Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve e empreendimentos com fins turísticos

2006 Vida Imobiliária, n.º 108


O projecto de revisão do Plano Regional de Ordenamento do Território do Algarve (“PROT do Algarve”) que se encontra em discussão pública desde 14 de Agosto e até 30 de Novembro, pretende introduzir regras inovadoras em matéria de instalação de empreendimentos com fins turísticos, designadamente limitando a 24.000 o número de novas camas que esses empreendimentos podem instalar em toda a região.

O PROT do Algarve, descrevendo aquilo que são os fundamentos, objectivos, eixos estratégicos e políticas estratégicas delineados para a Região do Algarve, aponta para um regime inovatório de gestão e uso do território. Assim, para compreender a inovação que o PROT do Algarve pretende introduzir, importa começar por esclarecer o enquadramento que o fundamenta. 

Desde logo, é assumido em todos os momentos do PROT do Algarve a necessidade, e a opção estratégica, de o desenvolvimento do turismo naquela Região assentar na “expansão, qualificação e diversificação das actividades turísticas” (pág. 15 da proposta técnica do PROT do Algarve).  

Para concretização desse objectivo, o PROT do Algarve definiu como eixo estratégico de base territorial a desenvolver, a criação de condições de qualificação e diversificação do turismo e, como política estratégica a implementar para concretização desse eixo, o “preservar a imagem internacional, ganhar a aposta do golfe, complementar o sol e praia com um sector relevante de ‘indústria de ócio’, náutica de recreio e cruzeiros, desenvolver serviços para o turismo sénior, fazer do Algarve uma Região de eventos internacionais, controlar e qualificar as camas paralelas, afirmar um segmento específico de turismo dirigido às áreas do interior” (pág. 32 da proposta técnica do PROT do Algarve). 

É neste propósito de criação de empreendimentos específicos para determinados sectores, que se inserem as novas orientações de base territorial para o sector do turismo que o PROT do Algarve define. 

Neste sentido, o PROT do Algarve propõe seis formas de desenvolvimento e ocupação turística: os Núcleos de Desenvolvimento Turístico, os Espaços de Ocupação Turística, as Unidades Hoteleiras Isoladas, a Imobiliária de Turismo e Lazer, o Turismo em Espaço Rural e a ocupação turística em perímetros urbanos. 

Em primeiro lugar, importa destacar a figura que, pelo seu regime, o PROT do Algarve apresenta com maior cariz inovatório - os Núcleos de Desenvolvimento Turístico (“NDT”) - e como a figura que a implantação de novos empreendimentos turísticos fora dos perímetros urbanos deve obrigatoriamente revestir. 

A designação NDT pretende traduzir a natureza de investimentos considerados estruturantes que a implantação destes empreendimentos representa e o seu regime caracteriza-se pelos seguintes princípios norteadores: por um lado, a localização dos empreendimentos não se encontra previamente definida (em nenhum Instrumento de Gestão Territorial) e, por outro, a respectiva concretização deve ser promovida pelos municípios mediante concurso público. 

Tendo estes dois vectores o PROT do Algarve concede uma ampla margem de conformação aos municípios apenas limitada pela previsão de algumas regras que de seguida analisaremos. 

Desde logo, estabelece o PROT do Algarve que a dotação inicial da capacidade de alojamento a criar por via de NDT (recorde-se que aqui se integra a implantação de todos os empreendimentos com fins turísticos) é de 24.000 camas para toda a Região do Algarve distribuída, por Unidade Territorial, da seguinte forma: litoral/sul - 8.400 camas -, costa vicentina - 4.000 camas -, Serra - 4.945 camas - e baixo Guadiana - 6.655 camas. A rigidez deste sistema é apenas mitigada pela admissão de uma variação até 10% da capacidade de alojamento regional e a possibilidade de revisão desta dotação passado 5 anos. 

Fica contudo por especificar como se procederá à divisão dessa dotação inicial atribuída às Unidades Territoriais pelos Municípios neles inseridos. 

Quanto ao objecto do concurso, estabelece o PROT do Algarve que se admite, à partida, a apresentação de projectos em qualquer localização (salvo algum condicionamento imposto por servidões e condicionantes legais) exigindo-se posteriormente certos critérios em matéria de qualificação das propostas alguns dos quais, por se tratar de matéria urbanística, analisaremos. 

Desde logo, prevêem-se limitações quanto às tipologias turísticas admitidas na faixa costeira entre os 500 e 2000 metros (hotéis, pousadas, estalagens e aldeamentos turísticos, de 4 e 5 estrelas, devendo 100% da capacidade de alojamento estar, durante um certo período de tempo, permanentemente afecta à exploração turística) e as admitidas no restante território fora da faixa costeira (hotéis, pousadas, estalagens, hotéis-apartamentos e aldeamentos turísticos, de 4 e 5 estrelas, que devem corresponder no mínimo a 70% da capacidade total de alojamento do NDT sendo que os hóteis-apartamentos devem estar afectos, durante um certo período de tempo, permanentemente à exploração turística). Consagra-se ainda que a área urbanizável não poderá ser superior a 30% da área total do NDT, que a densidade de ocupação bruta máxima correspondente a cada área urbanizável não possa ser, em regra, superior a 60 camas por hectare. 

Contudo, respeitando-se estes critérios, o Município adjudicante pode estar perante propostas tão diferentes e, em consequência, com possibilidades de comparação das mesmas muito reduzidas. A esse propósito note-se aliás que o PROT do Algarve, visando ainda conformar a margem de discricionariedade detida pelos municípios, estabelece - ou melhor, pretende estabelecer - critérios de avaliação e classificação de propostas que, por serem tão genéricos, são, na sua maioria, insusceptíveis de produzir os efeitos delimitadores pretendidos. 

Relativamente ao procedimento concursal, o PROT do Algarve pouco mais desenvolve do que elencar as fases que o compõem e as entidades responsáveis por os conduzir - abertura do concurso e apresentação de documentação, qualificação dos concorrentes, consulta pública, análise das propostas e elaboração de relatório e decisão de celebrar um acordo base para execução da proposta. 

Escolhida uma proposta a mesma será objecto de um acordo com a Câmara Municipal com vista à elaboração de plano de pormenor ou de urbanização para a implantação do NDT e posterior concretização do empreendimento. Concomitantemente com esta base negocial que se pretende instituir na definição do plano de pormenor ou de urbanização, o PROT do Algarve afirma a irrenunciabilidade e indisponibilidade dos poderes públicos de conformação dos referidos Planos e a necessidade de os mesmos respeitarem as condicionantes legais existentes. Face a isto, a matéria objecto de negociação na elaboração de plano de pormenor ou de urbanização é muito reduzida. 

Sentindo a necessidade de explicar o enquadramento legal desta (nova) forma de desenvolvimento e ocupação turística, em especial do mecanismo de contratualização previsto, o PROT do Algarve salienta que, ainda que a legislação existente seja suficiente, seria conveniente a aprovação de um novo enquadramento legal devidamente adaptado. Talvez por reconhecer essa necessidade de adaptação, o PROT do Algarve remete para os Planos Directores Municipais a especificação de algumas das regras aplicáveis a estes procedimento. 

Ainda no âmbito dos NDT, não deixa de ser curiosa a preferência, manifestada no PROT do Algarve, pela figura do resort e do conjunto turístico. 

Um segundo mecanismo de desenvolvimento e ocupação turística previsto no PROT do Algarve é a criação de Espaços de Ocupação Turística (“EOT”). 

Estes espaços, a serem delimitados em sede de revisão dos Planos Directores Municipais e classificados como urbanos, integram as áreas turísticas efectivamente existentes e a sua instituição/classificação tem como propósito a promoção da requalificação desses espaços. 

Pretende-se, em, síntese, criar os mecanismos de planeamento do território necessários para a requalificação dos espaços actualmente existentes com fins turísticos. 

O terceiro instrumento de desenvolvimento e ocupação turística previsto no PROT do Algarve diz respeito às Unidades Hoteleiras Isoladas (“UHI”). Tendo como propósito beneficiar os territórios com menor desenvolvimento turístico (Unidades Territoriais da Costa Vicentina, da Serra e do Baixo Guadiana e algumas freguesias do Litoral Sul/Barrocal), as UHI permitem aumentar a capacidade de alojamento dessas áreas (ainda que igualmente limitado a uma dotação de camas por município). 

O PROT Algarve prevê ainda os mecanismos de Imobiliária de Turismo e Lazer (imobiliária associada à segunda habitação) e de Turismo em Espaço Rural, limitando-se a esse propósito a afirmar, quanto ao primeiro caso, que a sua implantação pode ter lugar em solo urbano ou em NDT e EOT (remetendo para as regras aí definidas) e, quanto ao segundo caso, que o seu desenvolvimento não está sujeito a número máximo de camas turísticas. 

Quanto ao desenvolvimento e ocupação turística em perímetros urbanos, o PROT do Algarve admite a implantação de qualquer tipologia de empreendimentos turísticos sem limite de número de camas. 

Estas são, em suma, as possibilidades e as limitações que, caso o PROT do Algarve seja aprovado nos termos em que se encontra, qualquer entidade que pretenda promover (ou desenvolver) um empreendimento com fins turísticos no Algarve enfrentará.  

Refira-se, no entanto, que o PROT do Algarve, ao contrário do que acontecia com o plano que pretende rever, não é directamente vinculativo dos particulares e como tal não é ele que directamente conformará as pretensões de licenciamento de projectos turísticos dos particulares.  

O PROT do Algarve vai, isso sim, obrigar à revisão dos Planos Municipais de Ordenamento do Território, nomeadamente dos Planos Directores Municipais (PDM), e esses por sua vez vinculam directamente os particulares.  

Porém, tendo em conta a natureza regulamentar daqueles planos municipais, não se vê como os mesmos possam, sem um adequado enquadramento legal, incorporar algumas das soluções propostas pelo PROT, nomeadamente aquelas que introduzem claras limitações aos direitos de iniciativa privada dos particulares que se encontram previstos e regulados na legislação actualmente em vigor (veja-se, a título de exemplo, as limitações estabelecidas à exploração turística dos empreendimentos).  

Antecipa-se, por isso, uma nova revisão do enquadramento legal dos empreendimentos turísticos....

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