Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português
14 maio 2024
1. Direito Digital
- Worldcoin - Decisão de Suspensão de Recolha de Dados Biométricos
- Poderes da Autoridade Nacional de Controlo para Ordenar o Apagamento de Dados Pessoais
- Cadeia de Letras e de Carateres - Conceito de Dados Pessoais
2. Financeiro
- Alterações das regras aplicáveis aos planos de recuperação previstas no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras
- Mercados de Instrumentos Financeiros: Obrigações de Transparência e Informação
3. Fiscal
- IVA - Cumprimento de Obrigações de Comunicação - Comércio Eletrónico e Combate à Fraude
- Nacionalidade Portuguesa - Alteração do Critério de Contagem do Prazo de Residência Legal em Território Português
- IRS - Mais Valias - Valor de Realização - Preço de Venda Superior ao Valor de Avaliação do Imóvel - Violação do Princípio da Capacidade Contributiva
- IRS - Programa “Mais Habitação” - Aplicação da Lei no Tempo
- IRC - Região Autónoma da Madeira - Limitação da Aplicação da Isenção da Derrama Regional - Inconstitucionalidade por Violação do Princípio da Legalidade Tributária
4. Imobiliário
- Tribunal da Relação do Porto rejeita Direito de Preferência do Arrendatário Comercial em prédio não constituído em propriedade horizontal
5. Laboral
- Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura - Alterações
6. Público
- Plano de Ação para o Biometano
- Prorrogação - Medidas Excecionais - Simplificação dos Procedimentos de Produção de Energia de Fontes Renováveis
- Gestão de Resíduos - Deposição de Resíduos em Aterro - Gestão de Fluxos Específicos de Resíduos
1. Direito Digital
WORLDCOIN – DECISÃO DE SUSPENSÃO DE RECOLHA DE DADOS BIOMÉTRICOS
Deliberação/2024/137 da CNPD, de 25 de março de 2024
Em 25 de março de 2024, a Comissão Nacional da Proteção de Dados (“CNPD”) aplicou, ao abrigo dos seus poderes de correção, previstos no artigo 58.º do RGPD, uma medida provisória de suspensão, pelo período de noventa dias, da recolha de dados biométricos pela Worldcoin Foundation (a “Worldcoin”).
A Worldcoin é responsável pela criação da aplicação World App, que constitui uma carteira de criptomoeda, através da qual recolhe dados biométricos (i.e. captura de imagens da íris, dos olhos e do rosto) dos aderentes, que recebem tokens como contrapartida pela cedência desses dados biométricos.
A CNPD começa por recordar, em primeiro lugar, que o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”) admite excecionalmente o tratamento de dados biométricos nos casos previstos no n.º 2 do artigo 9.º do RGPD, sendo que o único fundamento enquadrável ao caso ora em análise seria o consentimento do titular dos dados, que deve ser livre, informado, inequívoco e explícito.
Sucede, porém, que a CNPD veio a verificar que a Worldcoin, em violação dos artigos 5.º, n.º 1, alínea a), 12.º, n.º 1, e 13.º do RGPD, não facultou, de forma clara e transparente, aos titulares dos dados, informações essenciais à formação da vontade destes, nomeadamente, (i) por determinada informação ser prestada em língua inglesa, (ii) através de sucessivas camadas informativas, bem como (iii) inexistência de qualquer informação quanto aos fins que justificariam o tratamento de dados e quanto ao direito do titular dos dados de revogar o seu consentimento. Tudo isto coloca em causa a validade do consentimento obtido, por não constituir um consentimento informado.
Em segundo lugar, e no seguimento do acima referido, a CNPD verificou ainda que a Worldcoinatuou em violação do disposto no artigo 7.º, n.º 3, do RGPD, que atribui ao titular dos dados o direito de revogar o seu consentimento, bem como do artigo 17.º do RGPD, que atribuiu ao titular dos dados o direito de obter do responsável pelo tratamento o apagamento dos seus dados pessoais.
Adicionalmente, a CNPD constatou que o procedimento de recolha de dados biométricos não previa qualquer mecanismo de verificação de idade do aderente (por exemplo, não exigia a exibição do documento de identificação), tendo a Worldcoinrecolhido dados biométricos de menores sem a autorização dos seus representantes legais.
Finalmente, a CNPD fundamentou a sua decisão, relativa à necessidade de adotar a medida provisória de suspensão, na urgência de prevenir danos graves ou irreparáveis para os titulares dos dados, especialmente vulneráveis, face à complexidade da investigação em curso e ao aumento significativo da procura pelo serviço da Worldcoin (note-se que a recolha de dados biométricos abrangeu mais de 300 mil pessoas no território nacional).
PODERES DA AUTORIDADE NACIONAL DE CONTROLO PARA ORDENAR O APAGAMENTO DE DADOS PESSOAIS
Acórdão de 14 de março de 2024, processo C-46/23 - TJUE
O Acórdão doTJUE de 14 de março de 2024 foi proferido no âmbito de um litígio relativo à legalidade de uma decisão da Autoridade Nacional de Proteção de Dados e da Liberdade de Informação da Hungria (a “ANPD”), proferida ao abrigo do artigo 58.º, n.º 2, alínea d), do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”), no termos da qual ordenou à Administração Pública da Hungria que apagasse dados pessoais tratados ilicitamente no âmbito de um programa de apoio financeiro aos residentes que pertenciam a grupos vulneráveis durante a pandemia de COVID-19.
Os dados em questão foram obtidos pela Administração Pública da Hungria junto do Tesouro Público Húngaro e do Gabinete do Distrito de Budapeste, para proceder à verificação dos requisitos de elegibilidade para a concessão do referido apoio financeiro.
Em setembro de 2020, a ANPD, alertada por uma denúncia, abriu oficiosamente um inquérito, e, em abril de 2021, adotou decisão no sentido de que Administração Pública da Hungria tinha violado várias disposições dos artigos 5.º, 12.º, n.º 1, e 14.º do RGPD. Salientou, nomeadamente, que a Administração Pública da Hungria não tinha informado os titulares dos dados sobre as categorias de dados pessoais tratadas no âmbito desse programa, as finalidades do tratamento em causa ou as modalidades segundo as quais esses titulares poderiam exercer os seus direitos a esse respeito.
Em sede de recurso interposto no Tribunal de Budapeste (o órgão jurisdicional de reenvio), a Administração Pública da Hungria contestou a decisão da ANPD, alegando que esta não tinha poder para ordenar o apagamento de dados pessoais, nos termos do artigo 58.º, n.º 2, alínea d), do RGPD, por tal não ter sido solicitado pelos titulares dos dados, nos termos do artigo 17.º deste Regulamento, uma vez que o direito ao apagamento, no entendimento da Administração Pública da Hungria, está concebido exclusivamente como um direito do titular dos dados.
Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio submeteu ao TJUE duas questões prejudiciais.
Em primeiro lugar, colocou a questão de saber se o artigo 58.º, n.º 2, alíneas c), d) e g), do RGPD, deve ser interpretado no sentido de que a autoridade de controlo de um Estado-Membro pode, no exercício dos seus poderes de correção, ordenar ao responsável pelo tratamento ou ao subcontratante que apague os dados pessoais tratados ilicitamente, mesmo sem um pedido expresso do titular dos dados em conformidade com o artigo 17.º, n.º 1, do RGPD.
A segunda questão visa saber se, em caso de resposta afirmativa à primeira questão, a referida resposta é independente do facto de os dados pessoais terem ou não sido obtidos junto do titular.
O TJUE respondeu à primeira questão considerando que o artigo 58.º, n.º 2, alíneas d) e g), do RGPD, deve ser interpretado no sentido de que a autoridade de controlo de um Estado-Membro pode, no exercício dos poderes de correção que detém, ordenar ao responsável pelo tratamento ou ao subcontratante que apague os dados pessoais tratados ilicitamente, apesar de o titular dos dados não ter apresentado nenhum pedido de exercício dos seus direitos nesse sentido, em aplicação do artigo 17.º, n.º 1, do RGPD.
O TJUE salientou que o artigo 17.º, n.º 1 estabelece duas hipóteses distintas e independentes, a saber, (i) o apagamento dos dados a pedido do titular dos dados e (ii) o apagamento decorrente da existência de uma obrigação autónoma, que impende sobre o responsável pelo tratamento, independentemente de qualquer pedido daquele titular. O TJUE considerou que, para assegurar uma aplicação efetiva e coerente do RGPD, é necessário que a autoridade nacional de controlo disponha de poderes efetivos para agir eficazmente contra as violações deste Regulamento, nomeadamente para lhes pôr termo, incluindo nos casos em que os titulares dos dados não estejam informados do tratamento dos seus dados pessoais, não tenham conhecimento do mesmo ou, em todo o caso, não tenham pedido o apagamento desses dados.
Quanto à segunda questão, mais uma vez, o TJUE concluiu não ser possível extrair dos artigos 17.º, n.º 1, e 58.º, n.º 2, que o uso dos poderes de correção pela autoridade de controlo depende da origem dos dados recolhidos, nomeadamente da circunstância de terem sido recolhidos junto do titular dos dados. Assim, o poder de a autoridade de controlo de um Estado-Membro ordenar o apagamento de dados pessoais tratados ilicitamente pode ter por objeto tanto os dados recolhidos junto do titular dos dados como os dados provenientes de outra fonte.
CADEIA DE LETRAS E DE CARATERES – CONCEITO DE DADOS PESSOAIS
Acórdão de 7 de março de 2024, processo C-604/22 - TJUE
O Acórdão do TJUE de 7 de março de 2024, foi proferido no âmbito de um litígio relativo a uma decisão adotada pela Autoridade Nacional da Proteção de Dados da Bélgica (a “ANPD”) contra a IAB Europe, uma associação sem fins lucrativos que representa as empresas do setor da publicidade e do marketing digitais no âmbito europeu, por alegada violação de várias disposições do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”).
Para efeitos de enquadramento, a IAB Europe desenvolveu o Transparency & Consent Framework (“TCF”), que constitui um quadro de regras composto por diretivas, instruções, especificações técnicas, protocolos e obrigações contratuais que permitem a fornecedores de sítios Internet ou de aplicações ou plataformas publicitárias, tratar legalmente os dados pessoais dos utilizadores. O TCF tem, nomeadamente, por objetivo favorecer o cumprimento do RGPD quando estes operadores recorrem ao protocolo OpenRTB, a saber, um dos protocolos mais utilizados para o Real Time Bidding (“RTB”), que é um sistema de leilões em linha de perfis de utilizadores para efeitos de venda e compra de espaços publicitários na Internet.
De forma a obter o consentimento prévio do utilizador para recolha e tratamento de dados, a IAB Europe criou uma plataforma de gestão do consentimento denominada Consent Management Platform (“CMP”) que aparece numa janela pop-up quando o utilizador abre um sítio Internet ou uma aplicação pela primeira vez.
Através da CMP, o utilizador pode, por um lado, dar o seu consentimento para que o fornecedor do sítio Internet ou da aplicação trate os seus dados pessoais (v.g., localização, idade, histórico de pesquisas e compras recentes) ou partilhe esses dados com certos fornecedores, e, por outro lado, opor-se a diferentes tipos de tratamento de dados ou à partilha destes, baseados nos interesses legítimos reivindicados por fornecedores, na aceção do artigo 6.º, n.º 1, alínea f), do RGPD.
Estas preferências são posteriormente codificadas e armazenadas numa cadeia composta por uma combinação de letras e de carateres designada pela IAB Europe “Transparency and Consent String” (“TC String”), que é partilhada com intermediários de dados pessoais e plataformas publicitárias que participam no protocolo OpenRTB. A ANPD considerou que a IAB Europe atuava como responsável pelo tratamento dos dados pessoais no que respeita ao registo do consentimento dos utilizadores através da TC String, que é partilhada com os operadores que participam no sistema de leilões em linha. O órgão jurisdicional de reenvio submeteu ao TJUE duas questões prejudiciais.
A primeira consistiu em saber se uma cadeia composta por uma combinação de letras e de carateres, como a TC String, combinada ou não com um endereço IP, constitui um dado pessoal, na aceção do artigo 4.º, n.º 1, do RGPD; e (ii) se a IAB Europe devia ser qualificada de responsável pelo tratamento dos dados pessoais no quadro do sistema de leilões em linha.
A segunda questão visava saber, por um lado, (i) se uma organização setorial, na medida em que propõe aos seus membros um quadro de regras por si estabelecido relativo ao consentimento em matéria de tratamento de dados pessoais, que contém não só regras técnicas vinculativas mas também regras que especificam de forma detalhada as modalidades de armazenamento e de difusão dos dados pessoais relativos a esse consentimento, deve ser qualificada de “responsável pelo tratamento” e se, para efeitos da resposta a esta questão, é necessário que essa organização setorial tenha, ela própria, diretamente acesso aos dados pessoais tratados pelos seus membros no quadro das referidas regras; por outro lado (ii) se a eventual responsabilidade conjunta da referida organização setorial se estende automaticamente aos tratamentos posteriores de dados pessoais efetuados por terceiros, como os fornecedores de sítios Internet ou de aplicações, no que respeita às preferências dos utilizadores para efeitos da publicidade direcionada em linha.
Quanto à primeira questão, o TJUE considerou que a TC String continha as preferências individuais de um utilizador identificável, sendo essa informação “relativa a uma pessoa singular”, na aceção do RGPD. Para esta análise, baseou-se na definição ampla de “dados pessoais”, prevista no artigo 4.º, n.º 1, do RGPD, que abrange todas as informações que digam respeito a uma pessoa identificada ou identificável, direta ou indiretamente, por referência a um identificador ou a outros elementos específicos. Concluiu, assim, que, na medida em que o facto de associar uma cadeia composta por uma combinação de letras e de carateres, designadamente o endereço IP do aparelho de um utilizador, permite identificar esse utilizador, há que considerar que a TC String contém informações relativas a um utilizador identificável constituindo, portanto, um dado pessoal, na aceção do artigo 4.º, ponto 1, do RGPD.
Esclarece ainda o TJUE que esta interpretação não pode ser posta em causa pelo simples facto de a IAB Europe não poder, por si, combinar a TC String com o endereço de IP do aparelho de um utilizador e de não ter a possibilidade de aceder diretamente aos dados tratados pelos seus membros no quadro do TCF.
Quanto à segunda questão, o TJUE começa por recordar que o artigo 4.º, n.º 7, do RGPD define de forma ampla o conceito de “responsável pelo tratamento”. Portanto, o conceito de responsável pelo tratamento não remete necessariamente para uma pessoa singular ou coletiva única e pode dizer respeito a vários intervenientes que participem no referido tratamento. Neste sentido, a IAB Europe devia ser qualificada como responsável conjunto pelo tratamento por ter influenciado, para fins que lhe eram próprios, o tratamento dos dados pessoais em questão e por ter determinado, conjuntamente com os seus membros, as finalidades e os meios desse tratamento.
O TJUE salientou que a existência de uma responsabilidade conjunta não se traduz necessariamente numa responsabilidade equivalente, e que a responsabilidade conjunta da IAB Europe não se estendia automaticamente aos tratamentos posteriores de dados pessoais efetuados por terceiros, salvo se se demonstrasse que a IAB Europe tinha participado na determinação das finalidades e das modalidades desses tratamentos. Por tudo isto, o TJUE considerou a IAB Europe como responsável conjunto pelo tratamento, na aceção do artigo 4.º, n.º 7, e artigo 26.º, n.º 1, do RGPD, independentemente de esta ter acesso direto à TC Strings (e, portanto, aos dados pessoais tratados pelos seus membros).
2. Financeiro
ALTERAÇÕES DAS REGRAS APLICÁVEIS AOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO PREVISTAS NO REGIME GERAL DAS INSTITUIÇÕES DE CRÉDITO E SOCIEDADES FINANCEIRAS
Aviso n.º 2/2024, de 15 de março - BdP
O Aviso do BdP n.º 2/2024, de 15 de março (o “Aviso”) vem revogar e substituir o Aviso n.º 3/2015, aplicável aos planos de recuperação que as instituições de crédito e outras entidades abrangidas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (o “RGICSF”) são obrigadas a adotar. Estes planos de recuperação identificam medidas para corrigir situações de desequilíbrio financeiro, sendo regulados pelos artigos 116.º-G a 116.º-O do RGSF. O Aviso densifica este regime ao: (i) estabelecer elementos adicionais a incluir nestes planos; (ii) definir procedimentos quanto ao seu reporte, manutenção e revisão, e (iii) implementar procedimentos de determinação de obrigações simplificadas na sua elaboração e reporte.
Em primeiro lugar, o Aviso inclui um anexo com a estrutura que deve ser seguida por cada plano de recuperação, devendo este conter toda a informação prevista no artigo 116.º-H do RGICSF, com o detalhe e a profundidade adequados à natureza, nível e complexidade das atividades desenvolvidas, bem como a informação considerada necessária pelo Regulamento Delegado (UE) 2016/1075 da Comissão, de 23 de março de 2016.
Em segundo lugar, o plano de recuperação, juntamente com elementos quantitativos relevantes para o efeito, deve ser remetido ao Banco de Portugal, anualmente, até 30 de novembro, em suporte informático através do sistema BPNET. Caso o plano de recuperação seja revisto e atualizado entre períodos de reporte, nos termos das alíneas b) e c) do artigo 116.º-I/1 do RGICSF, tais alterações devem ser comunicadas ao Banco de Portugal de imediato. Por sua vez, o artigo 8.º do Aviso dispensa as caixas de crédito agrícola mútuo do reporte de planos de recuperação individuais.
Em terceiro lugar, o Banco de Portugal passa a poder decidir, com base nos critérios constantes do artigo 116.º-J/3 do RGICSF, quais as entidades elegíveis para beneficiar de obrigações simplificadas na elaboração e no reporte do plano de recuperação, devendo notificar as entidades abrangidas por tal decisão. Periodicamente, o Banco de Portugal revê as entidades abrangidas por tais obrigações simplificadas e pode, a todo o momento, revogar a decisão de aplicação das mesmas quanto a certos aspetos do plano de recuperação.
O artigo 7.º do Aviso consagra ainda um dever de comunicação de ultrapassagens dos limites que obriga as entidades em causa a comunicar ao Banco de Portugal: (i) relativamente ao quadro interno de indicadores implementados, sempre que sejam ultrapassados os limites de ativação ou os limites de alerta relativos a requisitos regulamentares; e (ii) relativamente às medidas de recuperação, sempre que seja acionada uma medida prevista no plano de recuperação, ou outras equiparáveis a medidas de recuperação que não estivessem previamente incluídas no plano de recuperação. Esta comunicação deverá ocorrer no prazo máximo de dois dias úteis (no caso de uma ultrapassagem dos limites de ativação), no prazo máximo de um mês (no caso do acionamento de medidas) ou com a maior brevidade possível (no caso de uma ultrapassagem dos limites de alerta).
MERCADOS DE INSTRUMENTOS FINANCEIROS: OBRIGAÇÕES DE TRANSPARÊNCIA E INFORMAÇÃO
Diretiva (UE) n.º 2024/790 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2024 (JOUE, Série L, de 8 de março de 2024)
A Diretiva (UE) n.º 2024/790 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 28 de fevereiro de 2024 (a “Diretiva”), veio estabelecer diversas alterações à Diretiva 2014/65/UE, relativa aos mercados de instrumentos financeiros na União Europeia (a “MiFID II”).
Neste contexto, a Diretiva veio aprovar diversas alterações à MiFID II, com o objetivo de abordar algumas questões, levantadas desde a sua publicação, assim como de acompanhar as mudanças e inovações emergentes no plano financeiro e tecnológico. As principais preocupações que a Diretiva pretende endereçar prendem-se com a transparência e a divulgação de informação relativa aos mercados financeiros em tempo útil. Assim, tem como objetivos o fluxo eletrónico contínuo de dados em tempo real, de forma a proporcionar uma panorâmica abrangente dos preços e do volume dos instrumentos financeiros negociados em toda a UE através de plataformas de negociação, assim como a conceção e implementação de um sistema de informação consolidada, em especial para as emissões de obrigações de empresas, com o intuito de aumentar a respetiva negociação secundária.
Um importante requisito estabelecido pela Diretiva para o efeito é a sincronização dos relógios profissionais de todos os fornecedores de dados e prestadores de informação consolidada, uma vez que através de um carimbo temporal sincronizado é assegurada uma maior qualidade dos dados transmitidos e recebidos, essencial para o funcionamento do sistema de informação consolidada.
Também no contexto da aplicação de mecanismos destinados a limitar a volatilidade excessiva dos mercados, especificamente suspensões de negociações e grelhas de preços, a Diretiva trouxe novidades, através, em particular, da criação de uma obrigação de divulgação pública pelos mercados regulamentos, nos seus sítios web, de informações consolidadas sobre as circunstâncias que levem à aplicação daqueles mecanismos e sobre os principais parâmetros técnicos utilizados para o efeito.
A Diretiva exige também, a título de exemplo, que (i) na sequência da execução de uma ordem em nome de um cliente, as empresas de investimento comuniquem ao cliente o local onde a ordem foi executada; com maior importância, (ii) as empresas de investimento que executem ordens de clientes controlem a eficácia dos seus mecanismos de execução de ordens e da sua política de execução com o intuito de identificar e, se necessário, corrigir eventuais deficiências, em particular avaliando periodicamente se as plataformas de negociação incluídas na política de execução de ordens proporcionam o melhor resultado possível para o cliente ou se devem fazer alterações aos seus mecanismos de execução; e, também neste contexto, (iii) as empresas de investimento notifiquem os seus clientes de quaisquer alterações de fundo aos seus mecanismos de execução de ordens ou da sua política de execução de ordens.
Adicionalmente, a Diretiva pretende igualmente conferir clareza e segurança ao âmbito de aplicação subjetivo das disposições constantes da MiFID II. Neste âmbito, é determinado, por exemplo, que as entidades não financeiras que sejam participantes de um mercado regulamentado ou de uma multilateral trading facility para efeitos de execução de transações relacionadas com a gestão de liquidez ou para efeitos de redução dos riscos diretamente relacionados com as atividades comerciais ou as atividades de financiamento de tesouraria não deverão ser obrigadas a obter autorização para operar como empresa de investimento. Por outro lado, é estabelecido que a obrigação de ter, pelo menos, três utilizadores materialmente ativos, que já era aplicável às multilateral trading facilities e às organised trading facilities, passa também a ser aplicável aos mercados regulamentos, de forma a uniformizar as regras aplicáveis a todos os sistemas multilaterais.
Finalmente, deverá ser esperada regulamentação adicional nesta matéria por parte da ESMA, uma vez que a Diretiva prevê a elaboração pela ESMA de normas técnicas de regulamentação no que diz respeito a: (i) critérios a ter em conta ao determinar e avaliar a eficácia da política de execução de ordens; (ii) os princípios que os mercados regulamentados devem ter em conta ao estabelecerem os seus mecanismos para suspender ou restringir as negociações; e (iii) as informações que os mercados regulamentados devem divulgar sobre as circunstâncias que levaram à suspensão ou restrição das negociações, nomeadamente os parâmetros de suspensão das negociações que os mercados regulamentados devem comunicar às autoridades competentes.
A Diretiva entrou em vigor no dia 28 de março de 2024.
3. Fiscal
IVA - CUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÕES DE COMUNICAÇÃO - COMÉRCIO ELETRÓNICO E COMBATE À FRAUDE
Portaria n.º 81/2024/1, de 5 de março (DR 46, Série I, de 5 de março de 2024)
A referida Portaria aprovou a estrutura e conteúdo do ficheiro e as condições para a respetiva submissão por via eletrónica para efeitos do cumprimento das obrigações de comunicação de registos prevista no n.º 1 do artigo 7.º da Lei n.º 81/2023, de 28 de dezembro (Lei 81/2023), que transpôs para o ordenamento jurídico nacional a Diretiva (UE) 2020/284 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2020, que altera a Diretiva 2006/112/CE, relativa ao sistema comum do IVA, introduzindo determinadas obrigações aplicáveis aos prestadores de serviços de pagamento.
Nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 7.º da Lei n.º 81/2023, os prestadores de serviços de pagamento estão obrigados a comunicar trimestralmente à AT os elementos dos registos definidos no artigo 6.º da referida lei até ao final do mês seguinte a cada trimestre civil a que as informações dizem respeito, utilizando formulários eletrónicos normalizados cujo conteúdo, estrutura e condições para a submissão por via eletrónica são definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças, que devem respeitar os campos e o formato definidos no Regulamento de Execução (UE) 2022/1504 da Comissão, de 6 de abril de 2022, que estabelece as regras de execução do Regulamento (UE) n.º 904/2010 do Conselho, no que respeita à criação de um sistema eletrónico central de informações sobre pagamentos (CESOP) para combater a fraude ao IVA.
NACIONALIDADE PORTUGUESA - ALTERAÇÃO DO CRITÉRIO DE CONTAGEM DO PRAZO DE RESIDÊNCIA LEGAL EM TERRITÓRIO PORTUGUÊS
Lei Orgânica n.º 1/2024, de 5 de março (DR 46, Série I, de 5 de março de 2024)
A Lei em referência procedeu à décima alteração da Lei n.º 37/81, de 3 de outubro, que aprovou a Lei da Nacionalidade (Lei da Nacionalidade) tendo alterado, designadamente, o artigo 15.º da Lei da Nacionalidade, cujo novo número 4 passou a ter a seguinte redação: "Para efeitos de contagem de prazos de residência legal previstos na presente lei, considera-se igualmente o tempo decorrido desde o momento em que foi requerido o título de residência temporária, desde que o mesmo venha a ser deferido."
Na sequência da referida alteração e para efeitos de apresentação de pedido de nacionalidade portuguesa, a contagem do prazo de residência legal em Portugal passou a ocorrer desde o momento em que foi efetuado o pedido de autorização de residência temporária em vez da data de emissão do primeiro título de residência.
A referida Lei entrou em vigor no dia 6 de março de 2024.
IVA - VERBA 2.37 DA LISTA I ANEXA AO CÓDIGO DO IVA - APARELHOS, MÁQUINAS E OUTROS EQUIPAMENTOS EXCLUSIVA OU PRINCIPALMENTE DESTINADOS À CAPTAÇÃO E APROVEITAMENTO DE FORMAS ALTERNATIVAS DE ENERGIA
Ofício-Circulado 25025, de 8 de março de 2024 - AT
A Lei n.º 82/2023, de 29 de dezembro, que aprovou o Orçamento do Estado para 2024, introduziu alterações à verba 2.37 da lista I anexa ao Código do IVA, passando a contemplar, de forma geral, os meios de produção de formas alternativas de energia, passando a aplicar-se a taxa reduzida de IVA à aquisição, transmissão e instalação, manutenção e reparação de aparelhos, máquinas e outros equipamentos destinados exclusiva ou principalmente à captação e aproveitamento de formas alternativas de energia.
No Ofício Circulado em referência, a AT veio esclarecer quais as operações abrangidas pela verba 2.37, bem como os componentes, peças e acessórios e os aparelhos, máquinas e outros equipamentos destinados exclusiva ou principalmente à captação e aproveitamento de formas alternativas de energia também enquadrados nesta aplicação da taxa reduzida de IVA.
IRS - PROGRAMA “MAIS HABITAÇÃO” - APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Ofício-Circulado 20268, de 12 de março de 2024 - AT
A Lei n.º 56/2023, de 6 de outubro, aprovou um conjunto de medidas no âmbito do programa “Mais Habitação”, tendo promovido diversas alterações, com grande impacto em sede de IRS, designadamente no apuramento e tributação dos rendimentos da categoria F.
No Ofício-Circulado em referência, a AT disponibilizou instruções sobre as alterações introduzidas e clarificou algumas dúvidas interpretativas cuja origem se baseava na ausência de normas especiais de aplicação da lei no tempo.
Em particular, relativamente às alterações introduzidas à al. e) do n.º 1 e ao n.º 2 do artigo 72.º do CIRS e à distinção efetuada pelo legislador, para efeitos de aplicação de taxa especial aos rendimentos da categoria F, entre os rendimentos prediais decorrentes de arrendamento habitacional e os restantes rendimentos prediais e à clarificação introduzida pela Lei do Orçamento do Estado para 2024, para efeitos de aplicação temporal destas alterações, a AT esclareceu que: (i) os rendimentos prediais que não resultem de arrendamento habitacional continuam sujeitos à taxa especial de 28%, sem prejuízo da opção pelo englobamento, não havendo, pois, uma alteração do regime tributário; (ii) a taxa especial de 25%, prevista no n.º 2 do artigo 72.º do Código do IRS, na redação dada pela Lei do Orçamento do Estado para 2024, aplica-se aos rendimentos de novos contratos de arrendamento habitacional celebrados a partir do dia 7 de outubro de 2023, inclusive, sendo também aplicável a rendimentos de renovações de contratos ocorridas a partir daquela data, obtidos no ano de 2023 e anos seguintes, atendendo ao facto de ser esta a lei em vigor a 31 de dezembro de 2023 e face à natureza de formação sucessiva do facto tributário; e, (iii) a taxa especial de 25% referida na alínea anterior aplica-se aos rendimentos prediais, auferidos em 2023 e em anos seguintes, relativamente a contratos de arrendamento habitacional que não beneficiem de taxa de IRS inferior pela aplicação do regime em vigor até ao dia 7 de outubro de 2023.
Já que diz respeito ao aditamento ao EBF do artigo 74.º-A, que prevê uma isenção de IRS e IRC para os rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento para habitação permanente, obtidos até 31 de dezembro de 2029, relativos à transferência de imóveis de alojamento local para arrendamento, a AT prestou os seguintes esclarecimentos: (i) a isenção de IRS e de IRC aplica-se nos casos em que ocorra a transferência de imóvel, registado e afeto a alojamento local até 31 de dezembro de 2022, para o mercado de arrendamento, mediante celebração e registo de contrato de arrendamento para habitação permanente, entre 1 de janeiro de 2023 e 31 de dezembro de 2024; (ii) a finalidade do contrato de arrendamento é aferida de acordo com o declarado pelo contribuinte no Campo 5 do Quadro I da declaração Modelo 2; iii) caso o contribuinte transfira para o mercado de arrendamento mais de um imóvel (ou partes de imóveis) anteriormente afetos a alojamento local, a isenção aplica-se aos rendimentos prediais que resultem dos contratos de arrendamento habitacionais celebrados para cada um desses imóveis (ou partes de imóveis); d) deve entender-se como “transferência” as situações em que um imóvel gerador de rendimentos, no âmbito de uma atividade de alojamento local, deixe de gerar tais rendimentos e passe a gerar rendimentos prediais decorrentes da celebração de um novo contrato de arrendamento para habitação permanente do arrendatário; e) a transferência não pressupõe a cessação da atividade da Categoria B, podendo o contribuinte manter a atividade de exploração de estabelecimentos de alojamento local, relativamente a outros imóveis; e, f) a isenção aplica-se a rendimentos prediais tributados nas Categorias F ou B.
IRS - MAIS VALIAS - VALOR DE REALIZAÇÃO - PREÇO DE VENDA SUPERIOR AO VALOR DE AVALIAÇÃO DO IMÓVEL - VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA
Acórdão de 20 de março de 2024 (Processo n.º 1087/2023) - TC
No acórdão em epígrafe, o TC julgou inconstitucional a dimensão normativa extraída do artigo 44.º, n.º 2, do Código do IRS, segundo a qual ali se estabelece uma presunção inilidível de que o valor de realização, para efeitos de tributação de mais-valias em IRS, corresponde sempre ao valor de avaliação do imóvel quando superior ao declarado pelo contribuinte.
Em traços gerais discutia-se a dimensão normativa extraída do artigo 44.º, n.º 2 do CIRS e, em particular, se a consideração de que o valor de realização deveria sempre corresponder ao valor de avaliação do imóvel quando superior ao declarado pelo contribuinte, deveria configurar uma presunção inilidível proibida pelo princípio constitucional da capacidade contributiva.
O TC decidiu que: “(...) as mais-valias decorrentes da transmissão onerosa de direitos reais sobre imóveis correspondem ao ganho obtido com essa transmissão em face do valor da aquisição anterior do mesmo bem. Ao determinar o rendimento tributável por referência a um ganho presuntivo, sem que ao contribuinte seja dada a possibilidade de demonstrar a inexistência da capacidade contributiva que se pretende tributar, incorre a norma constante do artigo 44.º, n.º 2, do CIRS - na interpretação desaplicada nos autos - em inconstitucionalidade, por ofensa do princípio da capacidade contributiva acima enunciado.”
O TC concluiu, assim, pela: “(...) inconstitucionalidade da norma contida no artigo 44.º, n.º 2, do CIRS, na interpretação segundo a qual, para efeitos da determinação dos ganhos sujeitos a IRS relativos a mais-valias decorrentes da alienação onerosa de bens imóveis, ali se estabelece uma presunção inilidível”.
IRC - REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA - LIMITAÇÃO DA APLICAÇÃO DA ISENÇÃO DA DERRAMA REGIONAL - INCONSTITUCIONALIDADE POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
Acórdão de 21 de março de 2024 (Processo 1156/2022) - TC
O TC julgou inconstitucional a norma do n.º 4 do artigo 6.º do Decreto Legislativo Regional n.º 14/2010/M, de 5 de agosto, que tratava da derrama regional aplicável à Região Autónoma da Madeira, introduzido pelo n.º 2 do artigo 16.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/2011/M, de 10 de janeiro e limitava a aplicação da isenção prevista na alínea e) do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 165/86, de 26 de junho.
Neste caso, não obstante as Regiões Autónomas disporem de poder tributário próprio e da faculdade de adaptar o sistema fiscal nacional às especificidades regionais, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, concluiu o TC que este poder tem de ser exercido nos termos de lei-quadro da AR e, ainda, que o poder de adaptação dos impostos nacionais não abrange o poder de extinguir impostos nacionais, o que vale, mutatis mutandis, para os benefícios fiscais.
Concluiu, assim, o TC que: “(...) as Regiões Autónomas, ainda que por via legislativa, não podem revogar ou derrogar impostos criados por lei, no que se refere aos seus elementos essenciais, os previstos no n.º 2 do artigo 103.º da Constituição. Mais concretamente, a criação de impostos, mas também a suspensão, revogação ou derrogação de benefícios fiscais, estão sujeitas ao princípio de reserva de lei formal, pelo que a norma do n.º 4 do artigo 6.º do Decreto Legislativo Regional n.º 14/2010/M, de 5 de agosto, introduzido pelo n.º 2 do artigo 16.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/2011/M, de 10 de janeiro, ao limitar a aplicação da isenção prevista na alínea e) do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 165/86, de 26 de junho – isto é, ao restringir os beneficiários da isenção de impostos extraordinários, em derrogação de lei da República – é formal e organicamente inconstitucional, por violação do princípio da legalidade fiscal, na vertente de reserva de lei formal, ou seja, por afronta à alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º e ao n.º 2 do artigo 103.º, ambos da Constituição da República.”.
4. Imobiliário
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO REJEITA DIREITO DE PREFERÊNCIA DO ARRENDATÁRIO COMERCIAL EM PRÉDIO NÃO CONSTITUÍDO EM PROPRIEDADE HORIZONTAL
Acórdão de 5 de fevereiro de 2024 (Processo 8156/19.2T8PRT-A.P1) – TRP
No âmbito de um processo especial para divisão de coisa comum, a Recorrente, arrendatária do prédio objeto desta ação, manifestou o seu direito de preferência através de requerimento, no dia 16 de fevereiro de 2023.
O Tribunal de Primeira Instância proferiu o despacho de 4 de maio de 2023, no qual não reconheceu o direito de preferência da Recorrente. Considera o Tribunal, desde logo, que a Recorrente não é arrendatária da totalidade do prédio, mas apenas de uma fração do mesmo. Não estando o prédio constituído em propriedade horizontal, o entendimento do Tribunal é portanto o de que a Recorrente não tem qualquer direito de preferência, já que a fração sobre a qual este direito poderia incidir não tem existência jurídica autonomizada.
Ora, a Recorrente interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto (“TRP”) em que alegou ter direito de preferência na aquisição do prédio.
O entendimento do TRP foi então o de que o direito de preferência está limitado ao “local arrendado” e não ao prédio onde se insere. Deste modo, não se reconheceu o direito de preferência da Recorrente na venda do prédio, atendendo a que a Recorrente é mera arrendatária de parte de um prédio não constituído em propriedade horizontal. Assim sendo, o recurso foi julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.
5. Laboral
ESTATUTO DOS PROFISSIONAIS DA ÁREA DA CULTURA - ALTERAÇÕES
Decreto-Lei n.º 25/2024, de 1 de abril (DR 64, Série I, de 1 de abril de 2024)
O presente Decreto-Lei procede à segunda alteração ao Estatuto dos Profissionais da Área da Cultura (“EPAC”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 105/2021, de 29 de novembro.
Em particular, destacam-se as seguintes alterações ao EPAC:
- As entidades beneficiárias da prestação de atividade cultural que disponham ou devam dispor de contabilidade organizada e que, até à data de entrada em vigor do presente Decreto-Lei, estavam obrigadas a comunicar a celebração de contratos de prestação de serviços com profissionais da área da cultura exclusivamente ao IGAC – Inspeção-Geral das Atividades Culturais, passam a estar igualmente obrigadas a comunicar este facto à Autoridade para as Condições do Trabalho;
- São atualizadas as fórmulas de cálculo do prazo de garantia para efeitos de acesso ao subsídio de suspensão da atividade cultural pelos profissionais da área da cultura;
- É reduzida a taxa contributiva relativa:
- aos profissionais da área da cultura em regime de contrato de trabalho de muito curta duração a cargo do trabalhador, de 11% para 9,3%; e
- aos trabalhadores independentes inscritos no registo dos profissionais da área da cultura (“RPAC”) e abrangidos pelo regime especial de proteção social previsto no EPAC, de 25,2% para 21,4%;
- É clarificado que as entidades beneficiárias que são apuradas como entidades contratantes (nos termos e para os efeitos previstos no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social) apenas ficam sujeitas ao pagamento da taxa contributiva enquanto entidades beneficiárias (5,1%) e não enquanto entidades contratantes (7% ou 10%, consoante a dependência económica do prestador face à entidade seja de até 80% ou superior a 80%, respetivamente);
- São excluídas expressamente do conceito de entidade beneficiária, para efeitos do EPAC, e de entidade contratante, para efeitos no Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, as entidades com atividade de mera intermediação ou gestão coletiva de direitos de autor, quando atuem exclusivamente no âmbito dessa atividade.
O presente diploma entrou em vigor no passado dia 2 de abril de 2024.
6. Público
PLANO DE AÇÃO PARA O BIOMETANO
Resolução do Conselho de Ministros n.º 41/2024, de 15 de março (DR 54, Série I, de 15 de março de 2024)
A Resolução n.º 41/2024, de 15 de março, aprovou o Plano de Ação para o Biometano (“PAB”), o qual estabelece a estratégia para o desenvolvimento do mercado do biometano em Portugal, em relação aos anos de 2024 a 2040.
O PAB prevê duas fases: uma primeira, entre 2024 e 2026, que visa a criação de um mercado de biometano em Portugal e uma segunda, entre 2026 e 2040, que tem como objetivo o reforço e a consolidação desse mesmo mercado.
Em relação à primeira fase, o PAB destaca: (i) a necessidade de se acelerar o desenvolvimento da produção de biometano, prevendo para tal, nomeadamente, a simplificação dos procedimentos de autorização e licenciamento de projetos de biometano; e (ii) a necessidade de se incentivar a produção daquele recurso, como por exemplo através de medidas de apoio financeiro.
Por sua vez, na segunda fase, o PAB realça: (i) o aumento de produção de biometano, através do desenvolvimento da base tecnológica de produção; (ii) a criação e desenvolvimento de infraestruturas centralizadas a nível regional para a produção daquele recurso e a sua injeção na rede pública; e (iii) a aposta e o reforço na investigação e inovação, nomeadamente através do reforço do financiamento nessas áreas.
Transversalmente a ambas as fases, o PAB visa garantir uma utilização sustentável do biometano, de modo a assegurar os seus benefícios enquanto gás alternativo e renovável. Para tal, destaca-se o incentivo ao uso de veículos e métodos sustentáveis para a recolha e transporte de resíduos e incorporação de digerido em campos agrícolas.
PRORROGAÇÃO - MEDIDAS EXCECIONAIS - SIMPLIFICAÇÃO DOS PROCEDIMENTOS DE PRODUÇÃO DE ENERGIA DE FONTES RENOVÁVEIS
Decreto-Lei n.º 22/2024, de 19 de março (DR 56, Série I, de 19 de março de 2024)
As medidas excecionais que visam assegurar a simplificação de procedimentos administrativos de modo a acelerar a produção de energia de fontes renováveis, aprovadas pelo Decreto-Lei n.º 30-A/2022, de 28 de abril, foram prorrogadas até 31 de dezembro de 2024, com a entrada em vigor do diploma em apreço.
GESTÃO DE RESÍDUOS - DEPOSIÇÃO DE RESÍDUOS EM ATERRO - GESTÃO DE FLUXOS ESPECÍFICOS DE RESÍDUOS
Decreto-Lei n.º 24/2024, de 26 de março (DR 61, Série I, de 26 de março de 2024)
O Decreto-Lei n.º 24/2024, de 26 de março procedeu à alteração do Regime Geral de Gestão de Resíduos (“RGGR”), do Regime Jurídico de Deposição de Resíduos em Aterro (“RJDRA”) e do Regime Unificado de Fluxos Específicos de Resíduos (“RUFER”).
Em relação às alterações ao RGGR destaca-se: (i) a alteração das responsabilidades e procedimentos de autorização de recolha complementar de resíduos, que passam a pertencer à entidade titular do sistema municipal ou multimunicipal em causa; (ii) a devolução de 30% do valor pago pelos municípios a título de Taxa de Gestão de Resíduos em determinados casos; (iii) a alteração das medidas de determinação daquela Taxa; (iv) a indexação das tarifas de resíduos à sua efetiva produção; e (v) a criação de mecanismos de compensação aos municípios quando sejam instaladas infraestruturas de tratamento de resíduos no seu território.
Já as alterações introduzidas no RJDRA, materializaram-se, essencialmente, na clarificação dos procedimentos de licenciamento, tendo sido aditados os fundamentos que motivam o indeferimento dos pedidos de licenciamento a aterros.
Finalmente, o diploma em análise alterou o RUFER no sentido de (i) regular o Sistema de Depósito e Reembolso de embalagens de bebidas não reutilizáveis; (ii) criar dois regimes de responsabilidade alargada do produtor, um deles dedicado à gestão de mobílias colocadas no mercado, colchões e respetivos resíduos e outro dedicado a resíduos de autocuidados de saúde; (iii) clarificar as obrigações dos produtores de suportar os custos necessários para cumprir as metas de gestão de resíduos; (iv) alterar as obrigações imputáveis aos produtores abrangidos pela responsabilidade alargada do produtor, designadamente quanto à composição das entidades gestoras dos sistemas integrados de gestão de resíduos.
Este diploma entrou em vigor a 27 de março de 2024, estabelecendo, contudo, regimes transitórios e a produção de efeitos de algumas normas somente a partir de 1 de janeiro de 2025.