Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português

25 de fevereiro de 2025


1. Contencioso Civil e Penal

  •  Aval em Livrança em Branco

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2. Concorrência

  • TJUE - Auxílios de Estado - Zona Franca da Madeira

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3. Direito Digital

  • Governação europeia de dados
  • Interação entre a proteção de dados e o direito da concorrência

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4. Financeiro

  • Circular da CMVM relativa ao value for money de instrumentos financeiros

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5. Fiscal

  • IRS - Trabalho Dependente e Pensões Auferidas por Titulares Residentes na Região Autónoma dos Açores - Tabelas de Retenção na Fonte para o Ano de 2025
  • IRC - Modelo 22 - Declaração Periódica de Rendimentos
  • IRS - Trabalho Dependente e Pensões Auferidas por Titulares Residentes em Portugal Continental - Tabelas de Retenção na Fonte para o Ano de 2025
  • IRS - Mais-Valias Obtidas por Residente Fiscal Não Habitual com a Venda de Ações de Pequenas Empresas Qualificadas sediadas nos Estados Unidos da América
  • IRS - Dividendos Pagos por Empresa Localizada nos Emirados Árabes Unidos a um Residente Fiscal Não Habitual

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6. Laboral

  • Trabalho Igual, Salário Igual – Discriminação Salarial
  • Assédio Laboral - Factos Constitutivos
  • Responsabilidade Solidária por Contraordenação Laboral – Interpretação do Artigo 551.º, n.º 4, do Código do Trabalho

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1. Contencioso Civil e Penal

AVAL EM LIVRANÇA EM BRANCO

Acórdão n.º 1/2025 (DR 5, Série I, de 8 de janeiro de 2025) - STJ

Em 2021, a Caixa Geral de Depósitos preencheu a livrança em branco que garantia um cartão de crédito emitido a favor da empresa “Euronetworks” e instaurou uma ação executiva contra os avalistas, que eram os sócios dessa mesma empresa.

Em sede de embargos de executado, um dos avalistas requereu a extinção da execução contra si movida com fundamento no facto de não ter utilizado o cartão de crédito associado à livrança em apreço e ter solicitado o cancelamento do mesmo, entregando-o à exequente, antes de ceder a sua participação na empresa avalizada.

Confrontadas com a questão, as instâncias proferiram decisões contraditórias, sendo os embargos julgados improcedentes pela primeira instância e procedentes pelo Tribunal da Relação de Lisboa.

Chamado a pronunciar-se, o STJ conclui que a denúncia do aval em branco é possível até ao preenchimento do título, desde que o vínculo não tenha prazo definido, pese embora a denúncia tenha apenas eficácia ex nunc, afetando apenas responsabilidades futuras, ou seja, crédito concedido ao avalizado após a desvinculação produzir os seus efeitos.

Deste modo, o STJ uniformizou jurisprudência nos seguintes termos: “A vinculação para aval prestada em livrança em branco é, desde que assumida sem prazo ou por prazo renovável, decorrido o prazo inicial, suscetível de denúncia, pelo vinculado para aval que tenha deixado de ser sócio ou sócio-gerente da avalizada, até ao preenchimento do título. A denúncia só produzirá efeitos para o futuro, ou seja, a desvinculação só será eficaz em relação a montantes que venham a ser solicitados após a denúncia produzir os seus efeitos.

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2. Concorrência

TJUE NEGA PROVIMENTO AO RECURSO DA REGIÃO AUTÓNOMA DA MADEIRA SOBRE A ZONA FRANCA DA MADEIRA

Acórdão de 16 de janeiro de 2025 (Processo C-547/23 P) - TJUE

Em 16 de janeiro de 2025, o TJUE negou provimento ao recurso da Região Autónoma da Madeira (RAM) contra uma decisão do TG. Este acórdão do TJUE insere-se numa série de decisões que versam sobre a legalidade dos auxílios fiscais facultados pela República Portuguesa no âmbito da Zona Franca da Madeira (ZFM). A CE considerou este regime incompatível com o mercado interno, conforme a sua decisão de 4 de dezembro de 2020, exigindo-se que o Estado, em particular as autoridade tributárias, procedesse à recuperação dos auxílios concedidos indevidamente às empresas beneficiárias [1].

Com efeito, o regime de auxílios da ZFM, foi aprovado pela CE para promover o desenvolvimento regional e a diversificação económica da Madeira e correspondia, essencialmente, a uma redução do IRC. No entanto, a CE concluiu que poderiam ter sido considerados para efeitos deste regime postos de trabalho criados fora da ZFM e que o escopo da redução final poderá ter excedido o das atividades efetiva e materialmente exercidas na Madeira.

A República Portuguesa, a RAM e várias empresas contestaram a decisão da CE perante o TG. Até à data, o TG negou provimento a todos os recursos e manteve a decisão da CE [2]. Na sequência destes indeferimentos, a República Portuguesa, a RAM e várias empresas interpuseram recursos para o TJUE, que, entretanto, decidiu contra os recursos da República Portuguesa [3] e da RAM. O presente acórdão diz respeito ao recurso da RAM.

O TJUE analisou diversos fundamentos apresentados pela RAM, incluindo alegações de erros de direito e de facto cometidos pela CE, e a alegada violação dos princípios da confiança legítima e da segurança jurídica. O TJUE concluiu que a CE não cometeu erros ao interpretar que os benefícios fiscais em causa só poderiam aplicar-se a lucros de atividades realizadas na Madeira, e que o método adotado pelas autoridades portuguesas não permitia verificar a veracidade ou a permanência dos postos de trabalho; concluindo, assim, que a decisão de devolução dos auxílios foi uma consequência proporcionada da declaração de incompatibilidade dos mesmos com o mercado interno.

Nestes termos, o TJUE negou provimento ao recurso da RAM, confirmando a decisão da CE e a necessidade de recuperar os auxílios concedidos no âmbito do regime da ZFM.

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3. Direito Digital

GOVERNAÇÃO EUROPEIA DE DADOS

Decreto-Lei n.º 2/2025, de 23 de janeiro (DR 16, Série I, de 23 de janeiro de 2024)

Foi publicado o Decreto-Lei n.º 2/2025, de 23 de janeiro (“Decreto-Lei n.º 2/2025”), que executa o Regulamento (UE) 2022/868, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2022, relativo à governação europeia de dados (“Regulamento (UE) 2022/868”). O Regulamento (UE) 2022/868 visa regulamentar a reutilização, na União Europeia, de determinadas categorias de dados (pessoais e não pessoais) detidos por organismos do setor público, estabelecendo um regime de notificação e supervisão para a prestação de serviços de intermediação de dados, bem como um regime para o registo voluntário das entidades que recolhem e tratam os dados disponibilizados para fins altruístas, e um regime para a criação de um Comité Europeu de Inovação em Dados.

O Decreto-Lei n.º 2/2025 define o regime sancionatório decorrente do disposto no Regulamento (UE) 2022/868, atribui competências específicas a um conjunto de entidades nacionais, conferindo, entre outras, à Agência para a Modernização Administrativa, I.P. (AMA) a competência de apoiar os organismos do setor público que concedem ou recusam acesso para fins de reutilização de dados, nomeando-a ponto de informação única e à Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM) a competência em matéria de serviços de intermediação de dados, bem como a Secretaria-Geral do Governo como a autoridade competente em matéria de registo das organizações de altruísmo de dados. Além disso, o Decreto-Lei n.º 2/2025 define um conjunto de mecanismos para facilitar a reutilização de dados, ao mesmo tempo que estabelece procedimentos para que terceiros possam ter acesso a esses dados de forma segura. Este diploma regula ainda a atividade dos prestadores de serviços de intermediação de dados, bem como promove o altruísmo de dados através da criação de estruturas que facilitam a partilha voluntária de dados entre indivíduos e organizações.

INTERAÇÃO ENTRE O DIREITO À PROTEÇÃO DE DADOS E O DIREITO DA CONCORRÊNCIA

Posição escrita do Comité Europeu para a Proteção de Dados de 16 de janeiro de 2025, relativo à interação entre a proteção de dados e o direito da concorrência

O Comité Europeu para a Proteção de Dados (“CEPD”) publicou, no passado dia 16 de janeiro, uma Posição escrita (position paper) sobre a interação entre a proteção de dados e o direito da concorrência na União Europeia, pretendendo sublinhar a necessidade e a relevância de uma abordagem coordenada entre as duas áreas.

Embora a legislação em matéria de proteção de dados e de concorrência se destine a prosseguir objetivos diferentes através de quadros e domínios jurídicos distintos, a verdade é que ambas apresentam alguns pontos em comum, de onde se destacam a proteção dos indivíduos e das suas escolhas em mercados justos e eficientes. A crescente centralidade dos dados pessoais na economia digital levanta desafios que exigem uma abordagem e uma aplicação coerentes das normas de proteção de dados e de concorrência para evitar contradições e lacunas.

Neste contexto, o CEDP refere expressamente o acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia no caso C-252/21 (Meta vs. Bundeskartellamt), de 4 de julho de 2023, que clarifica que as autoridades da concorrência podem considerar o cumprimento do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (“RGPD”) ao analisar práticas anti concorrenciais, sendo certo que este reconhecimento não substitui as competências exclusivas das autoridades de proteção de dados para interpretar e aplicar o RGPD.

O CEPD destaca que o nível de cooperação entre as autoridades nacionais de proteção de dados e de concorrência não é uniforme entre os Estados-Membros, sendo certo que para colmatar essa lacuna recomenda o estabelecimento de equipas de coordenação dentro de cada autoridade e a designação de pontos de contacto específicos para facilitar a comunicação interinstitucional. Além disso, sugere também que as autoridades desenvolvam competências básicas no sentido de conhecer os quadros regulatórios das demais autoridades, promovendo uma cooperação eficaz e uma aplicação mais consistente e harmonizada das normas.

Com esta abordagem, o CEPD pretende garantir que as autoridades de proteção de dados possam considerar o impacto económico das suas decisões e que as autoridades de concorrência integrem considerações sobre privacidade e proteção de dados nas suas avaliações. O objetivo final é reforçar a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos e assegurar um mercado digital mais equilibrado e transparente.

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4. Financeiro

CIRCULAR DA CMVM RELATIVA AO VALUE FOR MONEY DE INSTRUMENTOS FINANCEIROS

Circular 001/2025, de 27 de janeiro 2025

A Circular 001/2025, relativa ao value for money de instrumentos financeiros, foi publicada pela Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (“CMVM”), no dia 27 de janeiro de 2025 (“Circular 001/2025”), com o objetivo de incentivar os intermediários financeiros a oferecer produtos que tenham value for money para proteger os investidores e fomentar a aplicação racional das poupanças em instrumentos financeiros associados ao mercado de capitais.

Os aspetos identificados nesta circular resultam de práticas observadas no âmbito de ações de supervisão da CMVM e procuram assegurar o cumprimento do quadro normativo vigente em matéria de governo de produto, alinhando-se com os deveres resultantes do Código dos Valores Mobiliários e com as orientações da European Securities and Markets Authority relativas aos requisitos da Diretiva 2014/65/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio, (conhecida como Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros ou DMIF II).

Neste sentido, a CMVM indica que (i) os custos e encargos não devem comprometer as expectativas de retorno dos instrumentos financeiros, e (ii) tais instrumentos devem ser compatíveis com as necessidades do mercado-alvo identificado e a sua distribuição só deve ocorrer se tal estiver de acordo com o interesse do cliente.

Em primeiro lugar, relativamente à consideração da estrutura de custos proposta para o instrumento financeiro, os intermediários financeiros, que atuem na qualidade de produtores, devem ter em consideração a estrutura de custos proposta para o instrumento financeiro, analisando, designadamente, se os custos e encargos do instrumento financeiro são adequados ao perfil do mercado-alvo e não comprometem a rendibilidade esperada do instrumento financeiro. A título exemplificativo, são indicadas algumas boas práticas nesta matéria, das quais destacamos:

  • A elaboração de documentação interna que fundamente e concretize a adequação e consistência dos custos e encargos dos instrumentos financeiros com as necessidades do mercado-alvo ao qual se destina;
  • Para intermediários financeiros que atuem na qualidade de produtores, a realização de análises de cenários na fase de conceção do produto, que avaliem a coerência entre os custos e o retorno potencial do produto; e
  • A garantia de que a adoção de regras internas sobre custos e encargos tem como efeito assegurar que os custos e encargos não comprometem as expectativas de retorno do instrumento financeiro.

Em segundo lugar, em relação à análise da compatibilidade entre as necessidades do mercado-alvo e a distribuição de instrumentos financeiros, o intermediário financeiro deve (i) compreender os instrumentos financeiros que distribui, (ii) avaliar a compatibilidade desses instrumentos financeiros com as necessidades dos clientes aos quais presta serviços de investimento, tendo em conta o mercado-alvo identificado nos termos da respetiva política e os procedimentos internos de aprovação dessa distribuição e (iii) assegurar que os instrumentos financeiros apenas são distribuídos caso exista interesse do cliente. Nesta ótica, de forma exemplificativa, a CMVM esclarece que não constituem boas práticas os procedimentos seguintes:

  • A distribuição de instrumentos financeiros com elevados custos e encargos iniciais para investidores com um horizonte de investimento curto; e
  • A oferta de produtos cujos cenários mais favoráveis passam pelo reembolso automático (autocall) no curto prazo, combinados com maturidades máximas longas, com custos e encargos proporcionalmente mais elevados, que não ponderam o perfil do mercado-alvo.

Relativamente às sociedades gestoras, apesar de os deveres de aprovação de produção e distribuição de instrumentos financeiros previstos no Código dos Valores Mobiliários não lhes serem aplicáveis, a CMVM recomenda a adoção de equivalentes procedimentos de governo de produto, de forma a reforçar a proteção ao investidor.

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5. Fiscal

IRS - TRABALHO DEPENDENTE E PENSÕES AUFERIDAS POR TITULARES RESIDENTES NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES - TABELAS DE RETENÇÃO NA FONTE PARA O ANO DE 2025

Despacho n.º 1103-A/2025, de 23 de janeiro (DR 16, Série II, Suplemento, de 23 de janeiro de 2025)

Através do presente despacho e em cumprimento do disposto no Código do IRS, são aprovadas novas tabelas de retenção na fonte para os rendimentos do trabalho dependente e de pensões auferidas por titulares residentes na Região Autónoma dos Açores, referidas nos artigos 99.º-C e 99.º-D do referido diploma legal, bem como do disposto no artigo 4.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/99/A, de 20 de janeiro, na redação conferida pelo Decreto Legislativo Regional n.º 15-A/2021/A, de 31 de maio. Estas tabelas serão aplicáveis aos rendimentos pagos ou disponibilizados a partir de 1 de janeiro de 2025.

IRC - MODELO 22 - DECLARAÇÃO PERIÓDICA DE RENDIMENTOS

Despacho n.º 422/2025, de 9 de janeiro (DR 6, Série II, de 9 de janeiro de 2025)

O despacho em referência aprova a declaração periódica de rendimentos modelo 22, respetivos anexos e instruções de preenchimento, na sequência das alterações legislativas ocorridas em 2024.

IRS - TRABALHO DEPENDENTE E PENSÕES AUFERIDAS POR TITULARES RESIDENTES EM PORTUGAL CONTINENTAL - TABELAS DE RETENÇÃO NA FONTE PARA O ANO DE 2025

Despacho n.º 236-A/2025, de 6 de janeiro (DR 3, Série II, Suplemento, de 6 de janeiro de 2025)

O referido despacho aprova as tabelas de retenção na fonte aplicáveis aos rendimentos do trabalho dependente e pensões auferidas por titulares residentes em Portugal Continental para vigorarem durante o ano de 2025, assim como revoga as tabelas de retenção na fonte aprovadas pelo Despacho n.º 9971-A/2024, de 27 de agosto.

IRS - MAIS-VALIAS OBTIDAS POR RESIDENTE FISCAL NÃO HABITUAL COM A VENDA DE AÇÕES DE PEQUENAS EMPRESAS QUALIFICADAS DOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA

Informação Vinculativa n.º 27218, com despacho de 22 de janeiro de 2025 - AT

Na informação vinculativa em referência, a AT analisou o enquadramento tributário de mais-valias resultantes da venda de ações de pequenas empresas qualificadas (“PEQ”) localizadas nos Estados Unidos da América (“EUA”), ao abrigo da Convenção para Eliminar a Dupla Tributação Internacional (“CDT”) celebrada entre Portugal e os EUA, obtidas por um residente fiscal não habitual (“RNH”) em Portugal.

Em concreto, o requerente do pedido de informação vinculativa é um cidadão norte-americado inscrito como residente fiscal não habitual em Portugal e estão em causa mais valias resultantes da venda de valores mobiliários (ações) detidas em PEQ que, nos termos da legislação interna dos EUA, estão excluídas de tributação, se forem detidas no mínimo durante 5 anos, que é precisamente o caso do requerente.

Como afirmou a AT na informação vinculativa em referência, caso os rendimentos de mais valias se enquadrem no n.º 3 do artigo 14º da CDT celebrada entre Portugal e os EUA em conjugação com o disposto no n.º 5 do artigo 81º do Código do IRS, os mesmos ficarão isentos de tributação em Portugal. Já se os rendimentos resultantes de mais valias forem enquadrados no n.º 6 do artigo 14º da CDT celebrada entre Portugal e os EUA, então não deverá aplicar-se a isenção prevista no n.º 5 do artigo 81º do CIRS, uma vez que nos termos da referida norma da CDT a competência tributária é exclusiva do Estado da residência, excluindo a possibilidade de tributação no Estado da fonte.

E: (i) após enquadrar os rendimentos de mais-valias mobiliárias no artigo 14.º, n.º 6, da Convenção celebrada entre Portugal e os EUA, nos termos do qual: “os ganhos provenientes da alienação de quaisquer outros bens diferentes dos mencionados nos números 1 a 5 só podem ser tributados no Estado Contratante de que o alienante é residente”; e, (ii) alegar que a exceção que o protocolo da CDT em causa contempla quanto à possibilidade de os EUA tributarem os cidadãos com nacionalidade norte-americana independentemente do local onde são obtidos os seus rendimentos, concluiu a AT que a isenção de IRS prevista no n.º 5 do artigo 81.º do Código do IRS não tem aplicação. 

IRS - DIVIDENDOS PAGOS POR EMPRESA LOCALIZADA NOS EMIRADOS ÁRABES UNIDOS A UM RNH

Informação Vinculativa n.º 27576, com despacho de 22 de janeiro de 2025- AT

Na referida informação vinculativa, a AT emitiu pronúncia sobre a aplicabilidade da CDT entre Portugal e Emirados Árabes Unidos (“EAU”) e, em particular, do artigo 10.º (dividendos) da referida convenção, aos dividendo pagos por uma emprega dos EAU.

A AT começou por afirmar que da referida norma resulta que o requerente poderá beneficiar do método da isenção constante do artigo 81.º, n.º 5, do Código do IRS, no tocante aos rendimentos que venha a auferir (na qualidade de beneficiário efetivo), com a natureza de dividendos (categoria E), pago por uma sociedade residente nos EAU, jurisdição com a qual Portugal celebrou CDT.

Nos termos do artigo 10,º da referida CDT, ambos os Estados Contratantes (Portugal e EAU) podem exercer o respetivo poder tributário, motivo pelo qual os dividendos distribuídos por empresa dos EAU podem ser tributados nos EAU (para a aplicação do método de isenção, basta a mera possibilidade de ocorrer a tributação, independentemente da sua efetivação objetiva, sendo irrelevante que os EAU integrem a lista das jurisdições com regimes de tributação privilegiada em virtude de existir CDT celebrado com Portugal).

No entanto, a AT entendeu que o requerente não poderia beneficiar do método de isenção aplicável aos RNHs em Portugal na medida em que o objetivo principal do negócio jurídico em causa era o aproveitamento do benefício fiscal.

Para justificar a sua posição, a AT começa por chamar à colação os n.ºs 1 e 3 do artigo 27.º da CDT celebrada entre Portugal e os EAU, relativos ao direito aos benefícios, que estabelecem, por um lado, que as disposições da CDT não serão interpretadas de modo a impedir a aplicação por um Estado Contratante das disposições anti-abuso previstas na sua legislação interna, e, por outro lado, que as disposições da CDT não serão aplicáveis se “(…) o objetivo principal ou um dos objetivos principais de qualquer pessoa associada à criação ou à atribuição de um bem ou direito em relação com o qual o rendimento é pago for o de beneficiar das referidas disposições por meio dessa criação ou atribuição.”

No caso, entendeu a AT que é o próprio requerente que reconhece que a aquisição da sociedade depende da confirmação de que pode aproveitar o método de isenção aplicável aos RNHs em Portugal e que, por conseguinte, fica claro, no entendimento da AT, que o objetivo principal do requerente (ou um dos principais) é o aproveitamento daquele benefício.

A AT concluiu, assim, que as disposições da Convenção não serão aplicáveis ao requerente do pedido de informação vinculativa em resultado da aplicação do disposto no n.º 3 do artigo 27.º da CDT e que, por conseguinte, não se aplicando o disposto no artigo 10.º da CDT Portugal EAU, os rendimentos em causa não são passíveis de tributação nos EAU, o que concomitantemente afasta aplicabilidade do método da isenção previsto no regime dos RNHs.

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6. Laboral

TRABALHO IGUAL, SALÁRIO IGUAL – DISCRIMINAÇÃO SALARIAL

Acórdão de 9 de janeiro de 2025 (Processo n.º 5088/23.3T8VNF.G1) - TRG

O presente Acórdão foi proferido pelo TRG no contexto de uma ação intentada por dois trabalhadores (“Autores”) contra a sua entidade empregadora (“”) com fundamento em alegada discriminação salarial. Conforme invocado pelos Autores, ao passo que dois colegas do mesmo departamento, com funções, tarefas, horários e local de trabalho iguais, recebiam um acréscimo de 100% por cada hora trabalhada durante o fim de semana (com um acréscimo adicional de 25% se prestada em horário noturno), os Autores, que também prestavam trabalho durante o fim de semana, não tinham direito a tal majoração, auferindo, ao invés, um subsídio de turno no montante mensal correspondente a 35% da respetiva retribuição base.

Os artigos 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa e 23.º e seguintes e 270.º do Código do Trabalho contemplam o princípio “trabalho igual, salário igual”. À luz deste princípio, salvo justificação razoável e objetiva para a diferença de tratamento (por exemplo, habilitações, produtividade ou antiguidade), trabalhadores nas mesmas condições, que prestem funções de igual natureza, com a mesma qualidade e quantidade, devem ser retribuídos do mesmo modo.

No caso concreto, o TRG considerou que os Autores e os dois colegas desempenhavam funções idênticas em termos de natureza (com o mesmo nível de perigosidade, penosidade, no mesmo local de trabalho e com os mesmos meios de trabalho), quantidade (nos mesmos períodos horários e sob as mesmas condições, com igual volume e intensidade de trabalho) e qualidade (eficiência e produtividade semelhantes). Nesse sentido, uma vez demonstrado o trabalho igual e a existência de uma diferenciação salarial, competia à Ré demonstrar a verificação de uma circunstância racional e razoável que justificasse a diferença salarial.

Apesar de a Ré ter utilizado a diferença de antiguidades como argumento para justificar a diferença salarial entre os Autores e os dois colegas, o TRG esclareceu que dado que este fator não tinha sido determinante no momento da atribuição da majoração aos colegas (i.e., 2002), não podia servir agora para a justificar.

O TRG afastou ainda o argumento de que a diferenciação salarial poderia resultar das condições e flutuações estruturais do mercado, designadamente da maior ou menor dificuldade em contratar profissionais para determinados horários e locais de trabalho, em cada momento. No entendimento do TRG, a inexistência de dificuldade em encontrar trabalhadores para trabalhar ao fim de semana aquando da admissão dos Autores não podia servir para justificar o tratamento salarial diferenciado dos mesmos face aos colegas, já que a prestação de trabalho ao fim de semana impactava, de igual forma, os Autores e os colegas, que se encontravam alocados aos mesmos turnos.

Em resultado, o Acórdão considerou que a diferença salarial entre os Autores e os seus colegas de trabalho era infundada e, nessa medida, discriminatória.

ASSÉDIO LABORAL - FACTOS CONSTITUTIVOS

Acórdão de 15 de janeiro de 2025 (Processo n.º 1066/20.2T8AVR.P1.S1) - STJ

O Acórdão em apreço foi proferido pelo STJ no âmbito de uma ação intentada por um trabalhador (“Autor”) com vista ao reconhecimento da justa causa de resolução, por sua iniciativa, do contrato de trabalho que mantinha com a respetiva entidade empregadora (“”), com fundamento na alegada prática de assédio moral (mobbing) por parte desta.

Na situação em causa, o Autor já havia enfrentado dois despedimentos ilícitos sucessivos promovidos pela Ré e teve, inclusive, de interpor ação executiva para obter as prestações a cujo pagamento a Ré tinha sido condenada na sequência da declaração de ilicitude do segundo despedimento. Atendendo a este histórico, o STJ entendeu que se exigia que a Ré tivesse agido com especial cuidado e de boa-fé para evitar a criação de um ambiente intimidativo, hostil, degradante e desestabilizador para o Autor, o que não sucedeu.

Pelo contrário, após o segundo despedimento, a Ré violou o direito do Autor à ocupação efetiva, esvaziou-o das suas funções, confinou o seu posto de trabalho a uma mesa de refeições junto à zona de lavandaria, obstruiu-lhe o acesso a informação relevante, nomeadamente relativa às políticas de remuneração variável e de incentivos, e impediu-o de participar em reuniões de trabalho, tratando-o de modo desigual face aos seus colegas.

Face ao exposto, o STJ concluiu que a conduta da Ré tinha configurado assédio moral, esclarecendo que a lei não exigia a intenção do empregador de criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante e desestabilizador para o Autor como condição necessária para caracterizar uma situação como assédio moral, sendo suficiente que a conduta do empregador tenha tido esse resultado.

O STJ acrescentou ainda que a apreciação da existência de assédio moral deve ter em conta a conduta do empregador no seu conjunto, dado que, embora determinados comportamentos, quando isoladamente considerados, possam parecer insignificantes ou até lícitos, a sua cumulação pode levar à criação de uma situação de assédio moral.

Nesse sentido, o STJ decretou que as condutas praticadas pela Ré configuravam uma situação de assédio moral, constituindo justa causa de resolução do contrato de trabalho pelo Autor, conforme prescrito no artigo 394.º, n.º 2, alíneas b) e f), do Código do Trabalho.

RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA POR CONTRAORDENAÇÃO LABORAL – INTERPRETAÇÃO DO ARTIGO 551.º, N.º 4, DO CÓDIGO DO TRABALHO

Acórdão de 11 de dezembro de 2024 (Processo n.º 555/23) - TC

O presente Acórdão foi proferido pelo TC em sede de recurso de constitucionalidade interposto pelo Ministério Público de uma decisão do Tribunal Judicial da Comarca do Porto, que rejeitou a aplicação da norma do artigo 551.º, n.º 4 do Código do Trabalho, com fundamento na sua inconstitucionalidade.

O artigo 551.º, n.º 4, do Código do Trabalho, estabelece um regime de responsabilidade solidária do contratante e do dono da obra, empresa ou exploração agrícola, bem como dos respetivos gerentes, administradores ou diretores, assim como das sociedades que com o contratante, dono da obra, empresa ou exploração agrícola se encontrem em relação de participações recíprocas, de domínio ou de grupo, (i) pelo cumprimento das disposições legais e por eventuais violações cometidas pelo subcontratante que executa todo ou parte do contrato nas instalações daquele ou sob responsabilidade do mesmo, e (ii) pelo pagamento das respetivas coimas.

De acordo com a decisão do Tribunal de 1.ª Instância, a referida norma era inconstitucional porque determinava a transmissão de responsabilidade contraordenacional (e não apenas pelo pagamento da coima aplicada, como sucede com o n.º 3 do mesmo artigo) sem permitir a sua exclusão ou afastamento, em violação do princípio constitucional da intransmissibilidade da responsabilidade penal consagrado no artigo 30.º, n.º 3, da CRP.

Porém, oTC, discordando do tribunal recorrido, concluiu que o artigo 551.º, n.º 4, do Código do Trabalho não pretendia transmitir para as entidades nele identificadas a responsabilidade pela prática de uma infração cometida por terceiros, mas sim corresponsabilizá-las pelo cumprimento das normas legais aplicáveis, nas situações em que o contrato (ou parte dele) fosse executado nas suas instalações ou sob a sua responsabilidade.

Acrescentou o TC que uma tal corresponsabilização implica que estas entidades respondam não só pelas violações diretamente por si cometidas, mas também pelas que resultem da omissão dos deveres de fiscalização e controlo, ainda que cometidas pelo subcontratante, pelo que lhes compete adotar um comportamento ativo e diligente no sentido de assegurar o cumprimento da legislação aplicável, presumindo-se a falta de diligência sempre que o subcontratante viole as disposições legais aplicáveis e essa violação constitua contraordenação.

Por conseguinte, e atentas as finalidades sociais da norma do artigo 551.º, n.º 4, do Código do Trabalho, o TC entendeu que a mesma, sendo constitucional, deveria, em todo o caso, ser alvo de uma interpretação adequada que admita que o contratante possa alegar e demonstrar que agiu com a diligência devida para que a infração não fosse cometida, afastando, assim, a presunção legal de responsabilidade.

Nestes temos, o TC decidiu interpretar a norma do artigo 551.º, n.º 4, do Código do Trabalho no sentido de: “a contratante é solidariamente responsável pelo cumprimento das disposições legais e por eventuais violações cometidas pela empresa utilizadora que executa o contrato nas respetivas instalações, assim como pelo pagamento das respetivas coimas, podendo afastar a sua responsabilidade se demonstrar que agiu com a diligência devida”.

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[1] Decisão (UE) 2022/1414 da CE, de 4 de dezembro de 2020, relativa ao regime de auxílios SA.21259 (2018/C) (ex-2018/NN) aplicado por Portugal a favor da Zona Franca da Madeira (ZFM) — Regime III

[2] Conforme consta, por exemplo, nas Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português de setembro de 2022; e Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português de janeiro de 2025.

[3] Conforme consta nas Novidades jurídicas em diversas áreas de prática do Direito Português de julho de 2024.

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