Taxa de IVA aplicável à reabilitação urbana

António Castro Caldas, Raquel Silva Alves.

20/09/2022 Uría Menéndez (uria.com)


Apontamentos de Prática Tributária

O CAAD foi chamado a decidir (por decisão de 22.07.2022 proferida no processo n.º 137/2022) sobre uma matéria altamente controvertida e que muito tem divido a Autoridade Tributária e Aduaneira (“AT”) e os sujeitos passivos: os requisitos de que depende a aplicação da taxa reduzida de 6% de IVA às obras de reabilitação urbana localizadas em Áreas de Reabilitação Urbana (“ARU”), decidindo, adiante-se já, em favor do sujeito passivo e de acordo com aquela que tem vindo a ser a prática de mercado.

A verba 2.23 da lista I anexa ao Código do IVA - que estipula a aplicação desta taxa reduzida - prevê que se aplica a taxa de 6% às “empreitadas de reabilitação urbana, tal como definida em diploma específico, realizadas em imóveis ou em espaços públicos localizados em áreas de reabilitação urbana (áreas críticas de recuperação e reconversão urbanística, zonas de intervenção das sociedades de reabilitação urbana e outras) delimitadas nos termos legais, ou no âmbito de operações de requalificação e reabilitação de reconhecido interesse público nacional”.

Neste sentido, a prática do mercado tem sido a de entender que a aplicação da taxa reduzida de 6% é automática, desde que a obra realizada se possa considerar uma empreitada de reabilitação urbana, tal como definidas, respetivamente, no Código Civil e no Regime Jurídico da Reabilitação Urbana (“RJRU”), e que o imóvel se localize em ARU.

A AT, no entanto, tem vindo a emitir Informações Vinculativas nos termos das quais impõe requisitos adicionais (não incluídos na norma acima transcrita) para aplicação da taxa reduzida de 6%. Neste contexto diga-se que a própria posição da AT se foi alterando ao longo do tempo, tornando-se mais restritiva do que aquela que é, e sempre foi, a abordagem adotada pelo mercado.

A AT tem vindo, assim, a afirmar (cf. Informações vinculativas n.ºs 12402 de 14.11.2017, 13892 de 28.06.2018 e 13957 de 3.8.2018 e 14610 de 28.12.2018) que, para além dos requisitos previstos na lei, as obras em causa devem ser objeto de licenciamento, admissão de comunicação prévia e autorização de utilização ou que a câmara municipal certifique que as obras em causa se qualificam como reabilitação urbana. Este requisitos adicionais colocam dificuldades por vezes intransponíveis pois as obras em causa não estão necessariamente sujeitas a licenciamento, por um lado, e as câmaras municipais não emitem na prática este tipo de certificação, por outro.

Feito este contexto, cumpre voltar à Decisão em análise. O CAAD foi então chamado a dirimir um litígio em que, por um lado, os requerentes pediam a anulação de dois atos tributários de autoliquidação de IVA por entenderem que a empreitada que estavam a realizar num imóvel se qualificava para efeitos da verba 2.23 da lista I anexa ao Código do IVA e que, portanto, deveria ter beneficiado da taxa reduzida de IVA de 6% e, por outro lado, a AT defendia a tese já acima apresentada, pelo que entendia não ser de aplicar a taxa reduzida.

Ora, a decisão do CAAD vem, no fundo, confirmar aquela que tem sido a prática de mercado (a nosso ver acertada).

Em suma, afirma o tribunal arbitral que os requisitos indicados pela AT não se aplicam em sede de IVA, uma vez que não têm qualquer base legal. De facto, a verba 2.23 da lista I anexa ao Código do IVA apenas estabelece como requisitos que:

  1. a obra seja uma empreitada (nos termos do Código Civil) de reabilitação urbana (esclarecendo que se inclui no conceito de reabilitação urbana para estes efeitos a reabilitação isolada de edifícios); e
  2. o imóvel se localize em ARU.

Verificados estes dois requisitos é de aplicar a taxa reduzida de IVA de 6%.

Assim, conclui o tribunal arbitral que a alegação da AT de que a aplicação da taxa reduzida de IVA está sujeita à apreciação e aprovação de respetivo pedido de licenciamento é uma inferência ou uma dedução feita pela AT, sem qualquer suporte legal e, portanto, violadora do princípio da legalidade.

Entendemos, assim, que este é um precedente importante que sustenta aquela que tem vindo a ser a prática de mercado, concedendo maior segurança aos agentes económicos, e que, esperemos, leve a AT a reconsiderar a sua visão interna sobre o tema.

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