financeira e a projeção de rentabilidade da TAP; 
    4. A existência de um plano industrial e estratégico ambicioso e sustentado;
    5. A existência de um projeto estratégico adequado à preservação e ao crescimento da TAP;
    6. A assunção de que a TAP vai manter as respetivas obrigações de serviço público;
    7. A ausência de condicionantes jurídicas ou económico-financeiras na esfera do participante;
    8. A assunção de riscos regulatórios; e
    9. O respeito pelos compromissos laborais da TAP, entre outros;
  4. O Conselho de Ministros reservou as prerrogativas de suspensão e extinção do Processo de Reprivatização por razões de interesse público, não tendo os interessados ou proponentes direito a qualquer indemnização ou compensação, em todo o momento do Processo de Reprivatização, até à liquidação física da compra e venda;
  5. São ainda estabelecidas algumas salvaguardas estratégicas, das quais se destacam:
    1. A sujeição das ações adquiridas na Venda Direta de Referência a um regime de indisponibilidade pelo período de cinco anos contados da data da respetiva transmissão;
    2. O direito de preferência do Estado Português relativamente à transmissão a terceiros de ações adquiridas na venda direta de referência; e
    3. O direito de primeira oferta, em futuras alienações pelo Estado, atribuído ao investidor de referência, ou seja, ao proponente cuja proposta vinculativa tenha sido selecionada no âmbito da Venda Direta de Referência.

O presente diploma entrou em vigor a 5 de setembro de 2025.

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[1] Regulamento (CE) n.º 1/2003 do Conselho, de 16 de Dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 101.º e 102.º do Tratado, JO L 1 de 4.1.2003, pp. 1-25.

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