Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português

22 dezembro 2023


1. Concorrência

  • TC não Julga Inconstitucional a Dispensa de Audiência de Julgamento e Decisão por Simples Despacho em Recursos Interlocutórios
  • TJUE Confirmou Coima Aplicada à Altice Por Ter Realizado Uma Operação de Concentração Antes de Ter Sido Notificada e Autorizada
  • TCRS Reduz de 2.5 Milhões De Euros Para 160 Mil Euros Coima da Santa Casa da Misericórdia Por Gun Jumping

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2. Direito Digital

  • Obrigação Mínima de Informação e Direito de Intentar Ação Judicial Contra Autoridade de Controlo

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3. Financeiro

  • Adoção de Orientações / Recomendações da EBA relativas aos Planos de Recuperação
  • Datas-Limite Notificação do Montante De Reservas Mínimas
  • Alteração Regulamentação do Funcionamento do Sistema Componente nacional do TARGET (TARGET-PT)

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4. Fiscal

  • IRS - IRC - Coeficientes de Desvalorização da Moeda
  • IRC - Eliminação da Dupla Tributação entre Portugal e Moçambique - Dedução Integral do Imposto Pago na Fonte
  • IRC - Preços de Transferência - Requalificação de Operações ao Abrigo do Princípio aa Plena Concorrência
  • Uniformização de Jurisprudência - Pedido de Revisão Oficiosa - Termo Inicial da Contagem dos Juros Indemnizatórios

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5. Imobiliário

  • Oposição à Renovação Contratual em Contrato de Utilização de Espaço em Mercado Municipal
  • Apoio às famílias. Pagamento da Renda e da Prestação de Contratos De Crédito
  • Programa De Apoio Financeiro Porta 65

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6. Laboral

  • Retribuição Mensal Mínima Garantida – Atualização
  • Subsídio de Desemprego – Benefício Excecional, Vítimas de Violência Doméstica e Outras Alterações Pontuais
  • Programa Avançar – Alterações
  • Justa Causa de Resolução – Assédio laboral – Mobbing
  • Subsídio de Doença (Cessação por Saída não Autorizada da Residência) – Inconstitucionalidade

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7. Público

  • Financiamento da Tarifa Social – Alterações
  • Vistos e Títulos de Residência - Prorrogação do Prazo de Validade

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1. Concorrência

TC NÃO JULGA INCONSTITUCIONAL A DISPENSA DE AUDIÊNCIA DE JULGAMENTO E DECISÃO POR SIMPLES DESPACHO EM RECURSOS INTERLOCUTÓRIOS

Acórdão n.º 579/2023 de 27 de setembro de 2023 (Publicado no DRE a 21 de novembro de 2023) - TC

Em 22 de agosto de 2017, a AdC iniciou um processo contra quatro cadeias de supermercados, Modelo Continente, Pingo Doce, Auchan e Intermarché, bem como contra o fornecedor Super Bock, pelo alegado alinhamento de preços de venda entre concorrentes, através de um fornecedor comum (uma conduta designada “Hub-and-Spoke”) (vide, Boletim UM-PC, Novembro de 2021).

No âmbito deste processo, na fase administrativa, a AdC emitiu uma decisão interlocutória, informando a Super Bock de que, para fundamentar a sua decisão final, teria de usar determinados documentos que tinham sido classificados pela Super Bock como total ou parcialmente confidenciais. Pelo que, para poder usar os referidos documentos na imputação dos factos em causa, a AdC iria proceder ao levantamento da classificação confidencial dos mesmos, invocando como fundamento que estes revelam direta ou indiretamente a existência da prática concorrencial em causa.

A Super Bock, interpôs recurso desta decisão. Em resposta, a 3 de fevereiro de 2022, o TCRS decidiu, por simples despacho, que não haveria lugar a julgamento quanto ao recurso, por considerar que as alegações não continham matéria inovatória e por considerar igualmente que a prova testemunhal indicada não era necessária à descoberta da verdade, nem à boa decisão da causa. A Super Bock reclamou desse despacho, opondo-se à dispensa de audiência de julgamento e, em 24 de março de 2022, o TCRS indeferiu a reclamação e julgou o recurso interposto totalmente improcedente, mantendo na íntegra a decisão da AdC. Nesta sequência, a Super Bock recorreu, com os mesmos fundamentos, para o TRL que também indeferiu o recurso, mantendo a decisão do TCRS.

Aqui chegados, a Super Bock interpôs recurso para o TC sobre a eventual inconstitucionalidade da interpretação da Lei da Concorrência e do Regime Geral das Contraordenações que permite que um Tribunal dispense a audiência de julgamento e profira uma decisão por simples despacho, quando um dos visados se opôs a tal decisão, em recursos interlocutórios jusconcorrenciais, argumentando uma alegada violação de direitos e garantias de audiência e defesa.

O TC considerou que (i) não se impõe sempre ou em qualquer circunstância a realização de uma audiência pública de julgamento, (ii) os direitos de audiência e defesa têm uma extensão mais reduzida no âmbito de um recurso sobre uma decisão interlocutória que não versa sobre a responsabilidade contraordenacional do visado do que num julgamento sancionatório, (iii) caso seja proferida uma decisão administrativa condenatória, aí são assegurados em maior extensão os direitos de audiência e defesa e (iv) o contraditório no recurso das decisões interlocutórias da AdC é exercido na fase administrativa do processo contraordenacional.

TJUE CONFIRMOU COIMA APLICADA À ALTICE POR TER REALIZADO UMA OPERAÇÃO DE CONCENTRAÇÃO ANTES DE TER SIDO NOTIFICADA E AUTORIZADA

Acórdão de 9 de novembro de 2023 (Caso C-746/21 P) - TJUE

Em 9 de dezembro de 2014, a Altice Europe NV (“Altice”) celebrou um contrato de compra e venda com a Oi, S.A. (o “SPA”), para a aquisição do controlo exclusivo sobre a PT Portugal SGPS, S.A. (“PT”). A operação foi notificada, pela Altice, à CE em 25 de fevereiro de 2015. A CE emitiu uma decisão de não-oposição a 20 de abril de 2015.   

Nesta sequência, a CE tomou conhecimento, através da imprensa, que a Altice e a PT Portugal tinham realizado pelo menos uma reunião antes da decisão de autorização da CE ser emitida. Nesta sequência, a CE iniciou uma investigação para averiguar a potencial existência de uma conduta conhecida como “Gun Jumping”e caracterizada por uma dupla conduta, incluindo a não notificação de uma operação sujeita à notificação junto da autoridade da concorrência competente e/ou a realização antecipada de uma operação antes de obter a autorização da autoridade da concorrência competente (obrigação de suspensão ou standstill).

Nesta sequência, em 24 de abril de 2018, a CE concluiu pela existência de uma violação ao direito da concorrência, considerando que a Altice tinha tido a possibilidade de exercer uma influência decisiva, e em algumas circunstâncias tinha exercido controlo, sobre a PT Portugal antes da adoção da decisão da CE e, em alguns casos, antes da apresentação da notificação. Consequentemente, a CE impôs duas coimas à Altice, cada uma no montante de 62,25 milhões de euros (num total de 124,5 milhões de euros).

A CE considerou, em particular, que: (i) determinadas cláusulas do SPA conferiam à Altice direitos de veto sobre decisões relativas à política comercial da PT Portugal; (ii) a Altice estava envolvida na gestão do dia a dia da PT Portugal e (iii) as empresas trocaram informações comercialmente sensíveis (entre outros, estratégias relacionadas com custos, margens de lucro, planos de expansão da rede e futuras estratégias de preços).

Em 5 de julho de 2018, a Altice intentou no TG uma ação de anulação da decisão da CE e, em alternativa, de anulação ou redução da coima imposta pela decisão. No seu acórdão, o TG confirmou o entendimento da CE, em decisão cujo resumo foi publicado na Crónica Legislativa y Jurisprudencial: Unión Europea, España y Portugal - Noviembre 2021 a Enero 2022.

A Altice interpôs recurso para o TJUE que, em acórdão datado de 9 de novembro de 2023, confirmou, no geral, o entendimento do TG. Em particular, o TJUE concluiu que:

  1. rejeitou o argumento da Altice de que, ao aplicar duas coimas - uma pela não notificação e outra pela violação da obrigação de suspensão - a CE tinha agido de forma desproporcionada e, essencialmente, punido a Altice duas vezes pelo mesmo comportamento subjacente. O TJUE considerou que as duas coimas se referiam a infrações de disposições diferentes, com objetivos distintos: a obrigação de notificação é uma obrigação positiva de notificar uma concentração, enquanto a obrigação de “standstill” é uma obrigação negativa de não prosseguir sem autorização;
  2. rejeitou também o argumento da Altice de que o TG não tinha razão ao considerar que os acordos prévios à operação questionados pela CE permitiam à Altice exercer uma influência decisiva sobre a PT Portugal mesmo antes da notificação da operação. Considerou que a realização de uma concentração surge assim que as partes implementam medidas que contribuem para uma alteração duradoura do controlo sobre a empresa alvo. Consequentemente, qualquer medida, mesmo acessória ou preparatória e de curta duração, pode resultar na realização parcial de uma concentração;
  3. rejeitou igualmente o argumento da Altice de que a troca de informações sensíveis do ponto de vista da concorrência não contribuiu para um exercício prematuro de influência decisiva;
  4. deu razão à Altice sobre o facto de a CE não ter fundamentado a aplicação de coimas no mesmo montante para a violação da obrigação de notificação e da obrigação de “standstill”, apesar de a sua duração ser diferente (i.e., a violação da obrigação de notificação foi instantânea, enquanto a violação da obrigação de standstill foi continuada). Em consequência, o TJUE reduziu a coima por falta de notificação para 52,9 milhões de euros.

TCRS REDUZ DE 2.5 MILHÕES DE EUROS PARA 160 MIL EUROS COIMA DA SANTA CASA DA MISERICÓRDIA POR GUN JUMPING

Sentença de 22 de novembro de 2023 - TCRS

A AdC sancionou, em 6 de setembro de 2022, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (“SCML”), com uma coima no montante de 2,5 milhões de euros, em virtude da não notificação à AdC e realização de uma operação de concentração antes da decisão de não oposição da AdC (conduta designada por “Gun Jumping”).

No caso em apreço, o alegado incumprimento terá ocorrido em 14 de dezembro de 2020, aquando da aquisição pela SCML do controlo exclusivo da CVP - Sociedade de Gestão Hospitalar, S.A., a sociedade gestora do Hospital da Cruz Vermelha Portuguesa, sendo que a AdC apenas foi notificada desta concentração em 28 de maio de 2021.

De acordo com a AdC, a referida operação seria notificável tendo em conta o preenchimento do limiar de notificação relativo ao volume de negócios. Em concreto a SCML tinha excluído do computo geral do seu volume de negócios os valores resultantes da atividade de exploração dos jogos sociais, que considera ser uma atividade exercida em nome e por conta do Estado e, nesse sentido, seria controlada pelo Estado, constituindo as receitas geradas rendimentos do Estado. A AdC teve um entendimento distinto, concluindo que a atividade de exploração de jogos sociais é, de facto, uma atividade da SCML, e os resultados líquidos gerados refletem a contrapartida dos produtos ou serviços vendidos pela SCML aos consumidores em Portugal. Por conseguinte, deveriam ter sido considerados para efeitos da determinação do limiar de notificação.

Recorde-se, neste contexto, que as operações de concentração de empresas que atinjam os limiares de notificação, alternativos, previstos na Lei da Concorrência, relacionados com volume de negócios e quota de mercado devem ser previamente notificadas à AdC, devendo aguardar-se pela autorização desta autoridade antes de implementar a concentração.

A AdC decidiu sancionar a SCML no montante total de 2,5 milhões de euros, o que corresponde à coima mais alta aplicada pela AdC num caso de gun jumping até à data, em decisão cujo resumo foi publicado no Boletim UM-PC, de setembro de 2022.

Nesta sequência, a SCML interpôs recurso da decisão da AdC no TCRS, essencialmente, por considerar que a coima era inadequada, desnecessária e desproporcional. O TCRS julgou o recurso em grande parte procedente e reduziu a coima de 2,5 milhões de euros para 160.000 euros, nomeadamente pelos seguintes motivos:

  1. O Direito nacional, ao contrário do Direito da União Europeia, reconduz as obrigações de notificação prévia e de standstill a uma única infração, pelo que não se pode considerar que a SCML praticou duas infrações.
  2. O Tribunal teceu considerações específicas quando ao cômputo do volume de negócios da SCML, à luz da utilidade pública e funções específicas da mesma, reconhecendo a particularidade deste exercício quanto a esta entidade.
  3. A SCML tinha sido condenada a título doloso, contudo, deveria ter sido condenada a título negligente, uma vez que não representou a falta de comunicação prévia da operação à AdC como um tipo de contraordenação, nem se conformou com a realização de tal contraordenação. Em vez disso, em consequência do ponto prévio, a prática deveu-se à falta de diligência e cuidado, ainda que tenha atuado em conformidade com a análise preliminar dos seus advogados, em resultado do erro de apreciação quanto aos elementos considerados no conceito de volume de negócios, segundo a Lei da Concorrência, a considerar para a determinação do limiar de notificação.
  4. A condição económica da SCML não era solida, tendo apresentado um resultado líquido do período de 2021 negativo.
  5. O negócio subjacente à operação de concentração não teve em vista interesses económicos, mas sim o interesse público no funcionamento do hospital, que se encontrava em situação de quase falência, o que teve por base uma autorização da Ministra do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social.
  6. A SCML tem um caráter de utilidade pública e uma coima excessiva teria efeitos laterais indesejados, junto daqueles que eventualmente mais precisam dos projetos de caráter social.

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2. Direito Digital

OBRIGAÇÃO MÍNIMA DE INFORMAÇÃO E DIREITO DE INTENTAR AÇÃO JUDICIAL CONTRA AUTORIDADE DE CONTROLO

Acórdão 16 de novembro de 2023 (Processo C-333/22) - TJUE

O acórdão em apreço tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Tribunal de Recurso de Bruxelas, Bélgica, no âmbito de um litígio que opõe a Ligue des Droits Humains ASBL e BA (pessoa singular) ao Órgão de Controlo da Informação Policial da Bélgica (“OCIP”), a respeito do exercício, através deste órgão, dos direitos de BA relativos aos seus dados pessoais, tratados pelos serviços de polícia belgas e com base nos quais a Autoridade Nacional de Segurança da Bélgica (a “Autoridade”) indeferiu um pedido de emissão do certificado de credenciação de segurança, invocando razões de segurança do Estado.

A Autoridade fundamentou a referida recusa no facto de BA ter participado em 10 manifestações, informação que resultava dos dados pessoais pertencentes a BA, aos quais a Autoridade teve acesso. Em 2020, BA pediu ao OCIP que identificasse os responsáveis pelo tratamento de dados pessoais e lhes ordenasse que dessem acesso a todas as informações que lhe diziam respeito. Na resposta a este pedido, o OCIP referiu que BA apenas dispunha do direito de acesso indireto a esses dados, tendo simultaneamente garantido esta entidade que a própria iria verificar a legalidade de um eventual tratamento de dados na base de dados utilizada por todos os serviços de polícia nacionais. Posteriormente, informou BA de que os dados pessoais seriam alterados ou eliminados do referidos bancos de dados, se necessário, acrescentando que a lei nacional da proteção de dados não permitia a comunicação de informações adicionais.

Neste seguimento, a Ligue des Droits Humains ASBL e BA apresentaram um pedido de medidas provisórias no Tribunal de Primeira Instância de Língua Francesa de Bruxelas (o “Tribunal”), solicitando o acesso a todos os dados pessoais relativos a BA, através do OCIP, e a identificação, por este último, dos responsáveis pelo tratamento e dos eventuais destinatários desses dados. O Tribunal decidiu suspender a instância e submeter ao TJUE duas questões prejudiciais.

Relativamente à primeira questão, o Tribunal questiona se o artigo 17.º da Diretiva (EU) 2016/680 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas autoridades competentes para efeitos de prevenção, investigação, deteção ou repressão de infrações penais ou execução de sanções penais, e à livre circulação desses dados (a “Diretiva”), em conjugação com os artigos 46.º, n.º 1, alínea g), 47.º, n.os 1 e 2, e 53.º, n.º 1, todos da Diretiva, bem como com o artigo 8.º, n.º 3, e o artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a “Carta”), deve ser interpretado no sentido de que, quando os direitos de uma pessoa tenham sido exercidos através da autoridade de controlo competente, nos termos do referido artigo 17.º, essa pessoa deve dispor de uma ação judicial contra a referida autoridade.

A este respeito, o TJUE salienta que o exercício indireto dos direitos do titular dos dados através da autoridade de controlo competente, previsto naquela norma, constitui uma garantia adicional de que os dados pessoais serão tratados de forma lícita, nomeadamente nos casos em que as disposições legislativas nacionais limitem o exercício direto junto do responsável pelo tratamento, do direito de receber informações adicionais.

De facto, embora apenas no caso detal limitação constituir uma medida necessária e proporcionada, o artigo 13.º, n.º 3, e o artigo 15.º, n.º 1, da Diretiva autorizam o legislador nacional a limitar o exercício direto. Em termos idênticos, o artigo 16.º, n.º 4, da Diretiva autoriza o legislador nacional a limitar a obrigação do responsável pelo tratamento de informar o titular dos dados, por escrito, de todos os casos de recusa da retificação ou do apagamento de dados pessoais ou da limitação do tratamento, bem como dos motivos da recusa.

Por conseguinte, o exercício indireto destes direitos, através da autoridade de controlo competente, deve ser considerado necessário para a proteção desses direitos, uma vez que o seu exercício direto junto do responsável pelo tratamento se revela difícil ou mesmo impossível. Resulta, aliás, do artigo 47.º, n.os 1 e 2, da Diretiva, que cada autoridade de controlo deve dispor não só de “poderes de investigação efetivos” como também de “poderes de correção efetivos”. Além disso, a autoridade de controlo deve informar, “pelo menos”, o titular dos dados de que procedeu a todas as verificações necessárias ou a um reexame.

Neste contexto, sublinha o TJUE, que o titular dos dados tem de poder obter uma fiscalização judicial do mérito dessa decisão e, em especial, da forma como a autoridade de controlo cumpriu a sua obrigação. Atendendo a estas considerações, conclui o TJUE que, quando os direitos de uma pessoa tenham sido exercidos, nos termos do referido artigo 17.º, através da autoridade de controlo competente, e essa autoridade tenha informado do resultado das verificações efetuadas, a pessoa em causa tem a possibilidade de intentar uma ação judicial contra a decisão da referida autoridade de encerrar o processo de verificação.

Face à segunda questão prejudicial, o tribunal de reenvio questiona se o artigo 17.º, n.º 3 da Diretiva é válido à luz do artigo 8.º, n.º 3, e do artigo 47.º da Carta, na medida em que apenas obriga a autoridade de controlo a informar o titular dos dados (i) de que procedeu a todas as verificações necessárias ou a um exame e (ii) de que essa pessoa tem o direito de intentar ação judicial, dado que essa informação não permite a fiscalização judicial da atuação da autoridade de controlo e suas apreciações, tendo em conta os dados tratados e as obrigações do responsável pelo tratamento.

Relativamente a esta questão, o TJUE afirma que o artigo 17.º, n.º 3 da Diretiva institui, relativamente à autoridade de controlo competente, uma obrigação mínima de informação, ao prever que informe “pelo menos” o titular dos dados de que procedeu a todas as verificações necessárias ou a um exame e do seu direito de intentar ação judicial. O que significa que, em certos casos, a autoridade de controlo tem a faculdade, ou a obrigação, de se limitar às informações mínimas, especialmente quando essas regras visam evitar comprometer finalidades de interesse público. Tal restrição está expressamente prevista na Diretiva, respeitando o requisito enunciado no artigo 52.º, n.º 1, da Carta, segundo o qual qualquer restrição ao exercício de direitos fundamentais deve ser “prevista por lei”. Porém, tal não significa que seja possível, em todas as circunstâncias, reduzir a informação do titular dos dados apenas aos elementos mínimos.

Face ao exposto, deve considerar-se que o referido artigo 17.º, n.º 3 exige que os Estados-Membros assegurem que as disposições de direito nacional que o aplicam (i) respeitem o conteúdo essencial do seu direito a uma tutela jurisdicional efetiva e (ii) assentem numa ponderação das finalidades de interesse público que justificam uma limitação dessa informação, bem como dos direitos fundamentais e interesses legítimos dessa pessoa, no respeito pelos princípios da necessidade e da proporcionalidade.

Deste modo, nos casos em que a proteção do direito à ação judicial contra a decisão de encerrar o processo de verificação o exija, e as finalidades de interesse público a isso não se oponham, incumbe aos Estados-Membros prever que a informação do titular dos dados possa ir além das informações previstas no artigo 17.º, n.º 3. Pelo contrário, nos casos em que se imponha que a informação prestada pela autoridade de controlo se limite ao previsto no artigo 17.º, n.º 3, cabe aos Estados-Membros aplicar as medidas necessárias para garantir, nos termos do artigo 53.º, n.º 1, uma fiscalização jurisdicional tanto da existência e do mérito dos motivos que justificaram a limitação dessas informações.

Assim, o TJUE considerou que a limitação prevista no artigo 17.º da Diretiva respeita o conteúdo do direito do titular dos dados a uma ação judicial contra a decisão da autoridade de controlo de encerrar o processo, assim como os princípios da necessidade e da proporcionalidade, nos termos do artigo 52.º, n.º 1, da Carta, concluindo pela inexistência de qualquer elemento suscetível de afetar a validade do artigo 17.º, n.º 3, da Diretiva.

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3. Financeiro

ADOÇÃO DE ORIENTAÇÕES / RECOMENDAÇÕES DA EBA RELATIVAS AOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO

Carta Circular n.º CC/2023/00000043, de 27 de novembro de 2023 - BdP

A Autoridade Bancária Europeia (“EBA”), no contexto dos planos de recuperação, emitiu as seguintes orientações e recomendações (as “Orientações e Recomendações”):

  1. Orientações sobre os diversos cenários a utilizar em planos de recuperação (EBA/GL/06/2014), datadas de 18 de julho de 2014, aplicáveis a partir de 1 de janeiro de 2015;
  2. Recomendação sobre a cobertura das entidades abrangidas pelo plano de recuperação de grupo (EBA/REC/2017/02), datada de 1 de novembro de 2017, aplicável a partir de 1 de janeiro de 2018;
  3. Orientações relativas aos indicadores do plano de recuperação (EBA/GL/2021/11), datadas de 9 de novembro de 2021, aplicáveis a partir de 14 de fevereiro de 2022; e
  4. Orientações relativas à capacidade de recuperação global no planeamento da recuperação (EBA/GL/2023/06), datadas de 19 de julho de 2023, aplicáveis a partir de 11 de janeiro de 2024.

Ao abrigo da Carta Circular n.º CC/2023/00000043 (a “Carta Circular”), o Banco de Portugal (o “BdP”) vem enfatizar a importância das instituições de crédito pautarem a sua atividade pelas disposições presentes nas Orientações e Recomendações. Ainda no contexto da referida Carta Circular, o BdP vincula-se perante a EBA na sua intenção de, no exercício da sua atividade de supervisão, seguir as referidas Orientações e Recomendações. 

DATAS-LIMITE NOTIFICAÇÃO DO MONTANTE DE RESERVAS MÍNIMAS

Carta Circular n.º CC/2023/00000041, de 3 de novembro de 2023 - BdP

Ao abrigo das disposições do Regulamento (UE) 2021/378 do Banco Central Europeu de 22 de janeiro de 2021 relativo à aplicação de reservas mínimas (BCE/2021/1), vem o BdP publicar a Carta Circular n.ºCC/2023/00000041 (a “Carta Circular”).

A Carta Circular estabelece assim as datas de notificação e os calendários dos períodos de manutenção de reservas mínimas para 2024 e alteração da data de término do período de manutenção que iniciará a 20 de dezembro de 2023.

ALTERAÇÃO REGULAMENTAÇÃO DO FUNCIONAMENTO DO SISTEMA COMPONENTE NACIONAL DO TARGET (TARGET-PT)

Instrução n.º 25/2023, de 17 de novembro de 2023 - BdP

Após a publicação no JOUE da Orientação (UE) 2023/2415 do BCE, de 7 de setembro de 2023, que altera a Orientação (UE) 2022/912 relativa a um sistema de transferências automáticas transeuropeias de liquidação por bruto em tempo real de nova geração (TARGET) (BCE/2022/8) (BCE/2023/22), o BdP procedeu, com a presente Instrução n.º 25/2023, de 17 de novembro de 2023 (a “Instrução”), à alteração da Instrução n.º 16/2022, de 17 de outubro de 2022, que tinha implementado a Orientação (UE) 2022/912 do BCE, de 24 de fevereiro de 2022 (BCE/2022/8) (“Instrução 2022”).

No uso da sua competência estabelecida pelo artigo 14.º da Lei Orgânica do BdP (Lei n.º 5/98 de 31 de janeiro de 1998), o BdP publica a presente Instrução regulando o funcionamento do sistema nacional componente do TARGET (“TARGET PT”), alterando a Instrução 2022, entre outros, para:

  1. Clarificação da utilização por participantes e terceiros das marcas comerciais ligadas aos serviços Target (artigo 3.º da Instrução 2022);
  2. Imposição da não abertura de outras contas para além das contas TARGET aos participantes elegíveis para participar no TARGET aplicável a partir do momento de início de funcionamento do sistema de gestão de ativos de garantia do Eurosistema (Eurosystem Collateral Management System - ECMS) (Artigo 9.º da Instrução 2022);
  3. Introdução de medidas de mitigação para potenciais falhas de ligação dos Bancos Centrais ao TARGET (Artigo 19.º/6 e 31.º/ 1-A, da Instrução 2022);
  4. Clarificação das características das partes contactáveis designadas pelos sistemas periféricos que utilizam o TARGET Instant Payment Settlement (“TIPS”) (Artigo 7.º/1 do Anexo I da Instrução 2022);
  5. Implementação da Solução de Contingência, obrigatoriamente, a partir de 21 de março de 2025 (artigo 19.º/4 da Instrução 2022), obrigatória para todos os participantes considerados de importância primordial pelo Banco de Portugal e para os participantes que liquidem transações muito críticas; e
  6. Alteração do preçário das taxas aplicáveis aos titulares de contas de numerário dedicadas do serviço de TIPS (Secção 6 do apêndice VI da Instrução 2022), sendo aplicáveis a partir de 1 de janeiro de 2024.

A Instrução entrou em vigor a 20 de novembro de 2023.

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4. Fiscal

IRC - Eliminação da dupla tributação entre Portugal e Moçambique - DEDUÇÃO INTEGRAL DO IMPOSTO PAGO NA FONTE

Acórdão n.º 653/2023, de 10 de outubro de 2023 (Processo n.º 106/2023) - TC

No Acórdão em referência, o TC foi chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade da norma constante do artigo 91.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC, cuja aplicação foi recusada por um tribunal arbitral com fundamento na sua desconformidade com o disposto no artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da Convenção para Evitar a Dupla Tributação celebrada a República Portuguesa e a República de Moçambique (“CDT PT-MZ”).

O TC decidiu que:“[a] regra de dedução de imposto prevista no artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT não coincide com a regra prevista no artigo 91.º, n.º 1, alínea b), do Código do IRC, na redação introduzida pela Lei n.º 2/2014, de 16 de janeiro, conduzindo a resultados diferentes. Neste caso, permite-se a dedução de importância equivalente ao imposto pago no estrangeiro, impondo, porém, um limite a esse valor. Todavia, nos termos da CDT há lugar a dedução integral do imposto pago em Moçambique, determinado a partir dos rendimentos brutos ali obtidos, desde que a importância desse modo deduzida não ultrapasse os limites previstos naquela norma convencional.”

Nesta senda, concluiu o TC que “(...) a aplicação da regra prevista no Código do IRC, conduzindo a menor dedução (...) frustraria parcialmente o objetivo de total eliminação da dupla tributação em situações envolvendo Portugal e Moçambique, objetivo principal prosseguido pela convenção subscrita pelos dois países. Assim, considerando a prevalência do direito convencional sobre a lei ordinária, a aplicação da norma do CIRC deveria ser afastada, aplicando-se a norma constante da CDT PT-MZ.

O TC julgou, assim, o recurso interposto pelo MP totalmente improcedente e confirmou a decisão proferida pelo tribunal arbitral que recusou a aplicação do artigo 91.º, n.º 1, alínea b), do CIRC por desconformidade com o artigo 23.º, n.º 1, alínea a), da CDT PT-MZ.

IRC - PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA - REQUALIFICAÇÃO DE OPERAÇÕES AO ABRIGO DO PRINCÍPIO DA PLENA CONCORRÊNCIA

Acórdão de 8 de novembro de 2023 (Processo n.º 0134/10.3BEPRT) - STA

No presente acórdão, o STA foi chamado a pronunciar-se sobre a legalidade da (re)qualificação, pela AT, de duas operações realizadas entre entidades de um mesmo grupo, com recurso às normas de preços de transferência

A AT interpôs recurso para o STA de uma sentença proferida pelo tribunal administrativo e fiscal do Porto que havia julgado totalmente procedente uma impugnação judicial apresentada por um contribuinte contra as liquidações adicionais de IRC emitidas pela AT com base na referida requalificação.

Estava em causa a análise das seguintes operações realizadas no decurso dos anos de 2006 e 2007: (i) a realização pela sociedade “B” e a favor da sociedade “C” de prestações acessórias de capital, que não venciam juros; e, (ii)  a alienação onerosa, pela sociedade “B”, dos créditos associados àquelas prestações acessórias à sociedade “D”, com diferimento do preço.

A AT, invocando o  princípio da plena concorrência, constante do artigo 58.º do CIRC em vigor à data dos factos (correspondente ao atual artigo 63.º do CIRC), sustentou que (i) a realização de prestações acessórias de capital sem juros deveria ser reconfigurada como um contrato de mútuo oneroso; e, que (ii) o diferimento de pagamento do preço devido pela cessão onerosa dos créditos associados às prestações acessórias devia ser enquadrado como uma concessão de crédito onerosa, tendo, em consequência da referida requalificação, emitido liquidações adicionais de IRC, através das quais repercutiu e tributou os juros que, no entendimento da AT, deviam ter sido cobrados no âmbito das referidas operações.

O STA discordou do entendimento da AT, e decidiu que o regime de preços de transferência constante do artigo 58.º do Código do IRC (correspondente ao atual artigo 63.º do Código do IRC) aplicado pela mesma para requalificar as operações realizadas entre entidades de um mesmo grupo: “(...) é inadequado e juridicamente incapaz de sustentar” as correções promovidas pela AT e as liquidações adicionais de IRC emitidas.

O  STA rejeitou, assim, o recurso interposto pela AT e, em consequência, confirmou a sentença proferida pelo tribunal de primeira instância.

UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA - PEDIDO DE REVISÃO OFICIOSA - TERMO INICIAL DA CONTAGEM DOS JUROS INDEMNIZATÓRIOS

Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2023 de 16 de novembro de 2023 (Processo n.º 40/19.6BALSB) - STA

No acórdão em referência, o STA foi chamado a pronunciar-se sobre a questão do termo inicial da contagem de juros indemnizatórios nos casos em que seja iniciado procedimento de revisão oficiosa, na sequência de recurso com fundamento em oposição de julgados apresentado pela AT.

Na decisão arbitral proferida no processo 445/2018-T que foi objeto de recurso, o tribunal arbitral ordenou a anulação de uma decisão de indeferimento de pedido de revisão oficiosa relativo a liquidações adicionais em sede de Imposto do Selo e, em consequência, condenou a AT a restituir o imposto indevidamente pago pelo sujeito passivo, acrescido de juros indemnizatórios contados desde a data dos pagamentos efetuados até ao processamento do reembolso pela AT.

O STA admitiu o recurso apresentado pela AT e confirmou a posição expressa no acórdão que foi utilizado pela AT como acórdão fundamento, tendo uniformizado jurisprudência no sentido de que os juros indemnizatórios apenas deverão ser contados a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão oficiosa pelo contribuinte.

Em face do exposto, decidiu o STA julgar procedente o recurso apresentado pela AT e, em consequência, (i) ordenou a anulação da decisão arbitral na parte relativa ao termo inicial relevante para contagem dos juros indemnizatórios; e, (ii) uniformizou a jurisprudência nos seguintes termos: “só são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após o pedido de promoção da revisão oficiosa e até à data da emissão das respetivas notas de crédito a favor [do sujeito passivo]”.

IRS - IRC - Coeficientes de DESVALORIZAÇÃO DA MOEDA

Portaria n.º 340/2023, de 8 de novembro (DR 216, Série I, de 8 de novembro de 2023)

A Portaria em referência procede à atualização anual dos coeficientes de desvalorização da moeda a aplicar aos bens e direitos alienados durante o ano de 2023, para efeitos da correção monetária dos valores de aquisição de determinados bens e direitos, nos termos dos artigos 47.º do Código do IRC e 50.º do Código do IRS.

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5. Imobiliário

OPOSIÇÃO À RENOVAÇÃO CONTRATUAL EM CONTRATO DE UTILIZAÇÃO DE ESPAÇO EM MERCADO MUNICIPAL

Acórdão n.º 7/2023 (Processo n.º 48/21.1BALSB) - STA

O presente acórdão do STA uniformizou a jurisprudência conflituante nos seguintes termos: “Um contrato de utilização de espaço em mercado municipal em que foi estipulada, no âmbito da autonomia contratual das partes, uma cláusula que atribui apenas a uma delas (o Operador do espaço/loja) o direito de se opor à renovação do contrato no termo do prazo ou das suas renovações, é interpretável no sentido de vedar à contraparte o exercício desse mesmo direito de oposição à renovação”.

Ao fixar a jurisprudência nos termos supra referidos, o STA considerou não ser aplicável a contrato de utilização de espaço em mercado municipal o artigo 1080.º do CC, que estabelece a imperatividade do regime aplicável à resolução, à caducidade e à denúncia do arrendamento urbano, sustentando, alternativamente, a aplicabilidade do regime especial constante do artigo 1110.º, n.º 1, do CC, que, por sua vez, vincula o regime da duração, denúncia e oposição à renovação contratual, à vontade das partes. A posição assumida pelo STA encontra o seu fundamento na natureza especial do regime do arrendamento para fins não habitacionais, com acolhimento, desde logo, no próprio preceito do artigo 1080.º do CC, cuja parte final “salvo disposição legal em contrário” admite a não imperatividade do regime quando a lei assim o determine. Ora, não só o contrato de utilização de espaço em mercado municipal é um contrato atípico, tal como é referido pelo STA, como não se encontra abrangido pelo regime imperativo aplicável à oposição à renovação de contratos de arrendamento urbano.

Assim, prevalecendo a vontade das partes, e em face de estipulação contratual que admite apenas a uma das partes o direito de se opor à renovação, concluiu o STA neste acórdão uniformizador de jurisprudência (i) pela licitude da atribuição do direito de oposição à renovação apenas a uma das partes contratuais, e (ii) que essa atribuição resulta da correta interpretação da cláusula em análise, à luz dos cânones consagrados no Código Civil.

APOIO ÀS FAMÍLIAS. PAGAMENTO DA RENDA E DA PRESTAÇÃO DE CONTRATOS DE CRÉDITO

Decreto-Lei n.º 103-B/2023, de 9 de novembro (DR 217, Série I, de 9 de novembro de 2023)

O presente Decreto-Lei, além de clarificar o conceito de rendimento consagrado no Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 23 de março, e de criar mecanismos simplificados de validação de dados e de determinação do montante do apoio a atribuir, veio introduzir um reforço do apoio extraordinário à renda, sendo o montante mensal do apoio apurado, a partir de 1 de janeiro de 2024, com base no valor da renda mensal atualizado por um coeficiente de 1,0494.

Por seu turno, os arrendatários ou subarrendatários de habitação permanente que, em consequência da atualização da renda mensal, cumpram os requisitos previstos nos artigos 3.º e 4.º do Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 22 de março, a partir de 1 de janeiro de 2024, e não sejam beneficiários do apoio extraordinário à renda previsto no referido Decreto-Lei, poderão requerer um apoio financeiro correspondente à aplicação de um coeficiente de 1,0494 sobre o valor da renda mensal previamente à atualização.

PROGRAMA DE APOIO FINANCEIRO PORTA 65

Portaria n.º 346-A/2023, de 10 de novembro (DR 218, Série I, de 10 de novembro de 2023)

Este diploma altera a Portaria n.º 277-A/2010, de 21 de maio, que regulamenta o Programa de apoio financeiro Porta 65 (destinado ao apoio aos jovens no acesso ao arrendamento), (i) aumentando o valor da renda máxima admitida por tipologia, permitindo uma maior adequação à oferta de alojamentos atualmente existente no mercado de arrendamento; e (ii) dispensando os candidatos de apresentar informação sempre que essa possa ser obtida com recurso aos mecanismos de interoperabilidade estabelecidos entre o Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, I. P., as entidades das finanças e da segurança social e as demais entidades públicas competentes na matéria.

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6. Laboral

RETRIBUIÇÃO MENSAL MÍNIMA GARANTIDA – ATUALIZAÇÃO

Decreto-Lei n.º 107/2023, de 17 de novembro (DR Série I, de 17 de novembro de 2023)

A retribuição mínima mensal garantida para os trabalhadores a tempo completo é aumentada, em Portugal continental, de € 760,00 para € 820,00 com efeitos a 1 de janeiro de 2024.

SUBSÍDIO DE DESEMPREGO – BENEFÍCIO EXCECIONAL, VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E OUTRAS ALTERAÇÕES PONTUAIS

Decreto-Lei n.º 113/2023, de 30 de novembro (DR Série I, de 30 de novembro de 2023)

O Decreto-Lei n.º 113/2023, de 30 de novembro, vem, por um lado, estabelecer uma medida excecional de incentivo ao regresso ao trabalho para desempregados de longa duração (i.e., em situação de desemprego há mais de 12 meses), através da possibilidade de cumulação do subsídio de desemprego com rendimentos auferidos de trabalho, quando, cumulativamente:

  1. por meio de aceitação da oferta de emprego apresentada pelo IEFP, ou por meios próprios, celebrem contratos de trabalho a tempo completo: (a)sem termo, (b) a termo certo, com duração inicial igual ou superior a 12 meses, ou (c) a termo incerto, com duração previsível igual ou superior a 12 meses; e
  2. a retribuição do trabalho seja inferior à remuneração de referência do subsídio de desemprego (sem prejuízo da eventual atualização deste montante pelo limiar de valorização salarial definido no artigo 19.º-B, n.º 3, do EBF). A atribuição do benefício cessa sempre que a retribuição paga ao trabalhador ultrapasse este limite.

O Decreto-Lei em apreço vem definir as percentagens de atribuição do subsídio de desemprego durante o período de cumulação, que varia em função da modalidade de contrato celebrado, bem como do mês do período de concessão a que respeita (que se inicia sempre, pelo menos, a partir do 13.º mês de subsídio de desemprego):

  1. nos contratos sem termo: a percentagem varia entre os 65%, 45% e 25%, decrescendo ao longo do período de concessão (que se inicia no 13.º mês de atribuição do subsídio);
  2. nos contratos a termo certo e incerto: a percentagem é de 25% desde o 13.º mês de atribuição do subsídio, a menos que o contrato se converta em contrato sem termo, caso em que se passarão a aplicar as percentagens previstas para aquele tipo de contrato.

O benefício apenas pode ser usado uma vez por cada beneficiário; em todo o caso, não há cessação do benefício nos casos em que o trabalhador celebre um novo contrato de trabalho, de qualquer natureza ou modalidade, nos cinco dias úteis seguintes ao da data de término do contrato imediatamente anterior, e ainda não se tenha esgotado o período de concessão do subsídio de desemprego.

Por outro lado, o presente Decreto-Lei estipula o alargamento do subsídio de desemprego aos trabalhadores titulares do estatuto de vítima de violência doméstica que denunciem os contrato de trabalho, bem como aos trabalhadores independentes economicamente dependentes e aos trabalhadores independentes com atividade empresarial que sejam titulares daquele estatuto e venham, respetivamente, a cessar os contratos de prestação de serviços ou a atividade profissional.

Finalmente, o instrumento legislativo em análise vem ainda proceder a algumas alterações pontuais aos regimes de proteção em situação de desemprego, das quais se destacam as seguintes:

  • Trabalhadores independentes economicamente dependentes: a entidade contratante passa a ter de disponibilizar informação sobre a cessação involuntária do contrato de prestação de serviços, através de formulário próprio no site da segurança social, no prazo de cinco dias úteis a contar da data da cessação do contrato.
  • Responsabilidade pelo pagamento das prestações de desemprego: passa a prever-se que, nas situações em que a cessação do contrato de trabalho por acordo teve subjacente a convicção do trabalhador, criada pelo empregador, (i) de que a empresa se encontra em processo de reestruturação, viabilização ou recuperação da empresa, ou, ainda, em situação económica difícil (cf. artigo 10.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro) ou (ii) encontram preenchidas as condições previstas no n.º 4 daquele preceito (i.e., que o acordo foi celebrado como alternativa a um despedimento coletivo ou por extinção do posto de trabalho e que o empregador se encontrava dentro dos limites ali estabelecidos – vulgo, regime de “quotas”) e tal não se venha a verificar, o empregador apenas fica obrigado, perante a segurança social, ao pagamento do montante correspondente às prestações de desemprego efetivamente pagas ao trabalhador, quando anteriormente se previa que o empregador ficava obrigado à totalidade do período de concessão da prestação inicial de desemprego.

O presente Decreto-Lei entrou em vigor no passado dia 1 de dezembro de 2023.

PROGRAMA AVANÇAR – ALTERAÇÕES

Portaria n.º 390/2023 de 23 de novembro (DR Série I, de 23 de novembro de 2023)

A Portaria n.º 390/2023, de 23 de novembro (“Portaria 390/2023”), procede a duas alterações à Portaria 187/2023, de 3 de julho, que criou o Programa Avançar.

Por um lado, esta Portaria altera o requisito de remuneração mínima a atribuir aos trabalhadores, de € 1.330,00 para um valor igual ou superior ao nível remuneratório de entrada de um licenciado na carreira geral de técnico superior na Administração Pública (a partir de 2024, € 1.385,99).

Por outro lado, é criada uma nova categoria de majoração dos apoios financeiros concedidos às entidade empregadoras ao abrigo do Programa Avançar. Assim, são majorados em três vezes o valor do IAS (a partir de 1 de janeiro de 2024, € 509,26) os apoios à contratação quando esteja em causa um posto de trabalho numa empresa startup ou scaleup, nos termos definidos pela Lei n.º 21/2023, de 25 de maio.

A presente Portaria entra em vigor a 1 de janeiro de 2024.

JUSTA CAUSA DE RESOLUÇÃO – ASSÉDIO LABORAL – MOBBING

Acórdão de 7 de novembro de 2023 (Processo n.º 2687/22.4T8FAR.E1) - TRE

O Acórdão em apreço foi proferido no contexto de uma ação intentada por uma trabalhadora (“Autora”) para o reconhecimento da justa causa na resolução do contrato de trabalho que mantinha com a sua entidade empregadora (“”), fundamentada na prática de assédio moral (mobbing) desta contra a Autora, e consequente pedido de indemnização por danos não patrimoniais.

Em primeiro lugar, o TRE apreciou a questão da exceção de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho – invocada pela Ré –, que deve ser exercido no prazo de 30 dias a contar do conhecimento do facto que motiva a justa causa de resolução (conforme decorre do 395.º, n.º 1, do Código do Trabalho). Contudo, o TRE recordou que, nas situações de carácter continuado ou duradouro que se agravam com o decurso do tempo, o prazo de 30 dias só se conta a partir do momento em que a atuação do empregador assume uma gravidade tal que torna intolerável a subsistência da relação laboral para o trabalhador, pelo que, no caso concreto, o direito da Autora não teria caducado (apesar de estado de baixa médica no período de 13.06.2021 a 21.09.2021, e ter comunicado a resolução do contrato de trabalho por carta expedida a 18.10.2021).

Com efeito, demonstrou-se que a Autora foi vítima de um comportamento global de assédio praticado pela Ré, que culminou num quadro de ansiedade generalizada e baixa médica a partir de 13.06.2021, tendo havido necessidade de recurso a tratamento medicamentoso até início de 2022 e, para além disso, a Autora foi ainda alvo de marcação inopinada de férias a partir de 22.09.2021, sem qualquer consulta. Por conseguinte, considerou o TRE que a carta de resolução enviada a 18.10.2021 se encontrava dentro do prazo de 30 dias.

Em segundo lugar, o TRE debruçou-se sobre a existência de justa causa na resolução do contrato por iniciativa da Autora, recordando, desde logo, que o assédio moral, proibido pelo artigo 29.º do Código do Trabalho, exige a verificação de três requisitos, os quais, no caso vertente, estariam todos reunidos: (i) a prática de comportamentos hostis, humilhantes ou vexatórios; (ii) a reiteração destes comportamentos; e (iii) consequências na saúde física e psíquica da Autora e sobre o seu emprego.

Os comportamentos da Ré traduziram-se, nomeadamente, em insultos e comentários depreciativos constantes (nomeadamente, críticas à forma de vestir e à conduta da Autora enquanto mãe); borrifadelas com uma mistura de água e vinagre junto ao posto de trabalho da Autora; a já mencionada marcação unilateral de férias; e, ainda, na violação do regime de horário flexível aplicável à Autora.

Assim, o TRE veio a concluir que os comportamentos descritos, associados às consequências na saúde da Autora, foram violadores do núcleo essencial da sua dignidade pessoal e profissional, e que tal constituiu justa causa de resolução do contrato, conforme prescrito no artigo 394.º, n.º 2, als. b) e f) do Código do Trabalho, considerando também procedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais.

SUBSÍDIO DE DOENÇA (CESSAÇÃO POR SAÍDA NÃO AUTORIZADA DA RESIDÊNCIA) – INCONSTITUCIONALIDADE

Acórdão de 21 de novembro de 2023 (Processo n.º 578/2023) – TC

O acórdão reporta-se a um recurso de um trabalhador (“Recorrente”) em que este vem peticionar, no âmbito de um processo contra o Instituto da Segurança Social, I.P. (“Recorrido”), a declaração da inconstitucionalidade do artigo 24.º, n.º 2, al. a), do Decreto-Lei n.º 28/2004, de 4 de fevereiro (“DL 28/2004”), segundo a qual “o direito ao subsídio de doença cessa quando o beneficiário não tiver apresentado justificação atendível da ausência de residência, sem autorização médica expressa.

Na ação em apreço, discutiu-se a possibilidade de esta norma restringir o direito ao subsídio de doença e, consequentemente, o direito fundamental à segurança social, previsto no artigo 63.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”).

Em concreto, o Recorrente veio defender judicialmente a inconstitucionalidade da norma com fundamento (i) na inexistência de um interesse constitucionalmente protegido que servisse de fundamento à restrição; e (ii) na violação do princípio da proporcionalidade presente no artigo 18.º da CRP.

Na sua resposta, o TC rejeitou o primeiro argumento do Recorrente, uma vez que o fundamento constitucional da norma em questão resulta do próprio artigo 63.º da CRP, na medida em que do mesmo se retira que incumbe ao Estado organizar, coordenar e subsidiar um sistema de segurança social, o que implica, necessariamente, garantir a eficiência e sustentabilidade financeira do sistema público da Segurança Social.

Apesar disto, considerou o TC que a norma em questão viola o princípio da proporcionalidade, na vertente do subprincípio da necessidade, uma vez que o legislador poderia ter concebido medidas alternativas menos gravosas e com um nível de eficácia semelhante (por exemplo, ao invés de um sistema de “cessação total do subsídio de doença, logo na primeira situação de inobservância”, poderia ter sido concebido um sistema gradativo, em que se verificasse apenas a perda parcial do subsídio ou, por outro lado, a convocação para uma avaliação médica extraordinária).

Em suma, o TC considerou o recurso procedente e julgou a norma sob análise inconstitucional, na interpretação segundo a qual o direito ao subsídio de doença cessa quando o beneficiário não tiver apresentado justificação atendível da ausência da residência, sem autorização médica expressa, com fundamento na violação do princípio da proporcionalidade.

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7. Público

FINANCIAMENTO DA TARIFA SOCIAL – ALTERAÇÕES

Decreto-Lei n.º 104/2023, de 17 de novembro (DR 223, Série I, de 17 de novembro de 2023)

O Decreto-Lei n.º 104/2023, de 17 de novembro (“Decreto-Lei 104/2023”) veio alterar o financiamento da tarifa social, aprovada inicialmente pelo Decreto-Lei n.º 138-A/2010, de 28 de dezembro.

A tarifa social pretende garantir que todos os consumidores têm acesso ao serviço essencial de fornecimento de energia elétrica e, desde a sua aprovação, que tem sido suportada inteiramente pelos centros electroprodutores.

Deste modo, destacamos as seguintes alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 104/2023:

  1. Aumento da incidência subjetiva da tarifa social, passando a abranger, para além de titulares de centros eletroprodutores, também os comercializadores de energia elétrica e os demais agentes de mercado na função de consumo.
  2. O cálculo do montante das contribuições para o financiamento da tarifa social para os comercializadores e demais agentes de mercado na função de consumo é feita consoante a proporção da energia da RESP utilizada.
  3. As entidades financiadoras da tarifa social têm deveres de reporte específico, através de um reporte mensal dos valores relativos à incidência ao gestor global do Sistema Elétrico Nacional. O incumprimento de deveres de reporte constitui uma contraordenação punível nos termos da alínea j) do n.º 3 do artigo 28.º da Lei n.º 9/2013, de 28 de janeiro.

O presente diploma entrou em vigor no dia 18 de novembro de 2023.

VISTOS E TÍTULOS DE RESIDÊNCIA - PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE VALIDADE

Decreto-Lei n.º 109/2023, de 24 de novembro (DR 228, Série I, de 24 de novembro de 2023)

Com vista a acautelar a transição de competências em matéria administrativa no âmbito da restruturação do sistema português de controlo de fronteiras, nomeadamente com a criação da Agência para a Integração, Migrações e Asilo, I. P. (“AIMA”), o Decreto-Lei em referência alterou o artigo 16.º do Decreto-Lei 10-A/2020, de 13 de março, com vista a prorrogar a validade de determinados documentos relativos à permanência em território nacional.

O referido diploma estabeleceu que todos os documentos e vistos relativos à permanência em território nacional que tenham expirado a partir de 25 de novembro de 2023, assim como nos quinze dias imediatamente anteriores, serão aceites, nas mesmas condições, até 30 de junho de 2024. Adicionalmente, esses documentos continuarão a ser aceites após essa data se o titular comprovar que agendou a respetiva renovação.

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