Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português

8 junho 2024


1. Contencioso

  • Apreensão de bens e reclamação de créditos em processo de insolvência

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2. Direito Digital

  • Regime Europeu para a Identidade Digital
  • Indemnização por Danos Causados por Violação do RGPD
  • Os Modelos de “Consentimento ou Pagamento” Implementados pelas Grandes Plataformas Online

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3. Financeiro

  • Alargamento do SIRES - Sistema de Informação Relevante de Entidades Supervisionadas

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4. Fiscal

  • Contribuição Extraordinária Sobre o Setor Energético - Centros Electroprodutores com Recurso a Fontes de Energia Renováveis - Inconstitucionalidade por Violação do Princípio da Igualdade

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5. Laboral

  • Condições de Trabalho para Trabalhadores Administrativos
  • Convenção sobre a Eliminação da Violência e do Assédio no Mundo do Trabalho -  Ratificação

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6. Público

  • Regime Aplicável aos Dispositivos Médicos

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 1.  Contencioso

APREENSÃO DE BENS E RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS EM PROCESSO DE INSOLVÊNCIA

Acórdão n.º 4/2024 - (Processo 9160/15.5T8VNG-H.P3-A.S1-A) - STJ

No acórdão n.º 4/2024, o Supremo Tribunal de Justiça (“STJ”) uniformizou jurisprudência relativamente a duas questões relacionadas com a articulação entre o processo de insolvência e o processo executivo. A primeira questão consistia em saber se o produto da venda de bens penhorados em processo de execução fiscal continua a fazer parte do património do executado e, como tal, é suscetível de ser apreendido para a respetiva massa insolvente, não obstante o facto de, no processo de execução fiscal, já ter sido proferida sentença de verificação e graduação de créditos transitada em julgado. A segunda questão consistia em saber se o titular de um crédito reconhecido e graduado por sentença transitada em julgado no âmbito de um processo de execução fiscal, entretanto apensado ao processo de insolvência do executado, está ou não dispensado de reclamar os seus créditos novamente.

Para responder à primeira questão, o STJ invocou o n.º 2 do artigo 149.º do CIRE, o qual preceitua o seguinte: “se os bens já tiverem sido vendidos, a apreensão tem por objeto o produto da venda, caso este ainda não tenha sido pago aos credores ou entre eles repartido”.

O STJ decidiu que não basta ter sido proferida sentença de verificação e graduação de créditos no âmbito de um processo de execução, mesmo que transitada em julgado, para que o produto da venda se considere “pago aos credores ou entre eles repartido”. Para este efeito, é necessário que o produto da venda tenha sido efetivamente entregue aos credores. Até este momento, o produto da venda continua a integrar o património do devedor, sendo, por isso, suscetível de apreensão para a massa insolvente deste último.

Assim sendo, o STJ uniformizou jurisprudência no sentido de que “o produto da venda dos bens penhorados em processo de execução, no qual tenha sido proferida sentença de verificação e graduação de créditos, com trânsito em julgado, só é de considerar pago ou repartido entre os credores, para os efeitos do artigo 149.º, n.º 2, do CIRE, com respetiva entrega”.

Quanto à segunda questão, o STJ decidiu que, atento o disposto no artigo 90.º do CIRE e nos n.º 1 e 5 do artigo 128.º do mesmo diploma, o titular de um crédito sobre o devedor continua a ter o ónus de reclamá-lo no respetivo processo de insolvência, independentemente do facto de esse crédito já ter sido reconhecido no âmbito de um processo executivo, por sentença de verificação e graduação transitada em julgado, e de o processo executivo estar apensado ao processo de insolvência.

Deste modo, o STJ uniformizou jurisprudência no sentido de que “o titular de um crédito reconhecido e graduado por sentença transitada em julgado num processo de execução fiscal, apensado ao processo de insolvência do devedor/executado, não está dispensado de reclamar o seu crédito, no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento”.

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2. Direito Digital

REGIME EUROPEU PARA A IDENTIDADE DIGITAL

Regulamento (UE) n.º 2024/1183, de 11 de abril de 2024 (Jornal Oficial da União Europeia, Série L, de 30 de abril de 2024)

O Regulamento (UE) n.º 2024/1183 do Parlamento Europeu e do Conselho, que altera o Regulamento (UE) n.º 910/2014 no respeitante à criação do Regime Europeu para a Identidade Digital (o “Regulamento”), vem estabelecer condições harmonizadas para a criação de um regime para as carteiras europeias de identidade digital a fornecer pelos Estados-Membros.

A principal alteração apresentada pelo Regulamento consiste na criação de carteiras europeias de identidade digital, que permitirão aos cidadãos, residentes e empresas da União Europeia que pretendam identificar-se ou comprovar determinados dados pessoais, gerir e validar de forma segura os seus dados de identificação pessoal e certificados eletrónicos. Ou seja, possibilita que os utentes se identifiquem e autentiquem, online e offline, por via eletrónica, além fronteiras, para aceder a um vasto leque de serviços públicos e privados.

Estas funcionalidades serão disponibilizadas de forma gratuita quando não utilizadas para fins profissionais.

O Regulamento estabelece vários requisitos aplicáveis a estes mecanismos, a fim de alcançar um elevado nível de segurança e confiança. Para este efeito, cada Estado-Membro designará um organismo competente para a avaliação de conformidade, que deverá, desde logo, certificar as carteiras.

O Regulamento entra em vigor no dia 1 de maio de 2024 e será plenamente aplicado até 2026.

INDEMNIZAÇÃO POR DANOS CAUSADOS POR VIOLAÇÃO DO RGPD

Acórdão de 11 de abril de 2024 (processo C-741/21) - TJUE

O acórdão do TJUE, de 11 de abril de 2024, foi proferido no seguimento de um pedido de decisão prejudicial que teve por objeto a interpretação do artigo 82.º, n.os 1 e 3, do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD” ou “Regulamento”), lido em conjugação com os artigos 29.º e 83.º, bem como os Considerandos 85 e 146 desse mesmo Regulamento.

O processo principal refere-se a um litígio que opõe um advogado (“GP”) a uma sociedade alemã que explora uma base de dados jurídica (“Juris GmbH”), a respeito de uma indemnização por danos (ao abrigo do artigo 82.º do RGPD) que GP alega ter sofrido na decorrência de vários tratamentos dos seus dados pessoais realizados pela Juris GmbH, para efeitos de publicidade, apesar de GP se ter oposto aos referidos tratamentos. Após ter revogado por escrito todos os seus consentimentos, verificou que os seus dados continuaram a ser tratados para efeitos de publicidade direta, tendo recebido, por exemplo, folhetos publicitários que lhe foram pessoalmente dirigidos para o endereço do seu escritório. Deste modo, considera ter sofrido um “dano imaterial”, em resultado da perda de controlo sobre os seus dados pessoais, pelo que pretende obter uma indemnização a esse título sem ter de demonstrar os efeitos ou a gravidade da violação dos seus direitos.

A Juris GmbH, por sua vez, nega qualquer responsabilidade, alegando que um dos seus trabalhadores não respeitou as instruções que lhe tinham sido transmitidas e que a simples violação de uma obrigação decorrente do RGPD não configura, por si só, um “dano”, na aceção do artigo 82.º do RGPD.

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio colocou quatro questões prejudiciais ao TJUE, a saber: (i) se o conceito de “danos imateriais” a que se refere o artigo 82.º, n.º 1 do RGPD deve ser interpretado no sentido de que abrange qualquer violação da posição jurídica protegida, independentemente dos seus outros efeitos e da sua gravidade; (ii) se a responsabilidade pela indemnização dos danos fica excluída, em aplicação do artigo 82.º, n.º 3 do RGPD, pelo facto de a violação dos direitos se ter devido a um erro humano, no caso concreto, de uma pessoa que agiu sob a autoridade do responsável pelo tratamento, nos termos do artigo 29.º do RGPD; (iii) se é permitido ou exigível que a quantificação da indemnização dos danos imateriais tenha como fundamento os critérios de avaliação mencionados no artigo 83.º do RGPD, em especial nos seus n. n.os 2 e 5; e (iv) se deve a indemnização ser determinada em relação a cada infração individual ou devem várias infrações – pelo menos várias infrações similares – ser sancionadas com uma indemnização global, não determinada pela adição de montantes individuais, mas baseada numa avaliação global.

Quanto à primeira questão, responde o TJUE que o referido artigo deve ser interpretado no sentido de que uma violação de disposições do RGPD que conferem direitos ao titular de dados, não basta, por si só, para constituir um “dano imaterial”, na aceção desta disposição, independentemente do grau de gravidade do dano sofrido por esse titular. O titular dos dados deve provar que sofreu efetivamente um dano, material ou imaterial, e a existência de um nexo de causalidade entre a violação e esse dano.

No que toca à segunda questão, a norma em causa deve ser interpretada no sentido de que não basta ao responsável pelo tratamento, para ficar isento da sua responsabilidade, ao abrigo do n.º 3 do artigo 82.º, invocar que o dano em causa foi provocado pela falha de uma pessoa que atua sob a sua autoridade, na aceção do artigo 29.º do RGPD. Por conseguinte, o referido responsável só pode beneficiar desta isenção se provar que não existe um nexo de causalidade entre qualquer violação da sua obrigação de proteção de dados, que lhe incumbe por força dos artigos 5.º, 24.º e 32.º do RGPD, e o dano sofrido pela pessoa em causa.

Por fim, as duas últimas questões foram examinadas e respondidas em conjunto. O TJUE esclareceu que o artigo 82.º, n.º 1 do RGPD deve ser interpretado no sentido de que, para determinar o montante da indemnização devida a título de reparação de danos, com base nesta disposição, não há que, por um lado, aplicar mutatis mutandis os critérios de fixação do montante das coimas previstas no artigo 83.º do RGPD, e, por outro, ter em conta o facto de várias violações do referido regulamento relativas a uma mesma operação de tratamento afetarem a pessoa que pede reparação. O TJUE recordou que o artigo 82.º do RGPD não tem uma função punitiva mas compensatória e que o montante da indemnização deve ser fixado de acordo com as normas internas de cada Estado-Membro, respeitando os princípios da efetividade e da equivalência do direito da União, tendo em conta o prejuízo concretamente sofrido pela pessoa em causa.

OS MODELOS DE “CONSENTIMENTO OU PAGAMENTO” IMPLEMENTADOS PELAS GRANDES PLATAFORMAS ONLINE

Opinião 08/2024 do Comité Europeu para a Proteção de Dados, adotada a 17 de abril de 2024

Na sequência de um pedido apresentado pelas autoridades de proteção de dados dos Países Baixos, da Noruega e da Alemanha, o Comité Europeu para a Proteção de Dados (“CEPD”) emitiu a presente opinião sobre a validade do consentimento para o tratamento de dados pessoais para efeitos de publicidade comportamental no contexto de modelos de “consentimento ou pagamento” utilizados pelas grandes plataformas online (a “Opinião”).

Os modelos de “consentimento ou pagamento” são definidos como modelos em que o responsável pelo tratamento (as grandes plataformas online) oferece aos titulares dos dados uma escolha entre, pelo menos, duas opções, para ter acesso a um serviço online por si fornecido. Por um lado, o titular dos dados pode consentir no tratamento dos seus dados pessoais para uma finalidade específica – neste caso, o tratamento de dados pessoais para fins de publicidade comportamental. Por outro lado, pode decidir pagar uma quantia para ter acesso a esse mesmo serviço sem que os seus dados pessoais sejam objeto de tratamento para essa finalidade.

Na publicidade comportamental, os utilizadores recebem publicidade personalizada com base em diferentes critérios e técnicas, incluindo com base em informação relacionada com os seus comportamentos online e offline. Estes mecanismos têm-se tornado cada vez mais significativos e sofisticados, o que se demonstra preocupante, considerando que fornece aos responsáveis pelo tratamento uma visão muito detalhada da vida pessoal dos indivíduos.

No contexto da Opinião, “grandes plataformas online” são, nomeadamente, aquelas que atraem uma grande quantidade de titulares de dados como seus utilizadores, que têm uma posição relevante no mercado e que realizam operações de tratamento de grande escala.

Os princípios estabelecidos no Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”) devem ser cumpridos, em especial, os relacionados com o consentimento válido. A posição do CEPD é de que, na maioria dos casos, não será possível, às grandes plataformas online, cumprir os requisitos para o consentimento válido se confrontarem os utilizadores com uma escolha binária entre consentimento para o tratamento de dados pessoais para fins de marketing comportamental e o pagamento de uma taxa.

O CEPD relembra que os dados pessoais não podem ser considerados uma mercadoria transacionável, e que o direito fundamental à proteção de dados pessoais não pode ser transformado numa funcionalidade pela qual os titulares dos dados têm de pagar. Neste sentido, a oferta de apenas uma alternativa paga aos serviços que envolvem o tratamento de dados pessoais para fins de publicidade comportamental não deve constituir o caminho por defeito para os responsáveis pelo tratamento. Assim, as grandes plataformas devem oferecer o que o CEPD designa como uma “alternativa equivalente”, que não implique o pagamento de uma taxa. Se, pelo contrário, optarem por cobrar uma taxa, devem considerar a oferta de uma alternativa adicional livre de quaisquer custos. Esta alternativa deve garantir, em geral, que (i) o responsável pelo tratamento não pode tratar dados pessoais para a finalidade de marketing comportamental; (ii) a versão alternativa não apresenta uma qualidade diferente e nenhuma funcionalidade está bloqueada; e (iii) apresenta os mesmos elementos e funções que a versão com publicidade comportamental.

O CEPD conclui que o consentimento recolhido pelas grandes plataformas online, no contexto de modelos de consentimento ou pagamento, só será considerado válido na medida em que essas plataformas consigam demonstrar que, em linha com o princípio da responsabilidade, todos os requisitos para o consentimento válido estão cumpridos. Por exemplo, qualquer taxa cobrada não pode fazer com que as pessoas se sintam obrigadas a dar o seu consentimento, devendo as grandes plataformas online avaliar, caso a caso, se existe um desequilíbrio de poder entre o utilizador e o responsável pelo tratamento.

Por fim, o CEPD relembra que obter consentimento não absolve as grandes plataformas de cumprir com todas as outras regras e princípios estabelecidos no RGPD, nomeadamente os elencados no artigo 5.º, sendo de particular relevância os seguintes: lealdade, limitação das finalidades, minimização dos dados, responsabilidade e a proteção de dados desde a conceção e por defeito.

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3. Financeiro

ALARGAMENTO DO SIRES - SISTEMA DE INFORMAÇÃO RELEVANTE DE ENTIDADES SUPERVISIONADAS

Instrução n.º 5/2024 - BdP

A Instrução do Bdp n.º 5/2024 (a “Instrução”) vem alterar a Instrução n.º 11/2023 (a “Instrução SIRES”), relativa ao enquadramento jurídico do Sistema de Informação Relevante de Entidades Supervisionadas (o “SIRES”), o qual veio permitir a tramitação uniforme dos procedimentos de autorização, não-oposição, comunicação e registo junto do Banco de Portugal.

Concretamente, o SIRES é um serviço do Sistema BPnet, sendo que era através deste que, anteriormente, as entidades contempladas no artigo 2.º da Instrução SIRES acediam a este serviço. As entidades em causa eram: (i) instituições de crédito com sede em Portugal; (ii) sociedades financeiras com sede em Portugal; (iii) instituições de moeda eletrónica com sede em Portugal; (iv) instituições de pagamento com sede em Portugal; (v) entidades referidas nas alíneas anteriores com sede em Estados-Membros da União Europeia quando estiverem estabelecidas em Portugal sob forma de sucursal; (vi) entidades referidas referidas nas alíneas (i) a (iii) com sede em países terceiros quando estiverem estabelecidas em Portugal; e (vii) entidades sujeitas a supervisão do Banco de Portugal, nos termos do artigo 117.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e das Sociedades Financeiras.

Ora, o objetivo da Instrução é, precisamente, alargar o âmbito subjetivo da Instrução SIRES, ao possibilitar o seu acesso e a sua utilização por outras pessoas, sejam singulares ou coletivas. É importante notar que este alargamento já era contemplado no preâmbulo da Instrução SIRES, onde era afirmado que: “[o] SIRES é um serviço que ficará disponível no Sistema BPnet, bem como, em momento posterior, na área de empresa no site institucional do Banco de Portugal, e será utilizado quer pelas entidades obrigadas a aderir ao mesmo, quer por outras pessoas, singulares e coletivas, que pretendam submeter, por esta via, junto do Banco de Portugal um dos procedimentos de autorização, não oposição, comunicação e registo elencados na presente Instrução”.

Como tal, a Instrução apenas reflete uma funcionalidade técnica implementada pelo Banco de Portugal que disponibiliza o SIRES na área de empresa do seu site institucional e que possibilita a realização e pedidos e comunicações por pessoas singulares ou coletivas que não estejam sujeitas à sua supervisão. Neste sentido, a Instrução não altera o âmbito subjetivo obrigatório da Instrução SIRES, nem o leque de procedimentos que podem ser tramitados através de tal sistema; apenas abre a possibilidade da sua utilização por pessoas não-obrigadas. Portanto, a não-subscrição do SIRES por parte das pessoas que, por virtude da Instrução, agora podem subscrever ao mesmo, não tem qualquer impacto na tramitação de que estes sejam ou possam vir a ser parte junto do BdP.

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4. Fiscal

CONTRIBUIÇÃO EXTRAORDINÁRIA SOBRE O SETOR ENERGÉTICO - CENTROS ELECTROPRODUTORES COM RECURSO A FONTES DE ENERGIA RENOVÁVEIS - INCONSTITUCIONALIDADE POR VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE

Acórdão n.º 338/2024 (de 23 de abril de 2024) - Processo 987/2023 - TC

No Acórdão em referência, o Tribunal Constitucional foi chamado a pronunciar-se sobre a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 2.º, alínea b), do regime jurídico da CESE (aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro), cuja vigência foi prorrogada para o ano de 2019 pelo artigo 313.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, na parte em que determina a incidência subjetiva deste tributo sobre os centros electroprodutores com recurso a fontes de energia renováveis, por violação do princípio da igualdade, constitucionalmente consagrado no artigo 13.º da CRP.

O TC já havia tomado posição sobre a inconstitucionalidade do Regime Jurídico da CESE mas foi a primeira vez que se pronunciou sobre a inconstitucionalidade do referido regime, quando aplicado aos centros electroprodutores com recurso a fontes de energia renováveis.

Em particular, no acórdão n.º 101/2023,o TC considerou que: “(...) a partir de 2018 (...) tornou-se evidente que, por imposição legal, a maior parcela da receita se destinaria (...) a reduzir a dívida tarifária do setor elétrico, sem que sejam claras as razões pelas quais o legislador teve por adequado exigir a operadores não integrados nesse subsetor que participassem nos encargos daí advenientes, quando lhes não deram causa alguma, nem se vê que daí extraiam um especial benefício.” e, bem assim, que o “(...)  regime não define critérios que imponham que uma parte relevante da receita da CESE se mantenha afeta ao financiamento de medidas tendentes a favorecer os interesses de todos os operadores económicos incluídos no seu âmbito de incidência subjetiva (e não isentos). Pelo contrário, na prática, é confiada ao Governo a possibilidade de, em função dos «objetivos que se revelem mais prementes», afetar toda a receita da CESE à redução da dívida tarifária do setor elétrico – ou seja, ao financiamento de prestações públicas de que os operadores do setor do gás natural não podem, como se viu, presumir-se causadores ou beneficiários.”

Inicialmente aplicável a operadores do setor do gás natural, o juízo de inconstitucionalidade do Tribunal Constitucional foi posteriormente reproduzido no Acórdão n.º 196/2024 do TC, quando aplicado a empresas comercializadoras de petróleo bruto e de produtos de petróleo, pelos mesmos fundamentos. Por sua vez, no Acórdão n.º 338/2024, em análise, o TC veio reiterar o juízo de inconstitucionalidade do regime da CESE, alargando-o agora aos sujeitos titulares de centros eletroprodutores com recurso a fonte renovável.

No referido acórdão, o TC afirma que não existe qualquer motivo para fazer correr por conta das empresas detentoras de centros electroprodutores com recurso a fonte renovável os encargos atinentes à redução da dívida tarifária do setor elétrico, na medida em que a dívida tarifária do setor elétrico não foi provocada por estas empresas, nem a redução da dívida beneficia tais empresas, inexistindo, por conseguinte, qualquer relação entre a contribuição e a prestação genérica e presumida.

Foi neste contexto e com o referido fundamento que o TC decidiu que a CESE não pode ser qualificada como uma contribuição financeira, devendo antes ser enquadrada como um imposto, tendo, em resultado de tal entendimento, julgado inconstitucional “(...) a norma contida no artigo 2.º, alínea b), do regime jurídico da CESE (aprovado pelo artigo 228.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro), cuja vigência foi prorrogada para o ano de 2019 pelo artigo 313.º da Lei n.º 71/2018, de 31 de dezembro, na parte em que determina que o tributo incide sobre o valor dos elementos do ativo a que se refere o n.º 1 do artigo 3.º, de sujeitos titulares de centros eletroprodutores com recurso a fonte renovável (...)” e julgar procedente o recurso apresentado no que respeita à inconstitucionalidade da referida norma, por violação do princípio da igualdade, na parte em que se considera este tributo aplicável aos centros electroprodutores com recurso a fonte renovável.

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5. Laboral

CONDIÇÕES DE TRABALHO PARA TRABALHADORES ADMINISTRATIVOS

Portaria n.º 128/2024/1, de 2 de abril (DR 65, Série I, de 2 de abril de 2024)

A Portaria n.º 128/2024/1, de 2 de abril,veio atualizar (em cerca de 8%), com efeitos retroativos a 1 de março de 2024, os valores das retribuições mínimas mensais previstos na Portaria n.º 182/2018, de 22 de junho, que regula as condições de trabalho para trabalhadores administrativos não abrangidos por regulamentação coletiva específica, procedendo assim à sexta alteração deste diploma.

CONVENÇÃO SOBRE A ELIMINAÇÃO DA VIOLÊNCIA E DO ASSÉDIO NO MUNDO DO TRABALHO - RATIFICAÇÃO

Aviso n.º 23/2024/1 (DR 77, Série I, de 18 de abril de 2024)

Através do Aviso n.º 23/2024/1, de 18 de abril, foi tornado público que a República Portuguesa depositou o seu instrumento de ratificação da Convenção n.º 190, sobre a eliminação da violência e do assédio no mundo do trabalho (a “Convenção”), adotada pela Conferência Geral da Organização Internacional do Trabalho, na sua 108.ª sessão, realizada em Genebra, a 21 de junho de 2019.

A Convenção define a violência e o assédio no mundo do trabalho como o conjunto de comportamentos e práticas inaceitáveis, ou de ameaças, de ocorrência única ou repetida, que visem, causem, ou sejam suscetíveis de causar dano físico, psicológico, sexual ou económico, e inclui a violência e o assédio com base no género.

A Convenção é aplicável a trabalhadores e pessoas relacionadas com o mundo do trabalho (e.g., estagiários, voluntários, candidatos a emprego, etc.) e estabelece um conjunto de princípios, medidas e obrigações para os países membros que a ratifiquem, assim como respetivos empregadores e trabalhadores, com vista a prevenir e eliminar a violência e o assédio no mundo do trabalho, de forma inclusiva, integrada e sensível ao género.

Entre outras medidas, os países membros que ratifiquem a Convenção deverão, de acordo com a legislação e as circunstâncias nacionais e em consulta com as estruturas representativas de empregadores e de trabalhadores, adotar leis e regulamentos que imponham aos empregadores a adoção de medidas adequadas e proporcionais ao seu grau de controlo para prevenir a violência e o assédio no mundo do trabalho.

Além do local do trabalho, a Convenção é ainda aplicável à violência e ao assédio que ocorram (i) nos locais onde o trabalhador é remunerado, descansa, toma refeições, ou usa as instalações sanitárias, de lavagem ou vestiários; (ii) durante deslocações, viagens, formações, eventos ou atividades sociais relacionadas com o trabalho; (iii) através de comunicações relacionadas com o trabalho, incluindo as efetuadas através de tecnologias de informação e comunicação; (iv) em alojamentos fornecidos pelo empregador; e (v) durante o trajeto entre o domicílio e o local de trabalho.

Em Portugal, a Convenção entrará em vigor a 16 de fevereiro de 2025, 12 meses após a data do registo da ratificação.

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6. Público

REGIME APLICÁVEL AOS DISPOSITIVOS MÉDICOS

Decreto-Lei n.º 29/2024, de 5 de abril (DR 68, Série I, de 5 de abril de 2024)

Foi publicado o Decreto-Lei n.º 29/2024, de 5 de abril, que visa assegurar a execução, na ordem jurídica interna, do Regulamento (UE) 2017/745 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2017, relativo aos dispositivos médicos (o “Decreto-Lei”).

O Decreto-Lei estabelece um conjunto de regras aplicáveis à fiscalização do mercado e à conformidade dos produtos, fixando as disposições a que deve obedecer o setor dos dispositivos médicos, nomeadamente as regras aplicáveis aos operadores económicos, às instituições de saúde que fabricam e utilizam dispositivos nas respetivas instalações, bem como as regras aplicáveis à utilização e rastreabilidade dos dispositivos, à designação e supervisão das atividades dos organismos notificados, vigilância e fiscalização do mercado e, ainda, as sanções aplicáveis ao incumprimento das respetivas disposições.

O diploma define, ainda, as condições e requisitos a que devem obedecer o reprocessamento e a utilização de dispositivos de uso único reprocessados em território nacional.

O Decreto-Lei prevê um regime transitório que mantém temporariamente em vigor algumas normas do Decreto-Lei n.º 145/2009, de 17 de junho (“Decreto-Lei 145/2009”). Assim, até à implementação e respetiva operacionalização da EUDAMED, a base de dados europeia de dispositivos médicos, os fabricantes, mandatários, distribuidores ou organismos notificados devem garantir o cumprimento das obrigações de notificação e registo que se lhes são aplicadas em território nacional, nos seguintes termos:

  • Ao fabricante e mandatário são aplicáveis os artigos 9.º (procedimento para esterilização), 10.º (procedimento especial para sistemas e conjuntos para intervenções) e os n.os 1, 2, 3 e 5 do artigo 11.º (deveres inerentes à colocação no mercado) do Decreto-Lei 145/2009;
  • Ao distribuidor é aplicável o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 41.º (obrigações do distribuidor) do Decreto-Lei 145/2009;
  • Ao distribuidor por grosso é ainda aplicável, com as necessárias adaptações, o disposto na Portaria n.º 256/2016, de 28 de setembro (boas práticas de distribuição de dispositivos médicos).

Por fim, o legislador prevê um regime de transitoriedade até à publicação de dois outros diplomas:

  • Um novo ato legislativo relativo à publicidade dos dispositivos médicos, mantendo-se em vigor, até à sua publicação, o regime de publicidade previsto no DL 145/2009;
  • Um ato legislativo que assegure a execução, na ordem jurídica interna, do Regulamento (UE) 2017/746, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2017, relativo aos dispositivos médicos para diagnóstico in vitro, mantendo-se em vigor, quanto a este tema, as disposições constantes dos artigos 66.º, 67.º e 68.º do Decreto-Lei 145/2009.

O presente diploma entrou em vigor no dia 6 de abril de 2024 e produzirá efeitos 90 dias após a sua publicação.

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