Legislaçao Laboral e o Combate aos Contratos de Trabalho a Termo Certo

Inês Arruda.

Dezembro 2009 Revista Actualidad & Economia Ibérica


Sempre me fascinou o génio empresarial. Há dias tive a oportunidade de ler um riquíssimo texto de Carlos Rodríguez Braun, da Universidad Compultense de Madrid, em prólogo à obra “Zara e suas irmãs” de Enrique Badía. Em breves linhas o Prof. Rodríguez Braun, numa alusão ao «descrédito histórico da classe empresarial», fazia referência à latente «incompreensão da riqueza reduzida a um jogo em que o resultado é zero e em que ninguém pode ganhar senão à custa do outro». Inicia a sua prosa apelidando Bernard Shaw de «rematado idiota» por este último ter afirmado que «há duas maneiras de enriquecer: desonestamente e roubando». Pouco sei de Bernard Shaw. Mas vou conhecendo o legislador português...

Neste contexto de perseguição cega ao génio empresarial identifico um denominador comum nos recentes Código do Trabalho, entrado em vigor em 17 de Fevereiro deste ano, e Código Contributivo, aprovado cerca de sete meses depois: um combate – quase que obsessivo - à contratação a termo.

É sem dúvida pertinente a pergunta colocada por Alice Pereira de Campos, na sua recente dissertação de mestrado (“Contrato de trabalho a termo: uma forma de trabalho precário?”): e se as necessidades forem efectivamente – como muitas vezes são – temporárias, porque deverá ser a empresa penalizada por contratar a termo?

Não há dúvida que em Portugal são celebrados contratos de trabalho a termo como escapatória ao limitado regime de despedimentos vigente. Ninguém o esconde. É por isso válido presumir que todos os contratos de trabalho a termo são ilícitos e penalizar, sem mais, a contratação a termo? O legislador português entendeu que sim.

Nos trabalhos preparatórios do Código do Trabalho (compilados no chamado “Livro Branco” que contém um estudo sobre a situação do mercado de trabalho português) o contrato de trabalho a termo é identificado como uma forma de trabalho precário: «o aumento da incidência de emprego com contrato a termo (…) juntamente com a elevada incidência de emprego por conta própria (…) contribuem para o nível elevado de precariedade existente no mercado de trabalho português».

Debatidas que estão as restrições introduzidas pelo Código do Trabalho à contratação a termo, centremo-nos nas novidades trazidas, nesta matéria, pelo Código Contributivo.

Este diploma prevê um agravamento da parcela da taxa contributiva a cargo da entidade empregadora em três pontos percentuais nos contratos de trabalho a termo resolutivo (salvo se celebrados para substituição de trabalhador em gozo de licença de parentalidade ou com incapacidade temporária para o trabalho por doença por período igual ou superior a 90 dias).

Esta penalização é, ainda, extensível aos contratos de comissão de serviço, sempre que o trabalhador seja contratado ao abrigo deste regime e não tenha acordado a sua permanência na empresa, após o termo da comissão, através de um contrato de trabalho sem termo.

Note-se que esta medida não visa penalizar as situações ilícitas de contratação a termo, mas a mera contratação a termo qua tale, como sendo o mais odioso instrumento de flexibilidade criado pelo – hoje incompreendido - legislador português do período pós revolucionário de 1975. 

O Código Contributivo introduz, ainda, uma estranha  conversão de contratos de trabalho a termo certo em contratos de trabalho sem termo, sempre que a empresa declare à Segurança Social, pelo menos em duas declarações de remunerações consecutivas, que um determinado contrato de trabalho foi celebrado sem termo quando de facto foi celebrado a termo resolutivo. Uma conversão legal perdida num diploma que trata matérias de Segurança Social.

O Livro Branco reconhece (embora coloque a questão como um problema) que «ao longo dos últimos ciclos económicos, os contratos a termo são responsáveis por grande parte das flutuações cíclicas do emprego, assumindo estas formas de emprego um comportamento pós-ciclico. Estes empregos são os primeiros a serem destruídos nas recessões e os primeiros a serem criados na fase inicial da expansão. Esta é uma característica do mercado de trabalho português que não é partilhada por outros países europeus». Acrescentaria, “nos quais o despedimento é livre”.

Ora, oficialmente reconhecido - que está! - que numa fase inicial de expansão, como a que se anseia, os contratos de trabalho a termo são os primeiros a ser criados, será razoável penalizar as empresas por recorrerem a este tipo de contratação?

Pese embora o Código Contributivo entrar em vigor no dia 1 de Janeiro de 2010, as medidas acima referidas vigorarão só a partir de 1 de Janeiro de 2011.

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