Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português

1 de julho de 2025


1. Contencioso Civil e Penal

  • Possibilidade de Dispensa do Depósito do Valor Integral do Valor das Notas Justificativas
  • Prazo de Prescrição de Crime de Fraude Fiscal Qualificada, com Utilização de Faturas Fraudulentas

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2. Concorrência

  • TJUE - Distribuição exclusiva – Beevers Kaas
  • CE - Auxílios de Estado - Novas regras em matéria ambiental

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3. Financeiro

  • Alterações às IFRS 7 E IFRS 9
  • Participação Portuguesa no Invest-EU
  • Cálculo de Provisões Técnicas e Fundos Próprios

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4. Laboral

  • Lei Aplicável ao Contrato de Trabalho – Subsídio de Férias e de Natal
  • Assédio Moral – Poder de Direção do Empregador

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5. Público

  • Sistema Nacional de Gás – Mercado dos Gases de Origem Renovável ou de Baixo Teor de Carbono
  • Regime Geral da Gestão de Resíduos – Responsabilidade Alargada do Produtor 

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1. Contencioso Civil e Penal

POSSIBILIDADE DE DISPENSA DO DEPÓSITO DO VALOR INTEGRAL DO VALOR DAS NOTAS JUSTIFICATIVAS

Acórdão n.º 269/2025, de 5 de maio (DR 85, Série I, de 5 de maio de 2025) - TC

O TC declarou a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma contida no n.º 2 do artigo 26.º- A do Regulamento das Custas Processuais, aditada pela Lei n.º 27/2019, de 28 de março, na interpretação segundo a qual o tribunal não pode dispensar o depósito do valor integral do valor das notas justificativas de custas de parte quando o considere excessivamente oneroso ou arbitrário.

A fiscalização abstrata e sucessiva de constitucionalidade foi requerida pelo Ministério Público, com base no facto de tal interpretação da norma ter sido previamente julgada inconstitucional, pelo Tribunal Constitucional, em três casos concretos: Acórdãos n.º 602/2023, da 2.ª Secção, n.º 153/2022 da 3.ª Secção, e  n.º 446/2023, da 3.ª Secção.

As custas de parte compreendem as despesas que cada parte suportou com o processo, tais como as taxas de justiça pagas, os encargos efetivamente suportados, as remunerações e despesas do agente de execução, e parte dos honorários e despesas do mandatário.

Quando a parte vencida pretende contestar o valor das custas de parte apresentado pela parte vencedora, deve apresentar reclamação no prazo de 10 dias. A apreciação desta reclamação depende do depósito prévio do valor integral da nota discriminativa e justificativa impugnada.

Contudo, quando o valor das custas de parte apresentado pela parte vencedora é excessivamente oneroso ou arbitrário, a obrigação de proceder ao depósito integral desse valor para apresentar reclamação pode representar um verdadeiro impedimento a este meio de tutela da parte vencida.

De acordo com o TC, a inexistência da faculdade do juiz dispensar o reclamante de proceder ao depósito como condição de acesso à tutela jurisdicional apenas seria constitucionalmente admissível se os "mecanismos de controlo interno” assegurassem que aquele valor não fosse imprevisível ou excessivo.

Deste modo, reitera-se a jurisprudência segundo a qual o direito de acesso aos tribunais não implica a gratuidade da justiça, mas impede a fixação de custos excessivamente onerosos que inibam o direito constitucional de acesso à justiça.

Com esta decisão, os tribunais podem, doravante, dispensar o depósito integral do valor das notas justificativas de custas de parte quando considerem os valores manifestamente excessivos ou arbitrários, garantindo assim o efetivo acesso à justiça.

PRAZO DE PRESCRIÇÃO DE CRIME DE FRAUDE FISCAL QUALIFICADA, COM UTILIZAÇÃO DE FATURAS FRAUDULENTAS

Acórdão n.º 5/2025, de 12 de maio (DR 85, Série I, de 12 de maio de 2025) - STJ

O Acórdão de fixação de jurisprudência do STJ determinou que o prazo de prescrição pelo crime de fraude fiscal qualificada, previsto e punido no artigo 104.º, n.º2, al. a) do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), com utilização de faturas fraudulentas (as designadas “faturas falsas”) se inicia no momento da entrega da correspondente declaração à administração fiscal.

No âmbito do processo 92/07.1TELSB-M.S.1, o arguido interpôs o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência, alegando que o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no dia 6 de dezembro de 2022, em que é parte vencida (acórdão-recorrido), se encontra em oposição com outro acórdão proferido pelo mesmo tribunal no dia 8 de março de 2017, no âmbito do processo 1596/03.0JFLSB.L1 (acórdão-fundamento).

Por considerar que o acórdão-recorrido e o acórdão-fundamento se pronunciam em sentidos opostos, de modo expresso e a partir de situações de facto idênticas, vem pedir ao tribunal que se pronuncie sobre a questão de saber, no crime de fraude fiscal por emissão de faturas falsas, qual o momento temporal em que se inicia a contagem do prazo prescricional.

Por um lado, o acórdão-fundamento decidiu que o crime apenas se considera consumado na ocasião de emissão da fatura falsa, independentemente de ter havido, ou não, declaração do contribuinte.

Por outro lado, segundo o acórdão-recorrido a consumação ocorre no momento em que a declaração fiscal é entregue à Autoridade Tributária, por ser aí que a conduta se torna apta a causar a diminuição de receitas tributárias.

O STJ considerou que, não sendo entregue a declaração fiscal, a fatura falsa não pode ser considerada, por si mesma, um meio adequado a colocar em perigo o bem jurídico protegido, qual seja o património fiscal do Estado.

Para além disto, o STJ considerou que o tipo legal de fraude fiscal qualificada exige que as faturas fraudulentas sejam efetivamente utilizadas, porquanto a alínea a) do número 2 do artigo 104.º do RGIT refere que “A fraude tiver lugar mediante a utilização de faturas (...)”.

Deste modo, o STJ fixou jurisprudência no sentido de que a consumação do crime de fraude fiscal, com recurso à utilização de faturas fraudulentas, ocorre na data de entrega da declaração na administração fiscal ou no termo do prazo para o fazer, momento apto a relevar para efeitos de cômputo do prazo de prescrição do respetivo procedimento criminal.

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2. Concorrência

TJUE CLARIFICA AS REGRAS RELATIVAS À DISTRIBUIÇÃO EXCLUSIVA E ÀS VENDAS ATIVAS NO ACÓRDÃO BEEVERS KAAS

Acórdão de 8 de maio de 2025 (C-581/23 – Beevers Kaas) - TJUE

Em 8 de maio de 2025, o TJUE proferiu um Acórdão no Processo Beevers Kaas, relativo a um reenvio prejudicial do Tribunal de Recurso de Antuérpia (Bélgica), cujo objeto corresponde à apreciação, no quadro das normas de concorrência, de obrigações de exclusividade territorial em acordos de distribuição vertical e, particular, das condições para beneficiar da isenção por categoria prevista no artigo 4.º, alínea b), i), do Regulamento (UE) n.º 330/2010 (Regulamento de isenção por categoria vertical).

Desde 1993 que a Beevers Kaas é distribuidora exclusiva do queijo Beemster na Bélgica, fornecido pela cooperativa de produtores de laticínios Cono. A Albert Heijn, uma cadeia de supermercados holandesa com atividade na Bélgica e na Holanda, adquire o referido produto à Cono, mas para distribuição em mercados fora da Bélgica.

O litígio surgiu quando a Albert Heijn começou a vender queijo Beemster na Bélgica (ou seja, no território exclusivo da Beevers Kaas). A Beevers Kass iniciou uma ação judicial alegando que as vendas de queijo Beemster pela Albert Heijn na Bélgica violavam os seus direitos de distribuição exclusiva. A Albert Heijn contra-argumentou que não estava vinculada ao acordo de exclusividade entre a Beevers Kaas e a Cono, uma vez que o acordo de distribuição com a Cono não incluía uma proibição de vendas ativas aos demais distribuidores, não havia uma imposição paralela da respetiva obrigação.

Em julho de 2021, o Tribunal Comercial de Antuérpia recusou o pedido da Beevers Kass, entendendo que nenhuma disposição contratual ou normativa impedia a Albert Heijn de adquirir diretamente o produto ao fornecedor, comercializando-o na Bélgica. A Beevers Kaas recorreu desta decisão para o Tribunal de Recurso de Antuérpia, que solicitou esclarecimentos ao TJUE sobre se, quando um fornecedor atribui um território exclusivo a um distribuidor, basta demonstrar que outros distribuidores não vendem ativamente nesse território para estabelecer um acordo que proíbe tais vendas.

O TJUE concluiu que, para se considerar preenchida a condição da imposição paralela, não basta a mera inexistência de vendas ativas por parte dos restantes compradores; é imprescindível demonstrar, através de prova direta ou de indícios objetivos, que o fornecedor convidou expressa ou tacitamente esses compradores a respeitar o território exclusivo e que estes, de facto, aceitaram tal convite. Em consequência, a simples ausência de vendas ativas não comprova, por si só, a existência de um acordo que impeça essas vendas, impondo-se demonstrar de modo efetivo que os distribuidores noutros territórios estão sujeitos à referida proibição. O benefício da isenção por categoria só será válido pelo período em que subsistir a prova de que todos os compradores aceitaram não realizar vendas ativas no território exclusivo.

Para obter informações adicionais acerca deste Acórdão, pode consultar Client Briefing.

A CE ADOTA NOVAS REGRAS QUE PERMITEM A ONG DESENCADEAR A REVISÃO DE DECISÕES RELATIVAS A AUXÍLIOS ESTATAIS POR MOTIVOS AMBIENTAIS

Comunicado de Imprensa de 12 de maio de 2025, CE

Em 12 de maio de 2025, na sequência de uma consulta pública às partes interessadas, e através da revisão do Regulamento (CE) n.º 794/2004 relativo aos auxílios estatais e do Código de Boas Práticas em matéria de auxílios estatais, a CE adotou novas regras que permitem a organizações não-governamentais (“ONG”) requerer a revisão de determinadas decisões de autorização de auxílios de Estado por parte da CE, quando estas possam infringir normas ambientais da UE.

Essa alteração foi motivada pela necessidade de alinhar as normas de auxílios de Estado às obrigações internacionais em matéria de acesso à justiça ambiental, previstas na Convenção de Aarhus[1].

De acordo com as novas regras, as ONG devem demonstrar ser independentes, sem fins lucrativos, ativas em questões ambientais e apresentar evidências de que a atividade beneficiada pelos recursos estatais ou o próprio auxílio estatal infringe disposições específicas do direito ambiental da UE.

Nestes termos a Comissão passa a disponibilizar um mecanismo interno de revisão que abrange decisões finais de compatibilidade de um auxílio com o mercado interno e não se aplica a auxílios de caráter social, a situações de catástrofes naturais ou ocorrências excecionais, nem a medidas de auxílio adotadas para enfrentar perturbações graves na economia de um Estado-Membro.

Em termos de prazos, as ONG têm até oito semanas, a contar da publicação da decisão no Jornal Oficial da União Europeia, para apresentar o respetivo pedido, enquanto a Comissão dispõe de 16 semanas (podendo chegar a 22 em casos justificados) para responder. A decisão sobre os auxílios estatais em causa permanece em vigor durante a análise, mas, caso a Comissão conclua que o auxílio estatal viola as normas ambientais, pode revogar a aprovação e até mesmo exigir a devolução do auxílio, se já tiver sido executado.

Para reforçar as obrigações prévias de verificação, permitindo analisar esta questão ex ante, passa também a exigir-se que os Estados-Membros, ao preencherem os formulários de notificação de auxílios de Estado, atestem a conformidade das atividades com a legislação ambiental da UE. Embora promove uma maior consonância com a Convenção de Aarhus, este novo mecanismo é suscetível de atrasar projetos e operações e aumentar o risco de litígios, sobretudo em setores sensíveis. Por conseguinte, em matérias relacionadas com auxílios de Estado, torna-se essencial redobrar os cuidados a fim de demonstrar o cumprimento das normas ambientais.

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3. Financeiro

ALTERAÇÕES ÀS IFRS 7 E IFRS 9

Regulamento 2025/1047, de 27 de maio – CE

O presente diploma visa, em primeira análise, introduzir alterações às Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS) 7 e 9, com o objetivo essencial de clarificar requisitos de classificação e mensuração de instrumentos financeiros, bem como reforçar a transparência das informações prestadas.

Com efeito, o Regulamento em causa aplica-se a todas as empresas abrangidas pelo Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, impondo esclarecimentos relativos aos direitos e obrigações no reporte financeiro.

Em primeiro lugar, determinados empréstimos ligados à prossecução de objetivos ambientais, sociais e de governação (ESG) continuarão a ser classificados ao custo amortizado ou pelo justo valor através de outro rendimento integral (JVORI), desde que cumpram o critério «apenas reembolsos de capital e pagamentos de juros» (SPPI).

Paralelamente, passa a ser admitida a extinção do passivo em momento anterior ao da entrega de numerário, nos casos em que não exista possibilidade prática de cancelamento do pagamento e em que o risco de liquidação seja insignificante.

Refira-se, por último, que também a IFRS 7 passa a exigir maior detalhe nas comunicações, nomeadamente ao nível de investimentos em instrumentos de capital próprio ou quanto ao detalhe das variações de fluxo de caixa.

PARTICIPAÇÃO PORTUGUESA NO INVEST-EU

Decreto-Lei n.º 81-A/2025, de 23 de maio (DR 99, Série I , Suplemento, de 23 de maio de 2025)

O presente diploma estabelece os termos de participação do Estado português no “Compartimento do Estado-Membro do Programa InvestEU-Portugal” , e procura capacitar as empresas portuguesas através deste financiamento, promovendo investimentos sustentáveis, inovação e geração de emprego.

O programa InvestEU consiste num instrumento financeiro da União Europeia que fornece garantias para aumentar a capacidade de concessão de crédito a projetos considerados estratégicos, constituindo o maior instrumento de partilha de riscos em vigor na União Europeia.

Garantindo condições de acesso ao crédito mais favoráveis, nomeadamente para micro, pequenas e médias empresas, em setores estratégicos como competitividade, digitalização e sustentabilidade, o mesmo surge no âmbito da revisão do Plano de Recuperação e Resiliência (o “PRR”) sob o escopo de um Acordo de Contribuição InvestEU. Como parte integrante deste processo, o Estado português deverá celebrar também um Acordo de Garantia de Estado que se destine a cobrir eventuais perdas superiores às provisões constituídas.

A participação de Portugal concretiza-se sob a forma de uma contribuição de 450 milhões de euros provenientes dos recursos do PRR, a canalizar para o InvestEU Common Provision Fund. Ademais o Estado fica também incumbido de prestar uma garantia pessoal autónoma, incondicional e irrevogável, no montante máximo garantido de 50 milhões de euros, respeitando o limite fixado na Lei do Orçamento do Estado.

Estas contribuições por parte dos Estados-Membros, aliadas às garantias da União Europeia, permitem distribuir o risco dos créditos a empresas, incentivando as instituições financeiras a promover financiamentos em melhores condições, como taxas de juro mais acessíveis, prazos mais alargados ou exigências de capital menos onerosas.

A Estrutura de Missão Recuperar Portugal (EMRP) acompanha e informa anualmente sobre a execução e nível de concretização dos investimentos realizados no âmbito do programa.

Este diploma entrou em vigor em 20 de maio de 2025, regulamentando com urgência a operacionalização do InvestEU-Portugal, em conformidade com os compromissos internacionais e os prazos estabelecidos.

CÁLCULO DE PROVISÕES TÉCNICAS E FUNDOS PRÓPRIOS

Regulamento de Execução (UE) 2025/863, de 8 de maio – CE

O Regulamento de Execução (UE) 2025/863 da Comissão estabelece as linhas orientadoras técnicas que as empresas de seguros e resseguros, sujeitas às regras da Diretiva 2009/138/CE (Solvência II), devem observar ao calcular as provisões técnicas e os fundos próprios de base, com datas de referência compreendidas entre 31 de março de 2025 e 29 de junho de 2025.

Este diploma tem como propósito uniformizar a determinação das provisões técnicas e evitar discrepâncias ao avaliar passivos seguradores e resseguradores. Neste sentido, as suas principais disposições reportam-se aos temas das taxas de juro sem risco, aos spreads fundamentais e ao ajuste à volatilidade.

É assim reforçada a ideia de uniformidade subjacente à União Europeia e estimulada a competitividade entre Estados-Membros, nivelando o modo como todos estes procedem ao reporte e cálculo das suas provisões técnicas e fundos próprios de base. A isto acresce que este diploma legal contribui para a maior transparência do setor dos seguros e consequente maior segurança jurídica, bem como permite uma comparabilidade entre Estados-Membros mais rigorosa.

Se, por um lado, o seu Anexo I trata a estrutura das taxas de juro sem risco e respetivos prazos de vencimento, o seu Anexo II consagra diversas tabelas com os spreads fundamentais para o cálculo do ajuste compensatório consoante o tipo de exposição, a moeda e a qualidade do crédito, e, por fim, o seu Anexo III esquematiza valores de ajustamento à volatilidade, ordenados por moeda e mercado, a serem somados ou subtraídos à estrutura das taxas de juro sem risco (sendo este ajustamento uniforme nos países que adotam o Euro).

As empresas de seguros e resseguros abrangidas devem cumprir com estas normas técnicas em relatórios com data de referência entre 31 de março de 2025 e 29 de junho de 2025, dispensando a transposição para o direito nacional deste Regulamento.

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4. Laboral

LEI APLICÁVEL AO CONTRATO DE TRABALHO – SUBSÍDIO DE FÉRIAS E DE NATAL

Acórdão de 15 de maio de 2025 (Processo n.º 741/22.1T8MAI.P1.S1) - STJ

O Acórdão em análise foi proferido no âmbito de uma ação proposta por nove trabalhadores (“Autores”) - tripulantes de cabine com residência habitual em Portugal - contra a sua entidade empregadora (“”) - uma empresa de aviação civil com sede na Irlanda -, na qual peticionaram, entre outros, que a Ré fosse condenada ao pagamento dos subsídios de férias e de Natal referentes ao período compreendido entre 2011 e 2019.

A questão central sob decisão consistia em saber se a lei aplicável ao pagamento de subsídios de férias e de Natal era a lei irlandesa – lei que as partes escolheram aplicar ao contrato de trabalho – ou a lei portuguesa – lei que seria aplicável na falta de escolha e, por conseguinte, cujas disposições inderrogáveis não podem ser afastadas, nos termos do disposto no artigo 8.º, n.º 1 do Regulamento (CE) n.º 593/2008, de 17 de junho de 2008 (Regulamento Roma I).

O STJ entendeu - à semelhança do entendimento que já havia sustentado noutros acórdãos e com suportando-se também em decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia - que os preceitos que preveem o pagamento dos subsídios de férias e de Natal são inderrogáveis na ordem jurídica portuguesa e não podem ser afastadas por acordo das partes. Neste contexto, o STK sublinhou que o pagamento dos subsídios de férias e de Natal está previsto para todos os trabalhadores, independentemente do seu nível salarial, por razões sociais e culturais, não relevando, para estes efeitos, a comparação dos montantes retributivos entre países distintos.

Por esta razão, o STJ concluiu que ainda que o contrato de trabalho seja regulado pela lei de outro país, por escolha das partes, o pagamento dos subsídios de férias e de Natal é obrigatório relativamente a trabalhadores cujo contrato de trabalho esteja a ser executado em Portugal.

ASSÉDIO MORAL – PODER DE DIREÇÃO DO EMPREGADOR

Acórdão de 15 de maio de 2025 (Processo n.º 18993/22.5T8LSB.L1.S1) - STJ

No caso em apreço, uma trabalhadora (“Autora”) intentou uma ação contra a sua entidade empregadora (“”) pedindo que fosse reconhecida justa causa na resolução do seu contrato de trabalho com fundamento, entre outros, na alegada prática de assédio moral.

Para tanto, a Autora invocou, essencialmente, que a Ré cancelou a sua participação em programas de televisão, não a designou para a representar em determinados eventos, retirou-lhe a viatura que lhe estava atribuída para deslocações profissionais, bem como retirou o acesso a um endereço de email geral a todos os trabalhadores da unidade que a Autora coordenava durante cerca de um mês.

O Tribunal considerou que, neste caso concreto, não teria ocorrido nenhuma situação de assédio moral, mas sim um clima de desentendimento entre a Autora e a Ré, tendo esta última agido ao abrigo dos seus poderes funcionais, designadamente de direção e de fiscalização dos seus trabalhadores. Sublinhou o Tribunal que a Ré, ao abrigo do seu poder de direção e de conformação das funções a desenvolver pelos trabalhadores ao seu serviço, era livre de atribuir aos seus trabalhadores as funções que entendesse, desde que abrangidas pelo seu conteúdo funcional e que era também livre de escolher quem a representava.

No que respeita à retirada da viatura e ao bloqueio do acesso ao email profissional, concluiu o Tribunal que estes atos constituíam manifestações lícitas do controlo que a Ré pretendia exercer sobre as suas próprias instalações e bens.

Por conseguinte, o STJ concluiu que os comportamentos adotados pela Ré provinham do seu natural poder de direção, foram lícitos e não suscetíveis de integrar a prática de assédio moral à Autora.

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5. Público

SISTEMA NACIONAL DE GÁS – MERCADO DOS GASES DE ORIGEM RENOVÁVEL OU DE BAIXO TEOR DE CARBONO

Decreto-Lei n.º 79/2025, de 21 de maio (DR 97, Série I, de 21 de maio de 2025)

O Decreto-Lei n.º 79/2025, de 21 de maio (“Decreto-Lei n.º 79/2025”) alterou o Decreto-Lei n.º 62/2020, de 28 de agosto, que estabelece a organização e funcionamento do Sistema Nacional de Gás (“SNG”), e o Decreto-Lei n.º 70/2022, de 14 de outubro, que cria uma reserva estratégica de gás natural, pertencente ao Estado Português, estabelecendo medidas extraordinárias e temporárias de reporte de informação e de garantia da segurança de abastecimento de gás.

Com vista ao cumprimento de compromissos internacionais do Estado Português em matéria de transição energética e descarbonização da economia, o Decreto-Lei n.º 79/2025:

  1. Atualiza os conceitos de gás, gás natural, gases de baixo teor de carbono, hidrogénio hipocarbónico e hidrogénio renovável;
  2. Determina que todos os pedidos, comunicações e notificações atinentes a atividades no setor do gás passam a ser realizados no Portal Único dos Serviços Digitais (Gov.pt);
  3. Designa a Direção Geral de Energia e Geologia como entidade licenciadora do mercado de gás renovável, natural e hidrogénio. Por outro lado, designa a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos como entidade reguladora destes mercados.

O presente diploma entrou em vigor em 22 de maio de 2025.

REGIME GERAL DA GESTÃO DE RESÍDUOS – RESPONSABILIDADE ALARGADA DO PRODUTOR

Decreto-Lei n.º 81/2025, de 22 de maio (DR 98, Série I, de 22 de maio de 2025)

O Decreto-Lei n.º 81/2025, de 22 de maio (“Decreto-Lei n.º 81/2025”) alterou o Regime Geral de Gestão de Resíduos (“RGGR”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 102-D/2020, de 10 de dezembro, e o regime de gestão de fluxos específicos de resíduos sujeitos ao princípio da responsabilidade alargada do produtor, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 152-D/2017, de 11 de dezembro.

O Decreto-Lei n.º 81/2025 altera o conceito de “Resíduo Urbano”, que é redefinido à luz da Lista Europeia de Resíduos e a noção de “Resíduo não perigoso” é introduzida em legislação nacional.

O Decreto-Lei n.º 81/2025 estabelece que, em caso de impossibilidade de determinação do produtor do resíduo, a responsabilidade pela respetiva gestão recai sobre o seu detentor atual ou, caso seja possível identificar, sobre os seus detentores anteriores.

Ademais, o diploma prevê que a responsabilidade alargada do produtor considere, entre outros, a durabilidade, reparabilidade e possibilidade de reutilização e de reciclagem, bem como a presença de substâncias perigosas, segundo uma abordagem baseada no ciclo de vida do produto, permitindo ainda a possibilidade de repartição de responsabilidade financeira pelos produtores de resíduos e/ou pelos distribuidores, desde que os produtores dos produtos suportem pelo menos 80% dos custos necessários.

Por último, com a entrada em vigor deste diploma em 23 de maio de 2025, a tarefa de mediação dos níveis de resíduos alimentares foi atribuída ao Instituto Nacional de Estatística.

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[1] A Convenção de Aarhus, assinada pelos Estados Membro da EU em 1998 e em vigor desde 2001, é um tratado internacional sobre a democracia ambiental que visa garantir acesso à informação, participação pública e acesso à justiça em questões ambientais. Nesse sentido, as recentes alterações respondem às conclusões de 2021 do Comité de Avaliação do Cumprimento da Convenção, segundo as quais a UE estaria a violar a Convenção ao não possibilitar ao público contestar decisões sobre auxílios estatais adotadas ao abrigo do artigo 108.º, n.º 2, do TFUE, mesmo que tais decisões alegadamente desrespeitem a legislação ambiental da UE.

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